ABI BAHIANA

Presidente da ABI propõe mudar nome da rua da instituição para homenagear jornalista Carlos Alberto Caó

Durante entrevista à Rádio Câmara, o jornalista e radialista Ernesto Marques explicou que a ideia é reconhecer e valorizar um símbolo da luta pela liberdade de imprensa

Na manhã desta quarta-feira (30), durante participação no programa Café Duplo, da Rádio Câmara Salvador, o presidente da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), jornalista e radialista Ernesto Marques, aproveitou o espaço para lançar uma proposta simbólica e significativa: mudar o nome da rua onde está situada a sede da entidade, no centro histórico de Salvador. O atual nome, Rua Guedes de Brito, daria lugar a uma nova denominação: Rua Carlos Alberto Caó, em homenagem ao jornalista, advogado e ex-deputado constituinte que teve papel fundamental na luta pelos direitos civis no Brasil.

A sugestão foi feita ao vivo, em um gesto de apelo direto aos 43 vereadores da Câmara Municipal de Salvador, especialmente ao presidente da Casa, Carlos Muniz. Marques argumentou que a proposta é mais do que uma simples mudança de placa: trata-se de reconhecer e valorizar um símbolo da luta pela liberdade de imprensa, contra o racismo e em defesa dos direitos humanos.

Por que mudar?

Durante o programa, que teve como tema central “Ética e Liberdade de Imprensa” — em alusão ao Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, comemorado em 3 de maio —, Ernesto Marques fez questão de contextualizar sua proposta com um olhar crítico sobre o passado.

Edifício Ranulfo Oliveira, sede da ABI, na esquina da Rua Guedes de Brito com a Rua José Gonçalves | Foto: Joseanne Guedes

“Fui pesquisar quem foi Guedes de Brito e vi que foi um sesmeiro que acumulou muita terra, prestígio junto à coroa portuguesa, escravizando e matando indígenas, combatendo quilombos, explorando o trabalho escravo”, explicou o presidente da ABI. “Hoje, seria um vilão. Na época, talvez um herói, como se discutem os bandeirantes em São Paulo”, lembrou.

A proposta de rebatizar a rua é mais um capítulo das ações que buscam resgatar a memória de personalidades negras fundamentais para a história do Brasil, ao mesmo tempo em que questiona homenagens que perpetuam figuras associadas à escravidão e à opressão colonial.

Quem foi Carlos Alberto Caó?

Carlos Alberto Caó de Oliveira, ou simplesmente Caó, nasceu no bairro da Federação, em Salvador, e se destacou desde jovem como uma liderança negra combativa, eloquente e atuante nos meios de comunicação e na política. Ainda na juventude, migrou para o Rio de Janeiro, onde consolidou sua carreira como jornalista, passando por grandes veículos de imprensa. Posteriormente, foi eleito deputado federal e se notabilizou como um dos constituintes de 1988, sendo o responsável pela emenda que incluiu o racismo como crime inafiançável e imprescritível na Constituição Federal.

Caó também foi secretário de Habitação do Rio de Janeiro, lutando pelo direito à moradia digna em comunidades populares. Faleceu em 2018, e seu legado segue como inspiração para militantes e comunicadores que enfrentam as desigualdades estruturais do país.

Foto: Reprodução/TV Brasil

“Caó está esquecido, e a gente não pode permitir que essa figura seja esquecida. É um exemplo para jovens que lutam por liberdade, por oportunidades, por direitos. Um homem negro que ocupou cargos públicos de destaque numa época muito mais adversa que a de hoje”, ressaltou Ernesto.

Liberdade de expressão e responsabilidade

Ernesto Marques fez críticas à banalização da liberdade de expressão nas redes sociais e à propagação de fake news. Defendeu o debate sobre a regulamentação das plataformas digitais e a educação midiática, especialmente entre os mais jovens, sem cair no erro de associar regulação à censura.

“As redes sociais têm servido para coisas fantásticas, mas também para absurdos. Precisamos falar de responsabilidade. O melhor remédio para os abusos cometidos em nome da liberdade de expressão é mais liberdade — mas com responsabilidade”, destacou.

Memória da imprensa

Marques também falou sobre a Revista Memória da Imprensa, uma das mais relevantes iniciativas da ABI para preservar a trajetória de comunicadores e fortalecer a identidade do jornalismo baiano. A edição especial lançada em abril trouxe homenagens emocionantes a duas grandes jornalistas recentemente falecidas, que deixaram um legado marcante na imprensa da Bahia: Kardé Mourão e Wanda Chase.

Ao revelar os bastidores da produção, o presidente da ABI aproveitou para lançar mais um “spoiler”: a próxima edição regular da revista, prevista para julho, trará uma entrevista exclusiva com o cronista esportivo Edson Almeida, nome histórico do rádio baiano. Mesmo aos 80 anos e enfrentando problemas de saúde, Edson continua atuando de casa, comentando ao vivo e se adaptando às novas tecnologias.

“Foi uma delícia a entrevista com Edson. Nada melhor do que falar de memória com as pessoas em vida. Esse é o esforço da revista: preservar enquanto ainda dá tempo de escutar”, destacou Ernesto.

Desde que foi retomada, a revista já reúne mais de 170 horas de depoimentos gravados, totalizando 53 entrevistas com jornalistas, radialistas e comunicadores da Bahia. Todo esse acervo está disponível para consulta no Museu de Imprensa, sediado na ABI, e pode ser utilizado para fins acadêmicos, documentais e culturais.

As edições especiais, lançadas a cada mês, integra o ciclo de conferências ABI 95 + 5, em celebração aos 95 anos da entidade. O tema da revista atual é o patrimônio histórico, escolhido após o desastre que atingiu a Igreja de São Francisco e mobilizou a opinião pública sobre a necessidade urgente de preservação.

A próxima edição trará como destaque uma conferência de Eduardo Athayde, da WWE Brasil, abordando o potencial da chamada economia do mar, com foco na Baía de Todos-os-Santos — tema que, segundo Ernesto, ainda é pouco explorado pela imprensa baiana.

“A gente precisa se apropriar desse assunto. O mar não é só praia, pescaria e lazer. É moradia, trabalho, energia, ciência. E nós, jornalistas, temos um papel central em qualificar esse debate com informação e profundidade”, concluiu.

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