A demissão da repórter do iG, que denunciou por assédio sexual o cantor MC Biel, foi recebida por críticas de jornalistas e internautas. Desde que o colunista Fernando Oliveira, da Folha de São Paulo, revelou no último dia 18/6 que a jornalista havia sido dispensada pelo veículo de comunicação, todas as publicações do iG no Facebook recebem comentários indignados. O desligamento da profissional, cuja identidade é protegida por determinação policial, gerou uma onda de protestos nas redes sociais e desencadeou campanhas contra o assédio, além de boicote ao portal.
A repórter foi assediada durante uma entrevista de lançamento do CD do cantor, em maio deste ano. Áudio revelado pelo portal, mostra que ela foi chamada de “gostosinha” e ouviu que MC Biel “a quebraria no meio”. Ele ainda afirma na gravação que, se a entrevista com ela fosse a última, a “estupraria rapidinho”. Em determinado momento da entrevista, ele a chama de “cuzona” e pergunta se ela queria um selinho. No vídeo, são ouvidos risos ao fundo, enquanto uma pessoa que acompanha a filmagem justifica a atitude. “Relaxa, ele é assim mesmo”. A repórter denunciou o caso na 1ª Delegacia da Mulher de São Paulo, que faz a investigação. O cantor divulgou um vídeo pedindo desculpas pela “brincadeira”.
Apesar da repercussão do caso, nenhuma entidade de jornalismo havia se pronunciado sobre o tema publicamente. De acordo com o Portal IMPRENSA, o veículo tentou contato com o Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo (SJSP), Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) para que pudessem se posicionar sobre o assunto. No entanto, somente a Fenaj decidiu comentar o caso.
Em nota enviada à reportagem, a entidade repudiou o assédio do cantor. “Mesmo que tenha se desculpado publicamente, dizendo que foi tudo uma brincadeira, o jovem cantor certamente sabe que brincadeiras não devem agredir nem assediar ninguém”. Porém, considera grave a demissão da repórter pelo iG. “Em vez de defender e proteger sua profissional, a empresa a pune pela denúncia com a demissão. Essa é uma postura inadmissível, de quem culpa as vítimas de assédio e de violência sexual pela agressão sofrida”. A Fenaj ainda ressaltou que busca, junto com o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, mais informações sobre o caso.
A jornalista Nana Queiroz, diretora executiva da revista AzMina, criticou duramente o veículo por desligar a repórter depois de prometer auxiliá-la no caso. “A decisão do IG não só é de extrema irresponsabilidade jornalística, já que a missão de todo veículo de respeito é proteger seus repórteres contra abusos, como de tremendo machismo. Até quando as direções de veículos de comunicação se posicionarão em favor dos mais fortes em detrimento dos verdadeiros inocentes?”.
O coletivo Think Olga também se posicionou sobre o assunto, ressaltando que a medida do iG fez com que criassem uma campanha sob a hashtag #ViolênciaEmDobro. “O assédio sexual é uma violência em dobro. Acontece quando a mulher sofre e se repete quando ela resolve fazer uma denúncia. Apesar do assédio sexual ser previsto em lei e a mulher ter essa proteção, na prática ela não se exerce. Quando a mulher fala do assédio da empresa existem outras consequências a encarar: medo de perder emprego, perder oportunidades na carreira, deixar de participar de projetos, perder promoções, ficar “queimada” dentro da empresa ou até mesmo de ser demitida e ficar “queimada” no mercado de trabalho”, diz Luíse Bello, gerente de conteúdo e comunidade OLGA. Para ela, a falta de posicionamento das entidades de jornalismo é “uma omissão que deixa uma mensagem inequívoca de que o mercado de trabalho e as entidades que deveriam proteger os profissionais, não estão do lados das mulheres, não estão do lado das vítimas”.
Procurado pelo Catraca Livre, o portal iG comentou o caso por meio de uma nota enviada por e-mail: “A empresa está seniorizando a equipe no intuito de melhorar nosso conteúdo próprio. Trata-se de uma reestruturação normal em função dessa necessidade. A repórter continuará recebendo todo o apoio da empresa e seus funcionários no caso”.
Campanhas
Em solidariedade à colega, jornalistas mulheres se uniram nesta segunda-feira 20 por uma campanha nas redes sociais contra o assédio. A campanha divulga a hashtag #jornalistascontraoassédio e já reúne cerca de 9 mil curtidas na página no Facebook até a manhã desta terça (21). “Jornalista sofre assédio? Onde? Quando? Por quê? Antes fossem simples como um lead jornalístico as respostas para uma questão como essa – mais comum no dia a dia das profissionais do jornalismo do que se pode imaginar. Dentro ou fora das redações. Dentro ou fora das assessorias de imprensa”, começa o manifesto publicado na fanpage.
Em um vídeo, várias jornalistas relatam comentários machistas que já ouviram de entrevistados, chefes e até autoridades. “Se eu soubesse que você era bonita assim te dava uma exclusiva”, conta uma jovem, sobre uma fonte. “Esse político só vai falar pra sua matéria se você for tomar um café com ele, jogar um charme”, ouviu outra.
IMPRENSA também lançou uma campanha: #SemASSÉDIOnaimprensa. O objetivo é mostrar como repórteres do sexo feminino e masculino estão expostos ao assédio moral e sexual, tentando encontrar ao lado de especialistas e das entidades ligadas à imprensa formas de reduzir/acabar com esse tipo de ação com soluções práticas. Jornalistas e comunicadores de todo o Brasil podem contar suas histórias, sob anonimato, se assim o desejar, para que todos possam ficar de olho e ajudar no combate ao assédio à imprensa. Os interessados devem mandar seus relatos para o e-mail: [email protected], colocando no assunto: depoimento sem assédio na imprensa. O portal garante sigilo das identidades da vítima e do assediador.
Assista ao vídeo da campanha #jornalistascontraoassédio
*Informações do Portal IMPRENSA, Catraca Livre e O Povo Online.