Dentro do Maracanã, festa alemã. Do lado de fora, reprise da violência policial contra jornalistas e manifestantes. Ao contrário do que se tem noticiado, o Brasil não perdeu apenas dentro de campo e a vergonha na Copa do Mundo não se resume à derrota da seleção brasileira.Pelo menos 15 jornalistas foram agredidos pela Polícia Militar durante o protesto que ocorreu na tarde do último domingo (13) na Praça Saens Peña, na Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro, próximo ao Estádio do Maracanã, onde ocorria a final da Copa do Mundo entre Alemanha e Argentina. A ação da PM durante a decisão do Mundial no Rio foi duramente criticada por entidades nacionais e internacionais de defesa da liberdade de expressão e dos direitos humanos.
As prisões de ativistas que participam de movimentos de denúncia dos abusos cometidos em nome da realização da Copa do Mundo no Brasil, com o intuito de esvaziar ou impedir as manifestações antes do encerramento do mundial, não tiveram o resultado desejado. Centenas de pessoas foram às ruas do Rio de Janeiro levando entre suas bandeiras a exigência da libertação imediata dos presos políticos, considerados por alguns movimentos “reféns da Copa”. Duas manifestações aconteceram na cidade-sede da final da Copa e foram violentamente reprimidas pelo aparato policial.
Impedidos de caminhar até o Maracanã e isolados por cordões policias, os ativistas foram alvo de bombas de gás, bombas de efeito sonoro e cassetetes. A cada tentativa de reagrupar e marchar, visando furar o bloqueio policial, choviam bombas e gás. Até mesmo a cavalaria, com policiais armados com espadas foi usada contra os manifestantes. Ativistas, além de jornalistas e midialivristas foram chutados, enforcados pela PM, como mostram os vídeos espalhados pelas redes sociais.
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No emblemático episódio, um jornalista canadense leva um chute no rosto de um PM. Em vídeo publicado pelo jornal Nova Democracia, o profissional de imprensa Jason O’Hara aparece no chão, sem oferecer resistência, quando acaba recebendo um chute no rosto de um policial militar. Mais adiante, o vídeo mostra O’Hara ferido na perna e lamentando “ter sido roubado” por um policial durante toda a confusão. “Agora, estou sem GoPro (marca da câmera que utilizava). Fui roubado por um policial”, comentou. Além de O’Hara, pelo menos outros dois jornalistas estrangeiros – um peruano e outro italiano – ficaram feridos, em uma ação semelhante à que feriu duas jornalistas da rede americana CNN na abertura da Copa, em São Paulo, no último dia 12 de junho.
O fotógrafo do Portal Terra Mauro Pimentel, 28 anos, também diz ter sido alvo de agressões por parte da PM quando fazia uma reportagem sobre a manifestação. Em entrevista ao G1-Rio, ele contou como foi a ação da polícia. “Eles gritaram: ‘Para trás, para trás’, começaram a bater e jogaram o spray de pimenta”. Mauro afirmou ainda que estava identificado como jornalista. “Estava de crachá e com capacete preto escrito ‘imprensa’ e com a logo do Terra. Não tinha como fazer confusão”, garantiu o profissional, destacando que a atuação da PM foi diferente neste domingo. “Estou cobrindo as manifestações desde meados do ano passado. Já vi policiais praticando agressões e outros pedindo para agir de forma diferente. Ontem não. Todos estavam hostis desde o início”, contou.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) disse que neste domingo foi registrado o maior número de ocorrências contra jornalistas em manifestações durante a Copa. Para a Abraji, os casos mostram o uso desproporcional de força por parte da polícia, e o desrespeito à liberdade de expressão. A entidade contabilizou 38 casos de prisões, agressões e detenções envolvendo 36 profissionais da comunicação durante a cobertura de manifestações de 12 de junho a 13 de julho de 2014. “Seguindo o padrão observado desde junho do ano passado, a maioria das violações (89%) partiu da polícia. Dentre estas, 52% foram intencionais – ou seja, o comunicador se identificou como profissional a serviço ou portava identificação à vista. As demais agressões partiram de manifestantes e de seguranças privados da FIFA”, afirma comunicado.
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O Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro (SJPMRJ) afirmou em nota que “o Estado brasileiro e o governo estadual do Rio de Janeiro ignoraram direitos individuais e coletivos de brasileiros e visitantes, assim como cassaram a liberdade de expressão e a de imprensa (…). Tais práticas de Estado caracterizam grave ofensa a nossa categoria e prejudicam a sociedade como um todo. Sem o respeito ao direito à informação, não há garantia de liberdade ou de democracia”. Segundo dados do SJPMRJ, a polícia “é responsável por 68% dos casos de violência contra jornalistas e comunicadores”, sendo que 90 já foram agredidos desde maio de 2013 na cidade.
Em nota, a Polícia Militar alegou que dados da Inteligência mostravam que um grupo tinha a intenção de se dirigir à entrada do Maracanã, colocando em risco a segurança de milhares de torcedores. A corporação ainda afirmou que todas as denúncias e imagens recebidas relativas a excessos cometidos por policiais militares serão encaminhadas à Corregedoria e apuradas.
*Com informações do G1-Rio, Brasil Post e ANDES-SN.