A necessidade da valorização da educação, dos processos formativos do indivíduo e o papel da imprensa para a democracia foram temas abordados pelo doutor em comunicação Nelson Pretto, nesta quarta-feira (11), durante o encerramento do ciclo “Temas Diversos 2019”, da Associação Bahiana de Imprensa (ABI). O professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (UFBA) é defensor da ciência aberta, do software livre, do uso não-instrumental das novas tecnologias nos processos educacionais. O debate integrou a última reunião em 2019 da entidade presidida por Walter Pinheiro.
O vice-presidente da ABI, Ernesto Marques, destacou a importância de Nelson Pretto para a educação no Brasil e deu as boas-vindas ao novo associado à entidade. “Ele instituiu uma rádio web na universidade, os Diálogos Contemporâneos, é um educomunicador”, registra. Na apresentação do convidado, Marques exibiu o videoclipe da canção “O Real Resiste”, do cantor e compositor Arnaldo Antunes. A música, retirada da programação da TV Brasil, aborda violência policial e disseminação de preconceito no país, além de mencionar milicianos, terraplanistas, torturadores, fundamentalistas, e até o assassinato da ex-vereadora Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes.
Censura – “É mais um caso de censura. Em tempos em que Chico Buarque é considerado um ‘merda’, em tempos em que uma mulher como Fernanda Montenegro é desrespeitada, em que vemos agressões a jornalistas nada identificados como de esquerda, cabe perguntar ao professor Nelson Pretto se a ameaça à democracia existe? A censura existe?”, provocou o jornalista.
Pretto fez um panorama do contexto político no Brasil, que definiu como “algo muito dramático”. Para ele, o debate de opiniões desapareceu. “Politicamente, estamos vivendo um momento em que queremos exterminar o adversário, visto como inimigo. Há uma ojeriza com a diferença”, avaliou. “Não é difícil entender porque essa turma que está no poder hoje tem tanta raiva da cultura, educação e da ciência. Esse vídeo ilustra isso. Arnaldo e tantos outros têm se apropriado da internet para denunciar o que estamos vivendo. O que eu tenho feito nos últimos anos é trabalhar com o conceito de “intelectual público”, conta.
“Hoje eu estou em três rádios em Salvador e vejo que quem está de fora dos grandes eixos – São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília -, tem dificuldades em ocupar narrativas nacionais. Isso cria para a sociedade a impressão de que ali estão as melhores universidades. Segundo ele, entrevistas a intelectuais de fora dos grandes centros têm perspectiva folclórica, por isso “é fundamental que a gente compreenda esse papel do intelectual público do cientista e do acadêmico”, enfatizou o professor.
Polêmicas – Pretto citou as notícias que se tornaram polêmicas durante o ano, como a declaração do Ministro da Educação, Abraham Weintraub, sobre a baixa produção das universidades federais e apontou algumas estratégias. Segundo o educomunicador “a universidade não é essa generalização que querem colocar. A universidade tem que incomodar e não ser acomodada!”, observa. Defensor das cotas para negros e minorias no ambiente universitário, ele enfatizou uma frase do professor de Direito da UFBA, Samuel Vida: “A universidade hoje, sem dúvida, é negra, mas a ciência que se faz nela é branca!”, destacou.
O professor também apresentou preocupação com a negação das diferenças no ambiente universitário e com a gravidade das fake news para a sociedade. “É papel fundamental da imprensa se aprofundar em pautas sobre o tema e educar a recepção dos veículos, para evitar a expansão do uso das deepfakes por exemplo. “Em todos os debates que participo chega um momento em que surge a pergunta ‘o que fazer?’, na esperança que o intelectual ou cientista, jornalista, político, tenha uma carta na manga. No livro “Só mais um esforço”, Vladimir Safatle diz que não há o que fazer a não ser cada um fazer a sua parte. Ou seja, cada um atuar concretamente no cotidiano”, apontou o professor.