Atendendo ao pedido do delegado que acompanha o caso, a Justiça decretou sigilo sobre as investigações do assassinato do jornalista Evany José Metzker (67), torturado e decapitado na cidade de Padre Paraíso, no Vale do Jequitinhonha, região mais pobre do estado de Minas Gerais. A decisão foi tomada pelo juiz Ricky Bert Biglione Guimarães, da comarca de Araçuaí, município da região. Metzker desapareceu no último dia 13 e seu corpo foi encontrado em estado de decomposição na segunda-feira (18). Ele mantinha um blog chamado “Coruja do Vale”, em que publicava suas investigações sobre corrupção, narcotráfico e prostituição infantil, além de críticas à administração pública. O assassinato, que repercutiu na imprensa internacional e mobilizou diversas entidades de defesa da liberdade de imprensa e dos direitos humanos, é acompanhado com atenção porque há indícios de crime político motivado por questões profissionais.
De acordo com o Estado de Minas, a Superintendência de Imprensa do Governo informou que o segredo de justiça foi solicitado pelo delegado Emerson Morais, do Departamento de Investigações de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP) da Polícia Civil de Minas Gerais, chefe da equipe que investiga o crime na cidade. Por meio de nota, o delegado justifica que o pedido de sigilo é importante em função da complexidade do caso, da dificuldade de se apurar evidências e da multiplicidade de motivações para o crime. “O segredo de justiça é fundamental para assegurar o bom andamento das investigações, com preservação dos depoimentos, das diligências realizadas e pendentes de realização, além da restrição dos indícios já apurados”, explicou.
Nesta semana, os investigadores visitaram o local do crime, ouviram pessoas que conviviam com o jornalista e tentaram reproduzir os últimos passos da vítima. Morais diz que não há registro formal de ameaças contra Metzker, e que trabalha com “todas as possibilidades”. A avaliação é diferente da informada pela delegada Fabricia Nunes, que iniciou a apuração. Ela descartou a hipótese de latrocínio (roubo seguido de morte) – já que nada foi levado da vítima – e trabalhava com a possibilidade de crime político ou passional. Procurados, os delegados não concederam entrevistas.
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O Sindicato dos Jornalistas de Minas divulgou nota em que manifesta “repulsa” e pede “apuração rigorosa” do caso. “O sindicato não aceita que a hipótese de o assassinato estar relacionado ao exercício da profissão de jornalista seja descartada antes de uma rigorosa e isenta investigação”, diz o comunicado. Foi depois do pedido do sindicato que o governo de Minas Gerais enviou uma força-tarefa à cidade para ajudar e intensificar as investigações. Após articulação com a Secretaria de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania e a Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) ficou definida a realização de audiência pública nesta segunda-feira (25/05) em Medina, cidade onde José Metzker residia.
Em nota oficial, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) deplorou o assassinato do jornalista e exigiu punição aos responsáveis. A entidade afirmou que o crime afronta a liberdade de imprensa e conspurca a imagem do país, pelas características com que foi cometido. “A morte de Evany José não pode se transformar em mais um número na triste estatística que colocou o Brasil entre os países onde ocorrem mais execuções de profissionais de imprensa das Américas, no ranking do Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ)”.
A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) também condenou o crime através de um comunicado. A organização que atua na defesa e promoção da liberdade de imprensa e de expressão nas Américas lamentou a morte do jornalista e reforçou sua preocupação com a grande quantidade de crimes sem punição no país. Segundo a AFP, o presidente da SIP, Gustavo Mohme, pediu às autoridades que investiguem com urgência os motivos da morte do jornalista, assassinado enquanto apurava informações a respeito do tráfico de drogas e da prostituição infantil na região.
Escalada de violência
O assassinato do jornalista expõe o avanço de crimes violentos nos vales do Jequitinhonha e Mucuri. Conhecida por belezas naturais de encher os olhos, a região – castigada no passado pela prática de mineração e extração de diamante – sofre com o crescimento do número de homicídios, assaltos à mão armada, roubos, explosão de caixas eletrônicos e tráfico de drogas. Dados da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) indicam que, nos primeiros quatro meses deste ano, a 15ª Regional Integrada de Segurança Pública (Risp), de Teófilo Otoni, que abrange Padre Paraíso, registrou 677 crimes violentos (homicídios e estupros tentados e consumados, assaltos, roubos, sequestros e cárcere privado), um média mensal de 169. Em 2014 inteiro, a média mensal foi de 141 crimes.
Em Padre Paraíso, foram 35 crimes violentos de janeiro a abril, média de 8,7 por mês, excluindo o assassinato de Metzker, e outras ocorrências já registradas neste mês. Em todo o ano passado, foram 49 crimes dessa natureza no município, média de quatro por mês. O número de assassinatos deste ano, incluindo a morte do jornalista, já bateu o do ano passado, quando ocorreram três. Este ano, já são quatro assassinatos.
*Informações da Folha de S.Paulo, Associação Brasileira de Imprensa e Estado de Minas.