A história do jornalista Vladimir Herzog, o Vlado, é icônica para entender os métodos adotados pelos militares durante a Ditadura Militar. Suspeito de manter ligação com o PCB (Partido Comunista Brasileiro) — que atuava ilegalmente na época, ele se apresentou ao DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informação — Centro de Operações de Defesa Interna) espontaneamente na manhã do dia 25 de outubro de 1975, um sábado. Horas depois o SNI (Serviço Nacional de Informações) anunciou seu suicídio.
A foto emblemática de seu corpo, feita por Silvaldo Leung Vieira, mostra Vlado pendurado por um cinto em uma cela. Suas pernas estão dobradas, o que impossibilita o suicídio. Além disso, o cinto — que o Exército alegou ser o instrumento usado para a prática — não fazia parte do uniforme, um macacão. A família, há quase 42 anos, questiona a versão apresentada pelo Exército brasileiro. Eles questionam a falta de informação sobre a morte de Vlado. Não sabe quem colheu o seu depoimento e muito menos quem o matou. No mesmo ano da morte de Herzog, o jornalista Rodolfo Konder também estava preso em uma cela no DOI-CODI. Quando foi solto, foi o primeiro a denunciar o assassinato do amigo, enquanto o regime militar tentava emplacar a versão de suicídio.
Em 2012, o juiz Márcio Martins Bonilha Filho, da 2ª Vara de Registros Públicos do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), determinou a retificação do atestado de óbito de Vlado, para fazer constar que sua “morte decorreu de lesões e maus-tratos sofridos em dependência do II Exército – SP (Doi-Codi)”, atendendo a um pedido feito pela Comissão Nacional da Verdade. A família de Herzog foi quem solicitou que fosse retirada da causa da morte a asfixia mecânica, constava no laudo necroscópico e no atestado.
Agora, uma matéria do portal R7 indicou que Exército do Brasil pode ter destruídos provas que poderiam incriminar os responsáveis pelo assassinato do jornalista. Através da Lei de Acesso à Informação, o veículo pediu informações sobre funcionários que estariam no DOI-CODI, em São Paulo, na data da morte de Vladimir Herzog. A proposta era, a partir dos dados dos militares presentes, fazer uma possível análise do culpado pelo crime.
Em resposta, o Exército invoca o decreto nº 79.099, de 6 de janeiro de 1977, e afirma que tal determinação “permitia a destruição de documentos sigilosos, bem como os eventuais termos de destruição, pela autoridade que os elaborou ou pela autoridade que detivesse a sua custódia.” A declaração acrescenta que “não foi localizado qualquer registro da documentação solicitada no Comando do Exército” e completa afirmando que “tais documentos, se existiram, foram destruídos pelas razões acima expostas.”
O filho mais velho de Vlado — e diretor executivo do Instituto em homenagem — Ivo Herzog comenta a resposta. “Eu acho que é covardia do Exército não ter coragem de assumir os atos que cometeu no passado. Uma instituição madura deve reconhecer o que fez no passado, se ela fez um julgamento, certo ou errado, que ela assuma esse julgamento.”
Ao lado da mãe, Clarice Herzog, Ivo foi em maio deste ano à Corte Interamericana de Direitos Humanos para exigir uma resposta. A expectativa da família é de que o Estado brasileiro seja penalizado pela prisão arbitrária, tortura e morte do jornalista. “A sentença deve sair até o final do ano”, explica. Ivo Herzog completa. “A gente tem que andar pra frente e a gente só vai andar pra frente quando reconhecermos o que aconteceu no passado. E essa recusa do Exército e do próprio Estado brasileiro não colabora em nada para o aprimoramento da sociedade.”
Vladimir Herzog foi jornalista, professor e cineasta brasileiro. Nasceu em 27 de junho de 1937 na cidade de Osijsk, na Croácia (na época, parte da Iugoslávia), morou na Itália e emigrou para o Brasil com os pais em 1942. Foi criado em São Paulo e naturalizou-se brasileiro. Estudou Filosofia na Universidade de São Paulo (USP) e iniciou a carreira de jornalista em 1959, no jornal O Estado de S. Paulo. Nessa época, achou que seu nome de batismo, Vlado, não soava bem no Brasil e decidiu passar a assinar como Vladimir.
*As informações são de Peu Araújo, do R7, e do site Memórias da Ditadura