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Antonieta de Barros, um nome para se inspirar

Na Bahia, assim como em Santa Catarina, sua terra natal, movimentos e prêmios resgatam a vida e obra da jornalista e política

Se a imagem de Maju Coutinho provoca reações diversas no público brasileiro, imagine nos anos 30, como a sociedade reagiu à primeira jornalista negra assumindo um cargo político?  Antonieta de Barros é o nome que protagoniza essa história. Filiada ao Partido Liberal Catarinense (PLC) e eleita como suplente no primeiro ano em que mulheres puderam votar e serem votadas no sistema Executivo e Legislativo do Brasil, Antonieta se tornou deputada estadual na Assembleia catarinense em 1934, exercendo o cargo entre 1935 a 1937. Foi reeleita em 1947, levando o mandato até 1951 pelo PSD (Partido Social Democrático).

A vida e obra de Antonieta de Barros inspirou e inspira muitas mulheres negras todos os dias, mas, infelizmente, o Brasil de 2020 ainda deixa muito a desejar. Em Joinville (SC), a primeira vereadora negra eleita pela cidade sofreu com ataques em suas redes sociais. Ana Lucia Martins registrou boletim de ocorrência ontem (19) em uma delegacia da região em função dos comentários racistas, comentários de ódio e, até mesmo, ameaça de morte. Ana foi eleita pelo Partido dos Trabalhadores (PT) no último domingo com 3.126 votos – a sétima pessoa mais votada na cidade.

Inspiração no presente

Antonieta nasceu em 11 de julho de 1901, em Santa Catarina, Florianópolis. Hoje, de Barros é considerada personagem fundamental de SC, e cada vez mais, seu nome tem se tornado conhecido em diversos estados brasileiros por sua representatividade. Antes de sua participação na política, aos 21 anos, Antonieta fundou e foi diretora do jornal “A Sema­na”, entre 1922 a 1927. Também diri­giu, em 1930, a revista quinzenal “Vida Ilhoa”. Foi cronista dos jornais “O Estado” e “República”, e assumiu nele, por diversas vezes, o pseudônimo de ‘Maria da Ilha’. Em 1937, publicou o livro “Far­rapos de Ideias”. 

Antonieta, única mulher negra entre diversos parlamentares brancos
Antonieta de Barros entre outros parlamentares em 1935

Hoje, diversos prêmios, coletivos e outros movimentos levam o nome de Antonieta de Barros, dentre eles, o que a jornalista e doutora Cleidiana Ramos recebeu pela Secretaria Municipal da Reparação de Salvador (SEMUR). Ela conta que, embora não possua conhecimento profundo de dados biográficos de Antonieta, em 2011, ter sido  facilitadora em um curso de gênero e raça para jornalistas a ajudou poder conhecer e contar histórias que durante muito tempo foram apagadas no Brasil.

De acordo com a jornalista, o processo de desconhecimento da contribuição de personalidades negras em nosso país é reflexo do histórico escravista. “A colonização é tão recente, que ainda não acabou. A escravidão é um sistema ecônomico e quando falamos sobre movimento negro, estamos falando sobre várias pessoas, não existe como falar de Brasil sem o binômio ‘Casa Grande, Senzala’”, afirma a jornalista. 

Para Cleidiana, o problema nacional é que “o brasileiro tem vergonha de dizer que tem preconceito”, e não assumir o preconceito, dificulta reconhecer a necessidade de estudar a história. O fato de as escolas de jornalismo terem se voltado para aspectos tecnicistas a exemplo, dificulta que os alunos possam conhecer a linha do tempo do Brasil. “Os alunos são ótimos em big data mas não conhecem a história”, reclama a jornalista. Cleidiana instrui que se jovens e adultos querem adquirir conhecimento sobre quem foi importante em nosso país, que se debruce a estudar. “Estudar no sentido de pesquisar, procurar historiadores, antropólogos. O jornalismo dá trabalho, reportagem dá trabalho! É preciso correr atrás”. 

Em 2017, um coletivo formado por alunas negras da Faculdade de Comunicação da UFBA resolveu adotar o nome de Antonieta de Barros. “Começamos com uma iniciativa de estudantes negras para realização do I Encontro Antonieta de Barros de Mulheres da Facom, que aconteceu nos dias 7 e 8 de agosto daquele ano, em um evento de duas tardes,  relatam as estudantes e integrantes do grupo. A partir dos desdobramentos desse evento, o interesse de outras estudantes negras e negros nas questões discutidas, e o crescente envolvimento das estudantes nas questões institucionais relativas a raça e gênero, o grupo decidiu pela criação do Coletivo Antonieta de Barros. 

Formado pelas alunas Mariana Gomes, Glenda Dantas, Rebeca Almeida, Laila Nery, Tainã Souza e Raquel Franco., para o coletivo é importante pensar na construção de um conhecimento interseccional de gênero e raça como auxílio na formação de futuros profissionais da comunicação. “É preciso pensar na consolidação dos valores democráticos em torno de nossas atuações, da construção de um país mais justos e igual para os cidadãos e cidadãs”, relatam as estudantes que responderam à entrevista da ABI de forma coletiva.

Para conhecer Antonieta de Barros

É o trabalho de pesquisadoras como Carol Carvalho, formada em história pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e doutoranda em história também pela UDESC, que tem feito o nome de Antonieta e outras mulheres negras importantes da história do país se tornarem cada vez menos inédito no Brasil. “Entendo Antonieta como uma potência de mulher e alguém que está diretamente articulada com a educação. Suas idéias e seus posicionamentos são muito pertinentes para pensarmos uma educação antirracista, não só de acesso, mas também para pensarmos na permanência dessas pessoas”, afirma Carol. 

Além de historiadora, Carvalho é vice-presidente da Associação de Mulheres Negras Antonieta de Barros (AMAB). De acordo com a pesquisadora, esse ano houve uma articulação muito grande de mulheres negras para se elegerem e lembra. Seu alerta é para que possamos acolher e proteger essas mulheres a fim de que não aconteça com elas o que aconteceu com a vereadora Marielle Franco, do Rio de Janeiro, assassinada em 2018 junto ao motorista Anderson Gomes, em função de sua atuação Política.

“Precisamos estar atentos e atentas a essa questão, defender pessoas que estão ocupando esses espaços para que nossos direitos sejam garantidos. Os direitos da população negra, LGBTQIA+, combatendo todas as outras formas de opressão”, alerta Carol. “Temos que proteger essas pessoas porque não queremos que aconteça com essas mulheres o que aconteceu com Marielle”, conclui.

*Graduanda de Jornalismo, estagiária da ABI.

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