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O centenário da Rádio Sociedade da Bahia

*Nelson Cadena

A Rádio Sociedade da Bahia, comemora domingo próximo 100 anos de vida, dito de outra forma, o rádio baiano comemora o seu centenário e no caso específico da emissora em pauta, pode se orgulhar de ser líder de audiência entre as emissoras AM. Sempre líder. Uma liderança que foi ameaçada em 1933 pela Rádio Commercial, em 1944 pela Rádio Excelsior, em 1951 pela Rádio Cultura e durante três décadas pelo menos pela Radio Nacional do Rio de Janeiro. A concorrência a tirou da linha de conforto e a obrigou a fazer investimentos em recursos humanos e tecnologia.

Foi a primeira emissora a operar na Bahia, a terceira do Brasil e hoje é a segunda mais antiga do país, considerando que a Radio Clube de Pernambuco que a precedeu deixou de transmitir o ano passado na frequência de 720 Khz, operando apenas pela internet.

Do Passeio Público à Federação

Ao longo de sua existência a rádio teve vários proprietários e endereços: em 1924, os 200 associados que formaram a sociedade baiana, os cotistas que lhe garantiram sua existência; ainda na década de 1920, o empresário Armando Carneiro da Rocha que instalou os estúdios no Passeio Público da Bahia, em 1926, e mais tarde, final da década de 1930, na Rua Portugal; em 1940 passou a ser propriedade dos Diários e Emissoras Associadas de Assis Chateaubriand, com sede na rua Carlos Gomes, no imóvel onde praticamente nasceu a ABI, o Esporte Clube Bahia e hoje é a Caixa Cultural.

Foto: Arquivo pessoal

No início da década de 1960 a rádio se mudou para a Federação, no mesmo prédio da TV Itapoan, onde permanece até hoje. Em 1980 foi adquirida pelo empresário Pedro Irujo, como parte do espólio dos Associados, e em 1997 pela Rede Record, sua atual proprietária.

A rádio nasceu no papel, na data de 24 de março, nos salões da Escola Politécnica, inaugurada com pompa e circunstância em 27 de março na chapelaria Mercuri da Rua Chile, pertencente a Giovanno Mercuri, bisavô da cantora Daniela Mercuri (y). Mas, só entrou em operação com uma grade de programação regular no primeiro trimestre de 1925, após liberar na alfândega do Rio de Janeiro o transmissor retido durante meses, adquirido nos Estados Unidos, com a interferência do governador Góes Calmon.

Em outubro de 1926 adquiriu um piano de cauda, com autorização do Ministro da Fazenda, que liberou as taxas de importação, já estruturando uma programação musical que seria um dos destaques, nesta face inicial. Fez história o seu grupo de musicistas, todas mulheres, que se apresentava na programação vespertina em inícios da década de 1930 e o jazz de moças baianas da foto (em pé Hildette Fernandes, Alda Senna, Nélia Fernandez, Elza Zolinger, Alda Leite e sentadas Alina Senna, Alina Fernandes e Zilda Fernandes).

Grupo de musicistas da programação vespertina, 1935. Foto: Radio Sociedade

Caymmi e Zé Trindade

Foi na Rádio Sociedade que Dorival Caymmi recebeu em 1935 seu primeiro cachê artístico, acompanhado do conjunto Três e Meio, 40 mil réis. E todo ano a Sociedade promovia concursos de marchas e sambas carnavalescas para revelar talentos. No mesmo ano estreava na rádio o famoso comediante Zé Trindade com o dramalhão Alvorada onde representava o papel de um tuberculoso. E mais tarde atuando na peça A Bebedeira, onde fazia o papel de um bêbado e é considerado um dos marcos de sua carreira artística.

Outro marco relevante na trajetória da emissora foi a implantação, ainda nos primórdios, inícios da década de 1930, de uma programação infantil com Tico-Tico. Nesse propósito de segmentação, em 1943, a rádio contrata Adroaldo Ribeiro Costa, o celebrado autor do hino do Bahia (1946) dentre outros hinos de sua autoria. Assumiu o rádio- teatro da Radio Sociedade e implantou o programa A Hora da Criança. Que deu grande visibilidade ao projeto, elogiado por Monteiro Lobato quando da apresentação da Opera Narizinho no Teatro Guarani, em 1947, com a presença do escritor.

Não foi apenas na programação artística e infantil que a emissora se destacou. Foi pioneira como veículo para difusão da plataforma de um candidato a governador, Vital Soares, em 1927; na transmissão dos jogos de futebol no Campo da Graça, em 1938, com Roberto Machado e Ubaldo Câncio de Carvalho. E antes, em 1934, o médico e locutor Nelson Costa foi ao Rio de Janeiro para se inteirar das técnicas de propaganda comercial da rádio Sociedade da capital para implementar na rádio baiana.

E, em 1942, durante a II Guerra mundial, veiculou o programa “A Marcha para a Vitória”, engajado no apoio midiático dos aliados, que irradiava músicas de guerra e aventuras dos aviadores ingleses. No mesmo ano, Aloisio de Carvalho, o lendário Lulu Parola, das crônicas “Cantando e Rindo”, já idoso, apresentou na Sociedade o programa “Conversa Fiada” infelizmente interrompido por seu falecimento.

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*Nelson Cadena é jornalista, pesquisador e publicitário. Diretor de Cultura da ABI.
Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI)



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