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Mulheres jornalistas sofreram 6 ataques por mês em 2021

Levantamento conduzido pela Abraji revela um quadro de afronta à liberdade de imprensa, tendo como principal arma a violência de gênero

Um monitoramento realizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) revelou um dado alarmante sobre a violência de gênero contra jornalistas. De janeiro a 22 de dezembro de 2021, mulheres jornalistas foram agredidas, ofendidas, intimidadas e ameaçadas no exercício da profissão em 78 episódios diferentes, o que resultou em mais de ataques por mês. Foram 62 vítimas ao todo e 34,6% dos ataques usaram o gênero, a sexualidade ou a orientação sexual como ferramenta de agressão. Do total de agressões contra comunicadoras em 2021, 62,8% ocorreram enquanto as profissionais cobriam questões políticas.

Em 71,8% dos casos identificados pela Abraji, mulheres jornalistas foram alvos dos chamados discursos estigmatizantes, agressões verbais com o intuito de hostilizar e descredibilizar as vítimas. Nesse contexto, termos como “militante”, “jornazista”, “lixo” e “comunista” foram empregados para desacreditá-las como profissionais. Expressões misóginas também fizeram parte da dinâmica de agressões e estiveram presentes em 41% dos discursos voltados a jornalistas e comunicadoras, representando 29,5% do total de ataques. Elas foram chamadas de “vagabundas”, “putas”, “biscates”, “feias”, “velhas”, “burras” e “loucas”, entre outras palavras sexistas que instrumentalizam aparência e sexualidade na tentativa de calar suas vozes.

Daniela Lima, apresentadora na CNN Brasil, é uma vítima recorrente desses ataques. Ela foi alvo de sete casos de agressão entre janeiro e novembro de 2021, todos envolvendo discursos estigmatizantes originados ou com repercussão nas redes sociais. Em quatro episódios, seus agressores foram atores estatais como o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ); os deputados federais Carlos Jordy (PSL-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PSL-SP); o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo; o assessor especial de Jair Bolsonaro (PL-RJ), Tercio Arnaud Tomaz, e o próprio presidente que, em 1.jun.2021, chamou Lima de “quadrúpede”, durante entrevista dada em frente ao Palácio do Planalto. A jornalista também foi chamada de “vaca”, “louca” e “desprezível”.

No dia 8 de novembro, a jornalista foi mais uma vez agredida ao cobrir temas políticos quando noticiou a soltura do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), preso por apologia ao AI-5 e por atacar em redes sociais ministros do Supremo Tribunal Federal. Bolsonaristas tomaram o Twitter com mensagens que tachavam Lima de “lixo”, “louca” e “militante”.

Na Bahia

De acordo com a Abraji, casos como o de Daniela escancaram a violência que as jornalistas sofrem no atual cenário político brasileiro, mas muitos outros episódios permanecem nas sombras. Em novembro de 2021, a Abraji noticiou o caso da jornalista Alana Rocha, que atua em Riachão do Jacuípe (BA), a cerca de 200 km de Salvador. O caso de Rocha envolveu  perseguições de funcionários da prefeitura da cidade e a violência transbordou o ambiente on-line, chegando a ameaças e ofensas diretas. Por ser uma mulher trans, os ataques foram acompanhados de xingamentos transfóbicos.

O estigma que acompanha as agressões ligadas ao gênero leva à subnotificação desses episódios. Por isso, a Abraji lançou um canal para denúncias de ataques de gênero a profissionais de imprensa. Por meio dele, é possível registrar situações vividas ou presenciadas ao longo de 2021.

As agressões foram registradas no âmbito do projeto Violência de gênero contra jornalistas, iniciativa da Abraji realizada com financiamento da UNESCO e parceria de Mulheres JornalistasInstituto Patrícia GalvãoFenajGênero e NúmeroCPJ e Repórteres sem Fronteiras. Em 1.dez.2021, foi lançada a plataforma do projeto para reunir informações sobre os ataques com viés de gênero que vitimaram comunicadoras e comunicadores no país, além dos ataques contra mulheres jornalistas aqui apresentados. O monitoramento é a extensão de um trabalho focado em violações da liberdade de imprensa, realizado pela Abraji em parceria com a rede Voces del Sur desde 2019.

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