ABI BAHIANA

Debates e lançamentos editoriais encerram comemoração de 93 anos da ABI

Diversidade e fake news pautaram a discussão; uma jam session com jornalistas fechou a programação deste sábado (16)

Importância da diversidade nas redações, combate às fake news e um passeio pela memória. Esses foram alguns dos destaques do encerramento da programação pelo aniversário da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), que aconteceu neste sábado (16), no Auditório Samuel Celestino, localizado na sede da entidade, no Edifício Ranulfo Oliveira, no Centro Histórico de Salvador.

Ao longo de um mês, desde o dia 17 de agosto, a entidade vem promovendo eventos e debates para celebrar seus 93 anos. O último dia da programação batizada de “ABI, 93 anos vivendo a história do Brasil na Bahia” teve dois painéis do quarto eixo temático sobre Cultura, democracia e diversidade. A data também contou com o lançamento de uma edição especial da Revista Memória da Imprensa e do catálogo da exposição Ginga Nagô, que homenageia a obra do fotojornalista Anízio Carvalho.

>> Link para a gravação – https://www.youtube.com/live/FovFad8fJZc?si=W6jxo1h17UBjWh_W

“O encerramento da programação e o saldo para os dois painéis do sábado foram muito bons. Já havia, claro, uma expectativa grande com relação ao lançamento da revista e do catálogo. O resultado também deixou a gente muito satisfeito e nada mais gratificante do que ver a felicidade de Anízio, que tem a idade da ABI”, destacou o presidente da entidade, Ernesto Marques.

Depois de uma manhã de intensas atividades, convidados e participantes puderam acompanhar uma jam session promovida pela banda Rita Tavarez Quarteto. Além dos músicos, o momento foi aberto a contribuições de quem mais quisesse cantar ou tocar algum instrumento. Todo o evento foi transmitido em tempo real pelo canal da ABI no YouTube.

Diferenças

O dia começou com os acordes da guitarra de Gregory Baratoux, logo na abertura do evento, para a recepção do público. Em seguida, teve início o primeiro bloco, intitulado “Diversidade nas Redações: As redações refletem o perfil da sociedade? Como abordar as diferenças sem estigmatizar?”.

Este painel contou com a participação dos jornalistas Danila de Jesus e Jorge Gauthier, e do fotógrafo e podcaster Matheus Lens. O debate foi mediado pela 1ª presidente da ABI, Suely Temporal, que, a partir desta segunda-feira (18), assumirá o comando da associação como presidente interina.

Danila de Jesus, que é coautora de obras como “Guia Diversidade nas Redações – um guia para gestores(as), editores (as), jornalistas” e doutoranda em Cultura e Sociedade, destacou que a comunicação tem a mesma fotografia dos grupos de poder.

“Se comunicação é poder, a gente sabe que, no Brasil, a pobreza tem cor. Quando a gente fala de espaços de poder, a gente está falando que são espaços apartados dessa diversidade”, afirmou, citando também grupos como ciganos e indígenas, que estão na base das pirâmides das notícias. “É importante pensar diversidade como interseccionalidade”, acrescentou.

Já Jorge Gauthier, que criou o Me Salte, canal LGBTQIA+ do Jornal Correio, lembrou que não se trata apenas de apresentar números que mostram que empresas têm quadros diversos. “Onde essas pessoas estão? Elas estão em posição de direcionar o conteúdo jornalístico? Acho que mais importante até do que falar em diversidade é observar de que maneira os números estão sendo aplicados. Que mensagem a gente está passando para a sociedade?”, questionou.

O fotógrafo e podcaster Matheus Lens é responsável pelo “Fala Preto Podcast”,  que promove conversas protagonizadas principalmente por pessoas pretas, a respeito de tópicos como saúde, música, moda, empreendedorismo e política. No podcast, Matheus contou que conseguiu fazer comunicação da forma como acredita.

“Diversidade e inclusão são palavras que hoje em dia têm sido muito utilizadas, mas, na prática, não é assim. Tem o teste do pescoço, que é uma forma de análise de olhar para o lado. Existe de fato diversidade nos meios de comunicação? E não é só pessoa preta e branca, mas pessoa trans, pessoa com deficiência, indígena? Será que tem? Por que não tem? A falta dessas pessoas impacta demais na produção desses veículos”, pondera.

Mediando o debate, Suely Temporal trouxe o questionamento da estigmatização. Ela pontuou como é importante conquistar esses espaços sem estigmatizar as pessoas que alcançarem essas posições de poder.

Para Matheus Lens, o diálogo é a base para alcançar isso, mas é preciso perseguir o que ele chamou de inversão da pirâmide. De acordo com ele, seria o momento de trazer pessoas da base da pirâmide da produção para o topo. “Se vai um dia acontecer, não sei.  Mas estou esperançoso que possa ser refletido de forma igual”.

Além disso, outra forma de abordar o assunto seria o que Danila de Jesus chamou de “chamar para a roda”. “É pautar e chamar pessoas para conversar. É chamar para os processos de decisão, que estão até na reunião de pauta. Como é difícil pautar os nossos territórios na mídia tradicional? Será que no Calabar e no Alto das Pombas só tem criminalidade? Tem que trazer essa diversidade de corpos e territórios para dentro da redação. Não existe fortalecimento da democracia sem jornalismo diverso”, enfatizou.

O jornalista Jorge Gauthier, por sua vez, lembrou de um dos momentos que inspirou a criação do canal Me Salte. Há alguns anos, foi pautado para cobrir a “parada gay”, algo que lhe incomodou. “Voltei para a redação com um texto que dizia ‘a parada não é sobre gays, não existe parada gay’. As pessoas não entendiam ou não queriam saber que não é só de homens gays que se forma esse anagrama”, disse, referindo-se à sigla LGBTQIA+.”Só vai ter diversidade se os pensamentos forem diversos. Se não tiver pessoas da periferia, pessoas gordas, pessoas negras, essas pautas não vão aparecer”.

Digital

O segundo painel do dia, que teve como título “O PL das Fake News ameaça a democracia?”, contou com a participação do jornalista e professor Yuri Almeida e a mediação do jornalista e radialista Ernesto Marques, presidente da ABI.

Em sua exposição, Yuri reforçou que jornalistas têm um papel fundamental no combate às fake news. Ele explicou, inclusive, que ainda que muita gente associe fake news à tecnologia, elas já existiam muito antes disso, sob diferentes formatos.

“Nosso desafio é que as fake news têm compartilhamento muito maior do que as notícias. É impossível prever de onde isso vai sair. Você tem laboratórios no mundo inteiro criados para construir fake news”, explicou.

Embora elas sejam potencializadas pela inteligência artificial, ainda existem pessoas que atuam diretamente para a circulação desses conteúdos. Além disso, as empresas de tecnologia, como as big techs, têm dado respostas insuficientes para esse enfrentamento, ao passo em que as fake news tendem a se proliferar em ambientes de ódio.

“Às vezes, a gente fica muito descrente do papel do jornalismo. Como vou combater, se as notícias circulam mais rápido?”, lembrou, citando o exemplo das agências de verificação de notícias.

No Nordeste, não há nenhuma iniciativa do tipo atualmente – todas as experiências estão no eixo Sul-Sudeste. “Cadê nossa visão empreendedora para isso? Somos profissionais, sabemos fazer apuração e contar histórias. Existem algumas histórias que precisam ser desmentidas. Esse pode ser um caminho para o futuro”, concluiu.

História

Também na manhã deste sábado, o lançamento da quarta edição da revista Memória da Imprensa, em seu número especial de aniversário, fez parte do projeto “Memória da Imprensa – A História do Jornalismo Contada Por Quem Viveu”. Cada publicação conta histórias de jornalistas veteranos que foram importantes para a construção do trabalho de imprensa no estado. 

Nesta edição, leitores vão poder conferir os relatos de Lady Eva, Alexandre Seixas, Zé de Jesus Barreto, Nelson Cadena e Vitor Hugo Soares, além de artigos sobre a programação pelo aniversário da ABI. “Foi um desafio, realmente, mas o resultado foi gratificante.

É a primeira vez que estou envolvida na produção e foi um dos trabalhos mais gratificantes de dizer que nasceu”, reforçou a diretora de comunicação da ABI, Jaciara Santos, responsável pela coordenação geral da publicação. 

Já o catálogo da exposição Ginga Nagô foi diagramado pela Bamboo Editora e entregue a todos os visitantes do Museu de Imprensa neste sábado. Desde abril, a mostra está disposta no museu, que fica no andar térreo do Edifício Ranulfo Oliveira.

A exposição traz registros fotográficos de momentos históricos da Bahia e do Brasil a partir das lentes do fotojornalista Anízio Circuncisão de Carvalho, que, tal qual a ABI, completou 93 anos em 2023. A mostra tem curadoria do jornalista de imagem Manu Dias.

“Graças a Deus, eu fotografei todos os eventos difíceis na Bahia. Fotografei a Rainha Elizabeth II, Martha Vasconcelos, Mãe Menininha, Mãe Stella…Fui um felizardo porque não tive tempo de ir à faculdade. Eu estudei o primário e o jornal me ensinou muita coisa. Graças a Deus, esse catálogo veio complementar meu resto de vida”, disse ele, que agradeceu nominalmente à ABI e ao presidente da entidade Ernesto Marques, durante o lançamento.

O fim da programação ainda contou com uma jam session para celebrar a existência da ABI. “Somos uma entidade de defesa corporativa e, nesse momento de defesa do jornalismo, estamos sempre a postos. Mas, para que a gente tenha ânimo nos momentos mais difíceis, é importante que a gente tenha também momentos como esse de confraternização e alegria”, ressaltou Marques.

No comando da jam session, a jornalista Rita Tavarez preparou, com o quarteto, um repertório especial, com clássicos da Música Popular Brasileira. “A gente pegou várias vertentes da nossa música e é um prazer muito grande estar aqui fazendo parte dessa dessa revitalização da ABI. Estou muito feliz”, comemorou.

A programação técnico-científica e cultural do ciclo “ABI, 93 anos vivendo a história do Brasil na Bahia” teve como parceiras incentivadoras as seguintes empresas e instituições: Tribunal de Contas do Estado da Bahia, Prefeitura Municipal de Salvador, Associação Baiana das Empresas de Base Florestal – ABAF, Suzano Papel e Celulose, Companhia de Gás da Bahia – Bahiagás, Sebrae Bahia, Assembleia Legislativa da Bahia, Governo do Estado da Bahia e o portal Bahia Notícias. A produção ocorre em parceria com a Empresa Júnior de Comunicação da Universidade Federal da Bahia, a Produtora Júnior.

Assista no Youtube da ABI:

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