Um dado que vem chamando a atenção nas redações de jornais e sites do Brasil refere-se ao aumento de mulheres em postos de comando. Um relatório de 2015 do Projeto Global de Monitoramento da Mídia (Global Media Monitoring Project, em inglês) registra que o número de mulheres jornalistas em redações tem aumentado não só no Brasil mas também na América Latina. O levantamento revela que as mulheres correspondiam a 47% dos repórteres em meios impressos, 36% dos radialistas e 50% dos repórteres de TV.
O estudo registra que, enquanto os jornalistas homens são mais valorizados por sua experiência profissional, as mulheres são mais valorizadas por sua idade: 43% das repórteres têm entre 19 e 34 anos, enquanto apenas 14% dos repórteres correspondem a essa faixa etária; e 53% dos jornalistas homens têm entre 35 e 49 anos, enquanto apenas 33% das jornalistas estão nessa faixa etária.
A jornalista e escritora Regina Helena de Paiva Ramos, 86 anos, lembra que, quando começou a carreira, há 50 anos, não sofreu grandes descriminações, mas viu muitas colegas de trabalho passarem por situações constrangedoras, onde se menosprezava a capacidade intelectual feminina. Ela destaca a dedicação feminina para o estudo. “Somos ótimas pesquisadoras”, atesta.
Segundo pesquisas, empregadores de todo o mundo investem nos valores femininos por conta da facilidade em aceitar o desenvolvimento de trabalhos em equipe, o poder de convencimento levando a credibilidade de suas ideias, sem necessidade de autoritarismo, trabalho em forma de cooperativismo deixando de lado a competição, sem limites de cargos e salários, o que prejudica a produtividade de qualquer trabalhador.
Ronaldo Mendes, Gestor em Recursos Humanos, acrescenta que as mulheres se preocupam mais com sua formação profissional do que a maioria dos homens, por isso se destacam mais por sua diversidade e processos multifuncionais. O gestor ressalta que não existe mais no jornalismo, assim como em várias profissões, a famosa guerra de sexos. “As redações têm registrado uma grande oportunidade de evolução e ocupação das mulheres”, analisa.
Em parceria com a Gênero e Número, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) prepara uma pesquisa inédita sobre desigualdade de gênero no jornalismo. O levantamento, que será divulgado em junho durante o 12º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, reunirá dados sobre o perfil das mulheres nas redações brasileiras, incluindo as que trabalham em veículos independentes.
Jornalista era chamada de “atrevida” na década de 50
A jornalista e escritora Regina Helena de Paiva Ramos, 86 anos, começou a trabalhar na década de 50. Havia aproximadamente 30 mulheres nas redações no estado de São Paulo. Quando Regina escreveu seu livro “Mulheres Jornalistas: A Grande Invasão”, há cinco anos, as mulheres já ocupavam mais de 50% desses postos de trabalho.
A autora conta que ser repórter, naquele tempo, não era uma profissão “muito comum para uma mocinha”. Essas mulheres eram consideradas “atrevidas”. Segundo ela, apesar de não ter sofrido grandes descriminações, viu muitas colegas de trabalho passarem por situações constrangedoras, onde se menosprezava a capacidade intelectual feminina. O jornalista Hermínio Cachetta, diretor de O Tempo, foi o responsável pela entrada de muitas mulheres nas redações em São Paulo.
“Ele me “discriminava” com um certo paternalismo”, uma proteção diferenciada. Mas muitas mulheres devem passavam por situações de constrangimento que não se comentava na época, hoje o chamado assédio. Eu sequer tinha a noção de que era uma pioneira”.
Uma das primeiras repórteres da Última Hora, Sonia Nemberg entrou no jornalismo através do diploma. Para a jornalista as mulheres entraram na profissão pela sua competência. “É uma profissão difícil porque trabalhamos com o tempo. Muitas vezes precisamos fechar uma edição e não conseguimos os depoimentos. Temos que cobrir enchentes, desabamentos, tragédias, e também lindas histórias é um desgaste mental e emocional grande, um exercício de confronto com a realidade. E a mulher lida bem com essas dificuldades”. Outra razão, segundo Sônia, é a dedicação feminina para o estudo: “Somos ótimas pesquisadoras pois nos dedicamos muito e somos muito intuitivas. Acho que quando as mulheres têm oportunidade elas se destacam”.
Sônia lembra que as mulheres entraram no jornalismo para trabalhar por salários mais baixos, e o os homens saíram por conta da precarização da profissão, e que no futuro esse número de mulheres na profissão vai aumentar pois é maior a quantidade de universitárias em relação aos universitários no seguimento profissional. Apesar de toda a emancipação feminina, Sônia alerta que o Brasil ainda é um país muito machista e que a violência contra a mulher é um fenômeno muito grande apesar de todo o trabalho da mídia no sentido de combater a violência contra a mulher.
Diretora de redação do jornal “Valor Econômico”, Vera Brandimarte afirmou que as mulheres são maioria nas redações de jornalismo econômico, uma tradição que começou a se formar nos anos 70. “Nos anos 90, as mulheres já dominavam as posições de editoras de economia. No “Valor”, tem oito mulheres editoras e quatro homens. Não é uma questão de preferência, mas de mérito”. Vera lembrou que em outras áreas a dificuldade de ascensão da mulher é mais difícil, como o setor bancário e o de engenharias. Ela lembrou que, fora das redações, ainda persiste um desequilíbrio entre as atividades delegadas às mulheres e aos homens, como nas questões domésticas e na criação dos filhos.
*Matéria de Cláudia Sanches e Edir Lima para a Associação Brasileira de Imprensa (ABI)