Em mais um esforço para viabilizar a aprovação do Marco Civil da internet, o governo decidiu nesta quarta-feira (19) em uma reunião de quatro horas com líderes partidários na Câmara dos Deputados fazer novas concessões e admitiu deixar a votação do projeto para a próxima semana – a pretensão era que ocorresse nesta quarta. Houve acordo com os parlamentares para que sejam realizadas alterações no trecho do projeto que prevê a regulamentação por decreto da chamada neutralidade da rede – que veta a venda de pacotes diferenciados de conteúdo de internet, como acesso somente a e-mails.
A favor do Marco Civil estão nada menos que o próprio governo federal e um sem-número de atores envolvidos com o ambiente virtual, como o Comitê Gestor da Internet no Brasil, comunidade acadêmica, ONGs, sindicatos e entidades internacionais. Mas, para as teles, o Marco Civil não pode ser votado do jeito que vem sendo proposto por uma razão simples: o conceito de neutralidade de rede, criado para proteger o usuário, as impedirá de explorar um modelo de negócios lucrativo.
Sem a neutralidade, nada proíbe provedores de mudar a velocidade da conexão a fim de beneficiar sites parceiros ou prejudicar concorrentes, ou de cobrar preços distintos de acordo com o conteúdo acessado – um modelo que poderia tornar bastante caro um pacote “completo” da internet, com direito a verificar e-mails, visitar redes sociais e assistir a vídeos.
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O texto do deputado Alessandro Molon (PT-RJ) prevê que a neutralidade seja regulamentada por um decreto presidencial. Agora, há possibilidade de ser retirado por completo o trecho do projeto que prevê a edição do decreto. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que o governo aceitou incluir no projeto a obrigatoriedade de a presidente ouvir a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) antes de formular as regras que regularão a venda de conteúdo.
Outros pontos da redação, conforme o ministro, ainda poderão sofrer mudanças e serão discutidos ao longo da semana. Conforme o ministro, ainda que seja retirado o artigo do projeto do Marco Civil que prevê regulamentação por decreto presidencial, este seria o instrumento utilizado para estabelecer as regras de aplicação da lei. Isso porque, segundo o ministro, o inciso IV do artigo 84 da Constituição Federal prevê que é competência exclusiva do presidente da República “sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução”.
A mudança, apesar de discreta, agradaria aos deputados porque esse trecho da Constituição prevê que os decretos servem para a “fiel execução” da lei. O temor dos parlamentares era destinar poderes excessivos ao presidente da República na regulamentação da neutralidade. Mesmo com um aceno do Planalto, a bancada do PMDB na Câmara ainda está rachada sobre a votação do Marco Civil da Internet e vai discutir a posição que será tomada com os outros partidos do chamado “blocão”.
O líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), um dos maiores críticos do texto de Molon, defendeu a proposta de retirar a palavra “decreto” do texto e disse que já há acordo para que isso ocorra. “Eles vão tirar a palavra ‘decreto’ e vão colocar ‘regulamentação para fiel execução da lei, nos termos do artigo 84’. A Constituição fala [em edição do decreto] para a fiel execução da lei. É diferente de um decreto autônomo que possa regulamentar qualquer coisa. Você terá um cumprimento do que está na Constituição”, disse o peemedebista.
Para Cunha, do jeito que estava, sem remeter à Constituição, o texto poderia abrir brecha para que o decreto promovesse alterações no conteúdo e nos princípios da lei do Marco Civil da Internet. “Nessa parte, é um avanço. A preocupação maior é o decreto fazer coisas que não estão previstas na lei. Na prática, você transferir uma regulamentação para decreto é perigoso. Seria dar autorização para que um decreto autônomo pudesse regulamentar em detrimento do disposto na lei”, afirmou.
Mobilização online
Enquanto a novela do Marco Civil continua, usuários promovem mobilizações online para pressionar os deputados a aprovarem o texto. Para lutar pela neutralidade da rede, a organização ‘Meu Rio’ desenvolveu uma ferramenta de “compartilhaço”, que permite que várias pessoas publiquem simultaneamente a mesma coisa no Facebook. No caso, um post a favor da neutralidade da rede com link para a campanha ‘Salve a Internet’ no site. O post leva para a página que permite o envio de e-mails pedindo que a neutralidade da rede seja mantida no texto do Marco Civil. A intenção do compartilhaço era encher a caixa de emails dos deputados com mensagens dos cidadãos.
Mais de 30 mil pessoas cadastraram suas timelines para fazer a publicação ao mesmo tempo, com o seguinte texto padrão: “A qualquer momento, os deputados poderão decidir se a nossa Internet será livre ou dominada pelos interesses das empresas de telecomunicação. Clique no link para mandar um email a eles e mostrar que quem trabalhar contra a neutralidade da Internet estará comprando briga com a sociedade em ano de eleição. #salveainternet”.
Entre os dias 11 e 12 deste mês, possíveis datas da votação do projeto, os usuários já haviam se mobilizado na rede por meio de petições e tuitaços. Milhares de pessoas assinaram a petição online apoiada pelo cantor e ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, a favor da aprovação integral do texto do Marco Civil. O documento já recolheu mais de 100 mil assinaturas e o número continua crescendo.
Informações do G1 e da Folha de S. Paulo