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Ruy Barbosa na Corte Internacional de Haia

Nelson Cadena relembra os 100 anos da eleição do ‘Águia de Haia’ para integrar a primeira Corte Internacional de Justiça

Por Nelson Cadena*

Em 14 de setembro de 1921, Ruy Barbosa galgou o mais importante degrau na carreira de um jurista, ao ser escolhido para integrar a primeira Corte Internacional de Justiça, com sede em Haia. O baiano teve 38 votos, entre os 42 eleitores da Liga das Nações, o mais votado. Os jornais europeus já previam que Ruy e o italiano Anzilotti integrariam a Corte, o que ninguém previu foi uma votação tão consagradora. Ruy foi eleito em primeiro escrutínio; outros membros da Corte, a maioria, passaram pela angústia de um segundo turno.

Ruy foi eleito, mas não chegou a tomar posse por motivos de saúde. Já estava convalescente quando a Liga das Nações, o correspondente hoje ao Conselho da ONU, procedeu à escolha do primeiro júri, com jurisdição internacional, de acordo com o disposto no Tratado de Versalhes, em 1919. Foram eleitos Ruy Barbosa com 38 votos; Rafael Altamira (Espanha) com 28; Antônio Bustamante (Cuba) com 26 e mais Dionísio Anzilotti (Itália); Bassett Moore (Estados Unidos); Lorde Finlay (Inglaterra); Alejandro Alvarez (Chile); André Weiss (França); Yorozer Oda (Japão); Hans Huber (Suíça) e Bernard Loder (Holanda), que em junho do ano seguinte seria eleito o primeiro presidente da Corte.

Leia também: Cronologia de Ruy em Haia

A eleição de Ruy para o tribunal internacional teve grande repercussão no Brasil em todas as instâncias, públicas e privadas: Presidência da República; Senado; Câmara de Deputados; assembleias estaduais; tribunais de justiça; inúmeros órgãos de classe, faculdades e colégios secundaristas… A saúde fragilizada do conselheiro não lhe permitiu participar de nenhum evento em sua homenagem fora de sua residência. Em casa, recebeu as delegações que foram cumprimentá-lo.

Dona Maria Augusta, sua esposa, deve ter batido cabeça para receber tanta gente, por semanas, em romaria. Imagino que serviu sucos de frutas e biscoitos, quem sabe sorvetes que estavam na moda. E haja cadeiras para todos. Vinte deputados compareceram numa longa sessão de discursos, com odes ao baiano; estudantes da Faculdade de Direito lhe renderam emotiva homenagem; estudantes dos cursos preparatórios alugaram um bonde e compareceram de turma. Para eles, Ruy abriu o coração: “Sinto-me sem forças para responder a esse concurso de eloquência, pois hoje, nem meu estado de saúde, nem minha falta de voz, me permitem corresponder à altura da emoção que em mim despertaram todos esses discursos”.

Quatro dias depois da eleição, confirmou por telegrama que aceitava a incumbência. Em nenhum momento manifestou a sua intenção de não assumir a Corte. Em 30 de janeiro de 1922, o Tribunal promoveu uma reunião preparatória e determinou a data de 15 de junho para a posse. Ruy e Oda, do Japão, não compareceram. Os amigos de Ruy justificaram a sua ausência – em abril faria uma viagem a Europa. Eram viagens longas e desconfortáveis por mais que o navio oferecesse um bom serviço.

Em 31 de maio Ruy informou ao Tribunal: “Os médicos exigem que eu prolongue a cura”. Em 15 de junho, como previsto, os membros da Corte tomaram posse. Ruy não estava lá. Assumiu o suplente. Epitácio Pessoa foi eleito, em 1924, Ruy já falecido, e permaneceu até 1930.

*Nelson Cadena é jornalista, pesquisador e publicitário.
Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI)

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