“Vá tomar no… você e toda a imprensa, e se ‘zoadar’ vai tomar tiro na cara! Bote aí no ar, que eu vou aí em Paulo Afonso matar você, porque eu tô com vontade matar gente e beber o sangue”. A ameaça feita pelo chefe de gabinete da Prefeitura de Jeremoabo, na região Nordeste da Bahia, já era desdobramento da agressão do seu colega de governo, que aplicou um soco pelas costas, contra um repórter da Alvorada FM. A agressão dormita num burocrático inquérito policial, provocado pela queixa registrada pelo agressor. A ameaça direta contra o comunicador Chico Sabe-tudo, de Paulo Afonso, que se solidarizou com o colega de Jeremoabo, sequer é investigada, apesar de configurar prática criminosa (artigo 147 do Código Penal).
Apesar dos protestos e pedidos de providências feitos pelos sindicatos de jornalistas da Bahia e de Sergipe, da Associação Bahiana de Imprensa e da Associação Brasileira de Imprensa, as autoridades policiais baianas têm sido pouco efetivas. Em vez do respeito à vida e às liberdades democráticas, o que irradia pela região, a partir dos episódios impunes de Jeremoabo, é a violência.
Munido de decisão judicial garantindo o acesso à Unidade de Pronto Atendimento de Paulo Afonso, os jornalistas sergipanos Léo Dias e Larissa Baracho tentaram registrar a desmontagem dos equipamentos que adaptaram a UPA para atender pacientes contaminados pelo novo coronavírus. Os dois profissionais trabalham para a campanha de um candidato de oposição ao atual prefeito, Luis de Deus (PSD), também candidato.
Ainda do lado de fora, foram abordados por dois prepostos da Prefeitura de Paulo Afonso. Rodrigo Alexsandro Oliveira de Menezes, supervisor Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, nomeado pelo prefeito em 1 de setembro de 2020, e seu irmão gêmeo, Alexandre Oliveira Menezes, enfermeiro com contrato temporário com a administração local, abordaram os jornalistas. Um vídeo mostra o momento em que Rodrigo aplica um jato de produto químico, supostamente spray de pimenta, contra o rosto de Léo Dias a menos de um metro de distância.
O fato foi registrado em Boletim de Ocorrência na Delegacia de Paulo Afonso e a denúncia de Léo Dias apareceu timidamente na imprensa da região. Jornalistas ouvidos pela reportagem da ABI na condição de anonimato atribuem a baixa repercussão ao clima de intimidação pelo fato de a dupla de agressores ser reconhecidamente violenta. Um deles aparece em foto compartilhada em grupos de aplicativos de mensagens portando armas sorrindo.
“Nós jornalistas não podemos nos calar diante de situações como essa. Usam da opressão para tentam nos calar a todo custo” desabafou Léo Dias. Para ele, os comunicadores precisam lutar por democracia porque “a política tem que ser feita de forma responsável e transparente, sem ferir os diretos de qualquer cidadão.”
Em nota, a Prefeitura de Paulo Afonso disse repudiar “todo e qualquer ato de violência ou intimidação, primando pelo respeito a todos os cidadãos. Dessa forma, inicia a averiguação dos fatos para que sejam tomadas as medidas cabíveis.” Os irmãos Rodrigo e Alexandre ainda não foram localizados pela nossa reportagem.
Os sindicatos de jornalistas da Bahia e de Sergipe assinaram nota em conjunto, repudiando os fatos e exigindo providências por parte das autoridades. “Além de enaltecer o repúdio contra esse ato, lamentavelmente protagonizado em um momento em que as ideias e propostas de avanços unificados deveriam prevalecer, solicitamos que as investigações sejam realizadas com rigor, e que os agressores respondam pelo ato infracional cometido. Pelo bem da soberania democrática presente na Constituição Federal de 1988, e pelo respeito à liberdade de imprensa, as entidades sindicais e a Fenaj exigem justiça; ao mesmo tempo, manifestamos a nossa solidariedade aos profissionais da comunicação agredidos e nos colocamos à disposição.”
O jornalista Ernesto Marques, presidente da Associação Bahiana de Imprensa também se solidarizou com os colegas agredidos. É a quarta ocorrência em menos de três meses e acontece pouco tempo depois do caso de Jeremoabo, aumentando a preocupação da entidade pelo clima de tensionamento gerado pela proximidade das eleições.
Segundo o presidente, a ABI vai solicitar audiência com o secretário de Segurança Pública, Maurício Barbosa, para tratar da sequência de ameaças e agressões registrada pela entidade. “Esperamos uma ação mais contundente por parte das nossas autoridades, porque a condução burocrática e lenta dos inquéritos policiais tem o efeito prático da impunidade que encoraja os agressores a elevar o tom”.