Mesmo faltando onze meses para a LGPD entrar em vigor, a realidade entre as empresas é de desconhecimento em relação às principais mudanças provocadas pela lei, que está na chamada vacância – um período que o legislador estabelece para que a sociedade absorva aquele novo regramento e passe a se adequar a ele.
O radialista Ricardo Luzbel, diretor-executivo do site Bahia Notícias, diz não estar tão atento sobre a lei, mas que não há recolhimento de dados pessoais dos leitores do veículo. Um dos pioneiros no setor de anúncios em empresas jornalísticas em Salvador, ele explica que a newsletter do veículo é realizada através do aplicativo de mensagens WhatsApp. Na página inicial do BN, um dos veículos mais tradicionais do estado, ainda há a opção de inscrever nome e e-mail para receber as notícias do site, mas a funcionalidade está inativa.
Segundo Luzbel, o leitor é quem solicita participar das atualizações de notícias através do aplicativo, hoje com 38 mil usuários. “A pessoa que cadastra o número para receber atualizações através do WhatsApp pode a qualquer momento se descadastrar”, afirma. Ele acrescenta que toda análise é feita no Google Analytics, serviço através do qual a empresa verifica quais são os conteúdos mais relevantes e que vão determinar as pautas do dia.
O editor-chefe de Inovação do Jornal Correio*, Juan Torres, informou que mesmo antes da lei, o jornal já adotava algumas medidas, como opt-in de news (quando todas as pessoas que estão incluídas nas listas de e-mails autorizaram o recebimento de contato com comunicados, newsletters e/ou promoções de uma empresa). “A implementação foi estabelecida por questão de boas práticas”, explicou. Quanto à aplicação da lei, ele informou que está avaliando, junto à equipe jurídica do veículo, quais serão as adaptações necessárias.
Na Tribuna da Bahia, a situação é semelhante. Não existe uma pessoa responsável pelo tratamento dos dados. Uma assessoria jurídica cria termos e condições de privacidade para quem entra no site e quer fazer assinaturas tanto do impresso quanto do online. Antes de confirmar o cadastro, o leitor aceita as condições onde estão dispostas as informações sobre a privacidade.
De acordo com Ricardo Paiva, diretor comercial da TB, a empresa tem dois tipos de bancos de dados. O primeiro é gerado pelo cadastro dos assinantes (impresso e online). O segundo é gerado pelos anunciantes do jornal e do site. “Todos estes dados estão armazenados em nosso sistema. Utilizamos para promoção ou propostas comerciais. Não temos área de inteligência. O setor jurídico ainda está analisando a lei, para verificar as medidas que poderão ser adotadas a partir do ano que vem”, afirmou.
A ABI também entrou em contato com o jornal A Tarde. Mas, até o momento da publicação da reportagem, não obteve resposta do veículo.
A advogada Ana Paula de Moraes, especialista em Direito Digital, aponta a necessidade de uma mudança de cultura nas empresas para se adequar à nova forma de lidar com a coleta dos dados pessoais dos cidadãos. “O momento hoje é de uma nova realidade empresarial. O que falta ao nosso país é uma cultura quanto à coleta de dados de forma clara e transparente”, observa.
Segundo a advogada, as maiores dificuldades estão para aquelas organizações que ao longo do tempo não investiram em tecnologia e não capacitaram seus funcionários. “Muitas organizações ainda não criaram um cronograma interno de seus processos e procedimentos para se adequar as novas regras”, ressalta.
De acordo com Ana Paula de Moraes, as sanções previstas para a violação da LGPD vão desde penalidades administrativas até a incidência de multas que poderão chegar a R$ R$50 milhões de reais por infração. A fiscalização fica com a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), criada em julho deste ano pelo presidente Jair Bolsonaro. Ao mesmo tempo, o presidente sancionou, com vetos, a Lei 13.853 – que flexibiliza pontos considerados importantes da LGPD (13.709 de 2018). O órgão federal vai editar normas e fiscalizar procedimentos sobre proteção de dados pessoais.
Na terceira reportagem da nossa série, especialistas ouvidos pelo Site da ABI discutem se a independência da ANPD, agência reguladora com tamanhos poderes sobre a vida de empresas de comunicação, fica comprometida por estar ligada diretamente ao gabinete da Presidência da República sob Jair Bolsonaro.
Confira a Parte 1: Lei de Proteção de dados impões desafios às empresas jornalísticas
*Reportagem de Joseanne Guedes e I’sis Almeida