ABI BAHIANA

“Nós podemos evitar que a democracia sucumba”, afirma Ordep Serra

Durante palestra na ABI, o antropólogo traçou paralelos entre o Brasil atual e os caminhos percorridos até o golpe civil-militar de 1964

A Associação Bahiana de Imprensa realizou nesta quarta-feira, 13 de março, a primeira reunião da Diretoria Executiva em 2024, com a estreia de mais uma temporada do ciclo de debates Temas Diversos.  O convidado da edição foi o antropólogo e escritor Ordep Serra, presidente da Academia de Letras da Bahia (ALB). Na data de grande simbologia nacional, o acadêmico analisou os “60 anos do Comício das Reformas: Avanços, retrocessos e ameaças à democracia”. Gratuito e online, o evento foi transmitido pelo canal da ABI no Youtube (assista).

Em 13 de março de 1964, o Comício da Central do Brasil, também chamado de Comício das Reformas, reuniu cerca de 200 mil pessoas. No ato que definiria capítulos importantes da história do Brasil, o então presidente João Goulart (Jango), empossado em 1961, defendeu a realização das Reformas de Base – um programa que visava reestruturações agrária, tributária, eleitoral, bancária, urbana e educacional –, desencadeando uma imediata reação conservadora, no ato que ficou conhecido como a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”.

A Marcha mobilizou mais de 500 mil pessoas nas ruas de São Paulo, para pedir a intervenção dos militares. Com a conspiração de grupos da extrema-direita a pleno vapor, em 31 de março, uma rebelião deu início ao golpe civil-militar, período caracterizado por censura, sequestros e execuções cometidas por agentes do governo brasileiro.

Durante o debate na ABI, Ordep Serra expressou preocupação com as crescentes ameaças à democracia no Brasil, falou da ascensão da extrema-direita, do fortalecimento de ideias negacionistas e traçou paralelos entre o clima atual e as tensões que antecederam o golpe civil-militar, além de abordar o contexto geopolítico mundial. 

De acordo com Ordep, o período ditatorial instaurou uma tecnologia da tortura no país. “Nós temos que nos preparar para defender a democracia, porque a iminência de golpe é real no Brasil. Está cada vez mais perigoso, o golpe se repete”, afirmou. Mas o professor rejeita o pessimismo. Para ele, a educação é a saída. 

“Nós podemos evitar que a democracia sucumba entre nós. Uma das formas de resistir é o combate ao obscurantismo. Ele não é uma tática nova, Hitler já fazia isso”, destacou Ordep Serra, em uma referência à Die große Lüge (a grande mentira), alicerce da propaganda nazista. “A eficácia está no inacreditável que se repete até que se passe a acreditar em qualquer coisa”, disse. Aliás, é atribuída a Joseph Goebbels, ministro da Propaganda do regime nazista, a máxima de que “uma mentira repetida mil vezes se torna uma verdade”.

O antropólogo reforçou que a desinformação foi uma arma na ditadura. “A censura proibiu a imprensa de falar, por exemplo, da epidemia de meningite meningocócica, que registrou 67 mil casos entre 1971 e 1976.”

“Está ao nosso alcance resistir ao golpe, não aceitar o obscurantismo e exigir educação de qualidade. A ameaça de golpe continua existindo. Nós temos a extrema-direita altamente mobilizada e com o apoio das chamadas big techs [ou gigantes de tecnologia]. As redes sociais se tornaram um espaço poderoso para o obscurantismo e o negacionismo. Precisamos acostumar as pessoas com o debate”, defendeu.

Ordep Serra é graduado em Letras pela UNB, Mestre em Antropologia Social pela UNB e Doutor em Antropologia pela USP. Professor aposentado Associado do Departamento de Antropologia da FFCH/Ufba. Professor Participante do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Ufba, de que foi um dos fundadores e o primeiro coordenador. Escritor premiado em concursos nacionais de literatura. Presidente da Academia de Letras da Bahia (ALB).

Assista a íntegra da palestra no link abaixo:

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