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Três destinos num Circuito Ruyano, dos muitos que giram mundo afora

Primeira parada: Caravelas, Bahia

Luis Guilherme Pontes Tavares*

Caravelas, município do litoral sul da Bahia, tem a ver com Ruy Barbosa (1849-1923). Vamos tratar disso neste artigo. E nos próximos, trataremos da Vila Maria Augusta, ampla propriedade em que ele e a família viveram em Botafogo, no Rio de Janeiro, e da casa de veraneio que ele possuiu na Avenida Ipiranga, 415, em Petrópolis. Fiz o circuito, um dos muitos que poderia receber o adjetivo “ruyano”, de carro. No caso do primeiro destino, Caravelas, apreciaria repetir embarcado numa lancha.

O Circuito Ruyano mais óbvio, parte da casa natal, em Salvador, e se encerra em Petrópolis, onde Ruy Barbosa faleceu em 01 de março de 1923. A propósito de Salvador, haveria dois outros endereços a visitar, caso os identifiquemos, um na Piedade e o outro em Plataforma. No primeiro ele se hospedava quando visitava Salvador; no outro, teria residido com o pai na primeira metade da década de 1870. Mas há o circuito ruyano do exílio (Argentina, Portugal e Inglaterra); há o circuito ruyano das campanhas para presidente da República e para Governador da Bahia; há o circuito ruyano de moradas no Rio de Janeiro até assentar-se na Vila Maria Augusta; e há outros tantos.

CARAVELAS, DOS ALMEIDAS

“Coronel José” e Luis Guilherme na Praça do Sossego, em Caravelas | Foto: Romilda Tavares

Inicio a abordagem sobre o primeiro destino do Circuito Ruyano que elegi para percorrer em junho passado lembrando a sentença do professor e ex-deputado Rubem Nogueira (1913-2010) a respeito de Ruy Barbosa: “é o personagem mais notório e menos conhecido” do Brasil. Ele foi o último ruyano entre os baianos, tem obras publicadas sobre a vida e a atuação do jurista e é o doador de muitos livros que compõem a biblioteca do Museu Casa de Ruy Barbosa (MCRB). A advertência do professor Nogueira foi lembrada pela neta dele, a empresária Mariana Lisboa, quando, em nome da avó e demais familiares, autorizou, em 21set2021, à ABI a criar medalha com o nome do doador. A propósito da frase, ela ecoa nestas considerações do engenheiro e general de brigada (reformado) José de Almeida Oliveira, 96 anos, sobre sua terra natal: “Qualquer tentativa de escrever algo sobre a evolução histórica de Caravelas, de imediato surgirá um forte obstáculo: a falta de subsídios, de registros, de anotações”.

Caetano Vicente de Almeida

Autor de vários livros, dentre os quais o recente Caravelas. Uma trajetória histórica da Princesa de Abrolhos, v. 1, o “Coronel”, como é tratado pelos conterrâneos, foi o principal interlocutor, tendo aberto o portão da Chácara das Oliveiras, onde vive com a esposa, dona Eleonor Scofield Almeida, e nos atendeu durante a tarde de 11 de junho passado. Conversamos sobre a ligação de Ruy Barbosa com Caravelas e ele apontou o livro do pesquisador e tradutor Fábio M. Said – O clã Almeida de Caravelas e Alcobaça. Volume 2 da Coleção Antigos Clãs de Alcobaça (São Paulo: e.a., 2012) – como fonte confiável.

Vamos ao que interessa neste artigo: exibir a relação de Ruy com a Princesa de Abrolhos.

É provável que a licença poética do escritor Antonio Soares de Alcântara (1883-1960), autor do hino do município, tenha comprometido a exatidão da história do lugar. Num dos versos, o poeta informa que a cidade foi “Geratriz do genial Ruy Barbosa”. O pesquisador Fábio Said, que ora reside na Alemanha, recompôs a árvore genealógica do baiano e constatou que a avó dele, Maria Adélia Barbosa de Oliveira, é filha de Caetano Vicente de Almeida, de família da região do litoral sul, e Luiza Clara Joaquina Barbosa de Oliveira, também descendente do patriarca português Antonio Barbosa de Oliveira, que chegou ao Brasil no século XVIII e faleceu em 1784.

O PAI DE RUY EM CARAVELAS

Há no livro de Said um parágrafo esclarecer:

“Através de um documento de 1846 existente no arquivo da família Barbosa de Oliveira, na Casa de Rui Barbosa (Rio de Janeiro), fica-se sabendo que o dr. João José clinicou em Caravelas no ano de 1844. Trata-se de um atestado emitido pelo juiz de paz de Caravelas, Hermenegildo Neves de Almeida, afirmando que o dr. João José Barbosa de Oliveira tratou e curou um sobrinho seu que estava enfermo. Aparentemente, o dr. João José clinicou apenas momentaneamente em Caravelas, pois no final do mesmo ano ele estava de volta a Salvador e ali fundou uma clínica. Não se sabe se o dr. João José Barbosa de Oliveira retornou a Caravelas.” (p. 226)

E, em seguida, na mesma página, este outro esclarecimento:

Na placa, se lê “Aqui nesta casa eu fui gerado” como sendo frase dita por Ruy Barbosa | Foto: Romilda Tavares

“É bastante provável, porém, que o dr. João José tenha se dirigido a Caravelas no mesmo iate que levou seu primo sobrinho e futuro cunhado, o capitão-de-fragata Hermenegildo Antonio Barbosa de Almeida […]. Há registro de que o iate saiu de Salvador em 9 de junho de 1844, avistando o Monte Pascoal no dia 15 de junho. […]: A tradição popular em Caravelas e a memória familiar do clă Almeida registram que Ruy Barbosa era intimamente ligado a Caravelas.”

O escritor José de Almeida Oliveira, quando nos apontou o livro de Said, proporcionou duas constatações: os pais de Ruy, o médico João José e dona Maria Adélia, até prova em contrário, não estavam em Caravelas nos primeiros meses de 1849 e, portanto, não conceberam ele no imóvel da Avenida Sete de Setembro, 98. Se a documentação não sustenta tal afirmação, por que razão o município autorizou a fixação de placa no imóvel? Ademais, quanta audácia do autor quando aspeou e assinou como se o atestado fosse passado pelo próprio Ruy!

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*Jornalista, produtor editorial e professor universitário. É 1º vice-presidente da ABI. [email protected]

Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI). 

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