ABI BAHIANA

Eleições ABI: Que desafios aguardam a nova gestão da ABI?

Crônica de um impasse: a travessia da ABI diante do congelamento de aluguéis do Ranulfo

Por quase uma década, a Associação Bahiana de Imprensa vive sob o peso de um contrato de locação que deixou de acompanhar a realidade. Desde outubro de 2015 o valor pago pela Prefeitura de Salvador pela locação do Edifício Ranulfo Oliveira, sede da ABI, permanece em 57 mil reais, quando, pelo índice contratual, deveria estar na casa de 88 mil reais. A defasagem acumulada projeta um passivo superior a 2,45 milhões de reais, cifra que pressionou a operação, as contas e, sobretudo, a missão cultural da casa que guarda boa parte da memória da imprensa baiana.

12 de agosto de 2024

A diretoria da ABI marca reunião com a Prefeitura para o dia 13. O tema é o mesmo que se arrasta há anos: recompor o equilíbrio econômico-financeiro do contrato do Edifício Ranulfo Oliveira, sede histórica da entidade. Àquela altura, como medida de contenção de despesas, a ABI já havia migrado integralmente para o trabalho remoto desde meados de julho; projetos culturais foram descontinuados, com exceção da Série Lunar mantida com apoio privado, e a prioridade passou a ser a defesa dos acervos. A Prefeitura ocupa mais de dois terços do prédio e os contratos não são reajustados desde 2016, apesar de investimentos e adequações exigidos ao longo do período. A expectativa era corrigir valores conforme o indexador pactuado e discutir a quitação da dívida acumulada.

16 de agosto de 2024

Sem avanços concretos, a ABI convoca duas assembleias, uma ordinária e outra extraordinária, para deliberar sobre o impasse. No chamado de pauta, há a constatação dura: o aniversário de 94 anos e a própria rotina da sede estão comprometidos, e projetos de fôlego, como a Casa da Palavra Ruy Barbosa, foram profundamente afetados ou inviabilizados. Dada a gravidade, a entidade leva o tema à sua instância máxima de decisão.

28 de agosto de 2024

Em manhã de casa cheia, as contas do exercício são aprovadas por unanimidade e a governança da ABI recebe elogios públicos. A assembleia extraordinária valida uma comissão de negociação, presidida por Ernesto Marques, autoriza a continuidade dos entendimentos com o Executivo municipal e delibera pela solicitação de parecer a um escritório de advocacia, além de manter a assembleia em caráter permanente, para dar celeridade às providências.

2 de dezembro de 2024

Um encontro entre Ernesto Marques e o prefeito Bruno Reis, ocorrido nos bastidores de uma homenagem na Assembleia Legislativa, reaquece a esperança de uma solução. Fica o compromisso de uma reunião de gabinete com o secretário de Governo, Cacá Leão. Quem circula pelos corredores do Ranulfo Oliveira, porém, conhece a urgência: o Museu de Imprensa somava praticamente um ano sem funcionamento, e a adoção do trabalho remoto, somada ao fechamento de equipamentos culturais, é parte de um pacote amargo de contenção para manter obrigações fiscais e trabalhistas em dia, ainda que com prejuízos à conservação de acervos. Projetos estratégicos foram para a gaveta, do plano de sustentabilidade ao sonho da Casa da Palavra, repaginado por Gringo Cardia e, por enquanto, transformado em documento de uma boa ideia interrompida.

3 de fevereiro de 2025

À beira do limite, a diretoria executiva convoca reunião extraordinária para decidir os rumos do contrato. A entidade lembra que protocolou, ainda em agosto, uma proposta de acordo flexível para atualizar o aluguel e compor o passivo, mas não obteve retorno. Reitera números e datas: quase dez anos de congelamento, valor devido acima de 2,45 milhões de reais, aluguel correto estimado em 88 mil mensais ante os 57 mil praticados.

26 de maio de 2025

Na Tribuna Popular da Câmara Municipal, Ernesto Marques sintetiza o pleito, recebe manifestações de solidariedade de vereadores e noticia um passo novo: por delegação do secretário Cacá Leão, a Procuradoria Geral do Município, chefiada por Eduardo Porto, passaria a analisar juridicamente o contrato e construir a redação de um acordo. A sinalização institucional é bem-vinda, mas o cotidiano da ABI continua comprimido por restrições orçamentárias e por uma negociação que segue aquém do necessário.

Os efeitos colaterais de uma década sem reajuste

A sequência de reuniões, ofícios e apelos públicos evidencia um ponto incontornável: sem recomposição contratual, a ABI teve de reduzir custos de forma dura, com expediente remoto, fechamento de espaços, cancelamento de atividades culturais e foco quase exclusivo na defesa do seu patrimônio histórico. Alguns acervos já mostravam sinais de comprometimento, resultado direto de priorizar folha, tributos e fornecedores em meio a receitas minguadas.

Gestão sob prova, respostas à altura

Mesmo em mar revolto, a condução administrativa preservou a regularidade fiscal e trabalhista, reduziu déficit de 35 mil para 11 mil reais e diversificou fontes com projetos, publicidade e mensalidades, aliviando a dependência do aluguel do edifício-sede, que caiu de 94% para 79% das receitas. São números que ajudam a explicar por que as contas foram aprovadas sem ressalvas e por que a governança foi celebrada pelos associados.

Um desfecho ainda pendente

A cronologia acima revela uma entidade insistente no diálogo, que recebeu secretários, conversou com o prefeito e buscou o caminho institucional na Câmara e na Procuradoria, enquanto via projetos emblemáticos esbarrarem na falta de acordo. Para atravessar a etapa final das tratativas, a ABI deu mais um passo e, por último, contratou o advogado Paulo Moreno para intermediar a negociação junto ao Município.

No balanço, o impasse não é apenas cifra, planilha ou cláusula. É uma erosão silenciosa de oportunidades culturais, de circulação de público, de pesquisa, de memória viva. Resolver o contrato é devolver fôlego a uma casa que nasceu em 1930 e, desde os anos 1950, foi pensada para se sustentar pela locação de seus espaços e, assim, continuar contribuindo para a vida intelectual do estado. A ABI segue vigilante, insistindo no que lhe é próprio: transparência, responsabilidade e defesa de um patrimônio que pertence, em essência, à Bahia.

Textos relacionados:

publicidade
publicidade