Em tempos de acelerada obsolescência – de máquinas, modas e até memórias -, envelhecer tornou-se quase um ato de resistência. No jornalismo, ofício que se alimenta da urgência, do novo, do agora, a experiência muitas vezes é tratada como um peso. Como se a pressa do presente dispensasse os aprendizados do passado. É nesse cenário que a 8ª edição da Revista Memória da Imprensa, cuja versão digital foi lançada nesta sexta-feira (30) pela Associação Bahiana de Imprensa (ABI), escolhe o tempo como tema e testemunha: tempo vivido, tempo eternizado, tempo que ensina.
Com o etarismo como eixo central, a revista não apenas denuncia uma das faces mais silenciosas do preconceito no ambiente de trabalho, mas também celebra os profissionais que moldaram a história da comunicação na Bahia. Vozes que não envelhecem e, mesmo quando seus rostos já não ocupam mais as redações, seguem contribuindo para a história da notícia no Brasil.
Sob o título “O peso do conhecimento e da experiência”, a publicação traz cinco entrevistas profundas com expoentes da imprensa baiana, artigos críticos e um ensaio fotográfico em homenagem póstuma ao fotojornalista Antônio Saturnino, construindo uma narrativa sensível sobre permanência, memória e respeito.
Para o jornalista Ernesto Marques, presidente da ABI, o tema toca diretamente as transformações vividas nas redações brasileiras e o apagamento gradual da experiência no jornalismo contemporâneo.
Em seu editorial, Marques destaca a urgência de tratar o etarismo não com saudosismo, mas com objetividade e responsabilidade social. “Discutir sobre etarismo nas redações, hoje, é pensar sobre o Brasil de logo adiante, com base na soma das nossas vivências e expectativas. Isso precisa estar em conta na hora da pauta, da reportagem, da edição…”, escreveu. Com lucidez e ironia, o presidente lembra: “Parece inacreditável, mas é verdade: jornalistas também envelhecem”.
A apresentação da revista, assinada pelo editor Biaggio Talento, chama atenção para o fenômeno da “juniorização” das redações e os impactos da substituição sistemática de profissionais experientes por jovens recém-formados, uma escolha que, muitas vezes, sacrifica a qualidade em nome da redução de custos. O texto contextualiza o tema à luz de dados, como os 12 mil postos de trabalho perdidos no setor segundo o CAGED, e o índice de demissões de jornalistas com mais de 50 anos, que chegou a 30% em 2019, segundo a Fenaj – Federação Nacional de Jornalistas.
Tempo, tempo, tempo…
Nesta edição, o projeto Memória da Imprensa chega à marca de 53 entrevistas com personalidades que fizeram e ainda fazem história na comunicação baiana. São cinco os depoimentos inéditos: Cristovaldo Rodrigues, repórter policial de faro afiado e alma de cronista; Edson Almeida, comentarista esportivo que completou 80 anos em plena atividade; Jolivaldo Freitas, cronista e escritor de múltiplos gêneros; Roberto (Bob) Fernandes, jornalista político de reconhecida trajetória nacional; e Vera Martins, que narra sua vivência de resistência e inovação nas ondas do rádio. Cada entrevista é uma aula de jornalismo vivo, forjado nas ruas, nas redações e nos desafios de cada época.
A seção de artigos reúne reflexões valiosas sobre o tema central da edição. A jornalista Camila Augusto, fundadora do Foco na Mídia, escreve sobre os desafios enfrentados por mulheres jornalistas no mercado de trabalho. O professor Diego Oliveira, coordenador acadêmico da ESPM, analisa o etarismo sob a ótica das relações de poder nas redações. E a sócia-diretora da ATcom Comunicação Corporativa, Suely Temporal, 2ª vice-presidente da ABI, reforça a urgência de romper o preconceito geracional como condição para uma comunicação mais justa, ética e diversa.
O ensaio fotográfico da edição, com imagens assinadas por Antônio Saturnino, é um tributo ao olhar aguçado do repórter fotográfico que nos deixou em abril. Entre seus registros marcantes, está a imagem emblemática dos confrontos entre indígenas e policiais durante os 500 anos do descobrimento, em Porto Seguro – um testemunho visual da coragem e da relevância do trabalho jornalístico.
Com coordenação editorial de Ernesto Marques e Jaciara Santos, diretora de Comunicação da ABI, projeto gráfico da Bamboo Editora e tiragem de 1.500 exemplares com distribuição gratuita, a Revista Memória da Imprensa segue cumprindo sua missão de resgatar, preservar e divulgar a história da imprensa baiana, enquanto promove debates que atravessam gerações e desafiam o presente.
- O evento de lançamento da 8ª edição acontece às 9h30 do próximo sábado, 5 de julho, no Auditório Samuel Celestino, oitavo andar da ABI – Rua Guedes de Brito, 1 – Praça da Sé, em Salvador. Entrada gratuita.
A publicação está disponível abaixo. Boa leitura e até o evento de lançamento !

8ª edição – Junho 2025
Confira também as edições anteriores! https://abi-bahia.org.br/revista-memoria-da-imprensa-edicoes/