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Em aula-entrevista na Facom, Jaciara Santos desvenda essência do jornalismo policial

Veterana da imprensa baiana, a diretora de Comunicação da ABI compartilhou com os estudantes episódios marcantes de sua carreira

“Não existe ninguém totalmente bom, nem totalmente mau. O jornalismo me ensinou isso.” Foi esse olhar humanizado sobre a realidade que a jornalista baiana Jaciara Santos apresentou aos estudantes da Faculdade de Comunicação da UFBA, durante uma aula-entrevista promovida ontem (4/6) pelo professor Alexandro Mota, para a disciplina Gestão de Práticas e Processos Jornalísticos.

Veterana da imprensa baiana, a diretora de Comunicação da Associação Bahiana de Imprensa (ABI) foi recebida com entusiasmo por jovens do terceiro semestre do curso de Jornalismo, com idades entre 19 a 22 anos, com os quais ela compartilhou sua passagem por veículos baianos como Jornal da Bahia, Correio, TV Aratu e experiências a área de assessoria.

Sua voz suave e postura tímida dominou a sala pela força da experiência, da sensatez e da ética que marcaram décadas de carreira — sobretudo nas páginas da editoria policial, onde desafiou estigmas e consolidou seu estilo.

Ao chegar, trouxe consigo uma pasta cuidadosamente organizada com recortes de matérias históricas, prêmios conquistados e imagens emblemáticas. Um verdadeiro relicário de jornalismo, que, ao final do encontro, despertou nos alunos uma mistura de encantamento, surpresa e respeito. “Que capricho, que preciosidade”, diziam, diante da riqueza do acervo.

Coragem, sensibilidade e justiça

Com humildade e bom humor, Jaciara compartilhou episódios marcantes de sua trajetória, como quando venceu o próprio preconceito ao aceitar o desafio de cobrir segurança pública. A proposta veio de um editor que enxergou nela o talento necessário para assumir uma coluna sobre crimes antigos. Ela aceitou, e ali encontrou sua vocação.

“Ninguém queria ser repórter de Polícia. Era visto como um subgênero. Mas ali eu percebi que era onde eu podia usar minha sensibilidade, mergulhar na alma humana.”

Jaciara Santos
Acervo Jaciara Santos

Jaciara relatou coberturas de alto impacto, como a série de reportagens sobre grupos de extermínio na Bahia, que lhe rendeu prêmios da ABI e do Banco do Brasil, e menção honrosa da Universidade de Columbia. Também compartilhou a história de um jovem que sobreviveu a uma chacina policial, mas ficou tetraplégico — uma das matérias mais tocantes de sua carreira.

Outro momento forte foi quando admitiu um erro jornalístico que contribuiu para a prisão injusta de três policiais. “Eu errei, mas depois consegui provar que eles eram inocentes. Essa foi a matéria da minha vida”, admitiu. A experiência virou aprendizado e lema: “Repórter erra, sim. Mas precisa admitir o erro.”

Acervo Jaciara Santos

Troca com os estudantes

O encontro foi uma troca afetiva e intelectual. Os alunos fizeram perguntas sobre ética, persuasão, pressão de redação, sensacionalismo, processo criativo, assédio moral, racismo e o impacto das linhas editoriais. Em todas as respostas, Jaciara foi honesta, acolhedora e firme em seus princípios.

A jornalista defendeu a importância de ouvir os dois lados de uma história e condenou a autocensura. Criticou o jornalismo que se limita a repetir versões oficiais e lamentou o avanço do sensacionalismo nos telejornais populares. “A gente não pode naturalizar a violência. Nem deixar que audiência justifique a falta de apuração”, disse.

Ela também compartilhou experiências pessoais de medo, de cobertura sob risco e do preconceito de gênero, em uma atividade com predominância masculina. E reforçou, com doçura, a importância do diploma de jornalismo, da empatia com fontes e do compromisso com a verdade.

“Orgulho de ser jornalista com diploma”, afirmou Jaciara Santos | Foto: Joseanne Guedes

Um legado que inspira

A aula terminou com uma salva de palmas demorada, carregada de satisfação. Em cima da mesa, estava a pasta com o acervo profissional de Jaciara, que os alunos – curiosos – pararam para folhear. Aqueles papéis amarelados, com manchetes corajosas e histórias impactantes, não eram apenas registros de uma carreira, eram testemunhos de um jornalismo comprometido com a dignidade humana.

Foto: Alexandro Mota

Atualmente, Jaciara está fora das redações e da atividade de assessoria de imprensa, mas segue atuante na Associação Bahiana de Imprensa (ABI), como diretora de Comunicação, e integra o Conselho de Ética do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado da Bahia (Sinjorba). É também uma das idealizadoras do Protocolo Antifeminicídio, que orienta jornalistas a noticiar crimes de gênero com responsabilidade e respeito à vítima e sua família, além de fazer parte do Conselho Editorial da Revista Memória da Imprensa.

“O jornalismo precisa de gente como vocês”, disse ela, ao se despedir dos alunos. E foi impossível não acreditar que cada futuro jornalista ali saiu diferente — mais inspirado, mais sensível, mais preparado para contar histórias que realmente importam.

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