ABI BAHIANA

ABI recebe doação de máquina de escrever da Procuradora do Estado Roxana Borges

No canto de uma sala qualquer, repousava silenciosa uma máquina de datilografia. Tantas vezes os dedos do contador Renato Brasileiro bailaram sobre aquelas teclas que já sabiam de cor os caminhos das palavras. Com o tempo, passou a dividir esse território com uma nova ocupante: sua filha, Roxana Borges, então com 14 anos, estudante da oitava série e apaixonada por contos e histórias. Cansado de ter que disputar espaço com a filha — e reconhecendo o talento que ali florescia —, ele presenteou Roxana com uma máquina Olivetti Tropical novinha em folha.

Hoje, a máquina ganha novo destino. O tempo passou, Roxana Borges cresceu e se tornou Procuradora do Estado da Bahia, mas nunca esqueceu o valor desse presente. Por isso, ela oficializou hoje (30/06) a doação da Olivetti Tropical ao acervo da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), em visita à sede da Associação. Lá, essa máquina será testemunha silenciosa de outro tipo de legado: o do afeto que ensina, da memória que se compartilha, da tecnologia analógica que emocionava em cada batida. Também participaram da doação a mãe de Roxana, dona Auri, e seu filho Miguel.

Foto: Joseanne Guedes

Contando a história da sua decisão de doar esse item de afeto pessoal à ABI, a Procuradora explicou que a máquina estava guardada na casa de sua mãe há anos. Após uma arrumação, ela recebeu a Olivetti de volta e se perguntou o que fazer com ela. Por falta de espaço e uso para esse objeto, decidiu dar ao presente de seu pai uma nova função, numa escola onde crianças pudessem também exercitar o amor à escrita com ela. Ao descobrir a ABI, porém, percebeu como dar à Associação seria mais vantajoso:    

“Encontrei a ABI e achei mais interessante do que uma escola pública, que ninguém sabe que cuidado vai ter, e [o material doado] fica restrito. E várias escolas vêm aqui na ABI, muito melhor do que ficar em uma escola só, né?”, argumentou Roxana.

Foto: Joseanne Guedes

Já o presidente da ABI, Ernesto Marques, recebeu a Procuradora na sede da ABI e demonstrou a sua gratidão pela escolha dela. “Nós agradecemos pelo fato de termos sido escolhido para isso, né? Por esse reconhecimento com uma casa que cuida da memória. Isso é uma honra.” declarou ele.

Biblioteca

A Biblioteca da ABI, onde fica a maior parte das outras máquinas de escrever do acervo da instituição, já recebeu muitas visitas de escolas públicas, sempre com grande entusiasmo das crianças por esses equipamentos. Atualmente, porém, essa biblioteca se encontra fechada sem previsão de retorno. Como desdobramento das complicações financeiras associadas à defasagem do aluguel do Edifício Ranulfo Oliveira, devido pela Prefeitura de Salvador à Associação, a biblioteca está sem pessoal para receber novas visitas. Por esse motivo e muitos outros, a Associação busca resolver o quanto antes o impasse com a Prefeitura, e poder trazer mais jovens para conhecer seu acervo outra vez.

Texto: Mara Santana e Caio Valente

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ABI BAHIANA

O valor do tempo: Revista Memória da Imprensa discute etarismo na comunicação

Em tempos de acelerada obsolescência – de máquinas, modas e até memórias -, envelhecer tornou-se quase um ato de resistência. No jornalismo, ofício que se alimenta da urgência, do novo, do agora, a experiência muitas vezes é tratada como um peso. Como se a pressa do presente dispensasse os aprendizados do passado. É nesse cenário que a 8ª edição da Revista Memória da Imprensa, cuja versão digital foi lançada nesta sexta-feira (30) pela Associação Bahiana de Imprensa (ABI), escolhe o tempo como tema e testemunha: tempo vivido, tempo eternizado, tempo que ensina.

Com o etarismo como eixo central, a revista não apenas denuncia uma das faces mais silenciosas do preconceito no ambiente de trabalho, mas também celebra os profissionais que moldaram a história da comunicação na Bahia. Vozes que não envelhecem e, mesmo quando seus rostos já não ocupam mais as redações, seguem contribuindo para a história da notícia no Brasil.

Sob o título “O peso do conhecimento e da experiência”, a publicação traz cinco entrevistas profundas com expoentes da imprensa baiana, artigos críticos e um ensaio fotográfico em homenagem póstuma ao fotojornalista Antônio Saturnino, construindo uma narrativa sensível sobre permanência, memória e respeito.

Para o jornalista Ernesto Marques, presidente da ABI, o tema toca diretamente as transformações vividas nas redações brasileiras e o apagamento gradual da experiência no jornalismo contemporâneo.

Em seu editorial, Marques destaca a urgência de tratar o etarismo não com saudosismo, mas com objetividade e responsabilidade social. “Discutir sobre etarismo nas redações, hoje, é pensar sobre o Brasil de logo adiante, com base na soma das nossas vivências e expectativas. Isso precisa estar em conta na hora da pauta, da reportagem, da edição…”, escreveu. Com lucidez e ironia, o presidente lembra: “Parece inacreditável, mas é verdade: jornalistas também envelhecem”.

A apresentação da revista, assinada pelo editor Biaggio Talento, chama atenção para o fenômeno da “juniorização” das redações e os impactos da substituição sistemática de profissionais experientes por jovens recém-formados, uma escolha que, muitas vezes, sacrifica a qualidade em nome da redução de custos. O texto contextualiza o tema à luz de dados, como os 12 mil postos de trabalho perdidos no setor segundo o CAGED, e o índice de demissões de jornalistas com mais de 50 anos, que chegou a 30% em 2019, segundo a Fenaj – Federação Nacional de Jornalistas.

Tempo, tempo, tempo…

Nesta edição, o projeto Memória da Imprensa chega à marca de 53 entrevistas com personalidades que fizeram e ainda fazem história na comunicação baiana. São cinco os depoimentos inéditos: Cristovaldo Rodrigues, repórter policial de faro afiado e alma de cronista; Edson Almeida, comentarista esportivo que completou 80 anos em plena atividade; Jolivaldo Freitas, cronista e escritor de múltiplos gêneros; Roberto (Bob) Fernandes, jornalista político de reconhecida trajetória nacional; e Vera Martins, que narra sua vivência de resistência e inovação nas ondas do rádio. Cada entrevista é uma aula de jornalismo vivo, forjado nas ruas, nas redações e nos desafios de cada época.

A seção de artigos reúne reflexões valiosas sobre o tema central da edição. A jornalista Camila Augusto, fundadora do Foco na Mídia, escreve sobre os desafios enfrentados por mulheres jornalistas no mercado de trabalho. O professor Diego Oliveira, coordenador acadêmico da ESPM, analisa o etarismo sob a ótica das relações de poder nas redações. E a sócia-diretora da ATcom Comunicação Corporativa, Suely Temporal, 2ª vice-presidente da ABI, reforça a urgência de romper o preconceito geracional como condição para uma comunicação mais justa, ética e diversa.

O ensaio fotográfico da edição, com imagens assinadas por Antônio Saturnino, é um tributo ao olhar aguçado do repórter fotográfico que nos deixou em abril. Entre seus registros marcantes, está a imagem emblemática dos confrontos entre indígenas e policiais durante os 500 anos do descobrimento, em Porto Seguro – um testemunho visual da coragem e da relevância do trabalho jornalístico.

Com coordenação editorial de Ernesto Marques e Jaciara Santos, diretora de Comunicação da ABI, projeto gráfico da Bamboo Editora e tiragem de 1.500 exemplares com distribuição gratuita, a Revista Memória da Imprensa segue cumprindo sua missão de resgatar, preservar e divulgar a história da imprensa baiana, enquanto promove debates que atravessam gerações e desafiam o presente.

  • O evento de lançamento da 8ª edição acontece às 9h30 do próximo sábado, 5 de julho, no Auditório Samuel Celestino, oitavo andar da ABI – Rua Guedes de Brito, 1 – Praça da Sé, em Salvador. Entrada gratuita.

A publicação está disponível abaixo. Boa leitura e até o evento de lançamento !

8ª edição – Junho 2025

Confira também as edições anteriores! https://abi-bahia.org.br/revista-memoria-da-imprensa-edicoes/

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Notícias

O que muda após decisão do STF sobre responsabilização das big techs?

Em uma decisão histórica que deve provocar impactos imediatos no funcionamento das plataformas digitais no Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta quinta-feira (26), para responsabilizar civilmente as redes sociais por conteúdos ilegais publicados por seus usuários. A Corte entendeu que as big techs podem ser acionadas judicialmente mesmo sem ordem da Justiça, bastando uma notificação extrajudicial para que tomem providências contra postagens ilícitas.

O julgamento, concluído por 8 votos a 3, revisita os limites da responsabilidade das plataformas definidos no Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), em vigor há mais de uma década. Pela nova interpretação, o Artigo 19 da norma é considerado apenas parcialmente constitucional. Até então, a legislação previa que empresas como Google, Meta e TikTok só poderiam ser responsabilizadas caso, após decisão judicial específica, não removessem conteúdos denunciados como ilegais.

Agora, o entendimento do Supremo é que essa regra se mostra insuficiente frente ao volume e à gravidade das publicações com desinformação, discurso de ódio e ataques à ordem democrática que circulam nas redes. Para os ministros que votaram a favor da mudança, é dever das plataformas agir de forma célere sempre que forem notificadas, ainda que extrajudicialmente, a respeito de conteúdos ilícitos.

Na prática, a decisão impõe uma nova lógica de atuação para empresas que operam no ecossistema digital brasileiro, considerado um dos maiores e mais relevantes mercados globais. A partir de agora, o não atendimento a notificações pode acarretar a responsabilização direta das plataformas por danos morais e materiais causados a terceiros.

Um dos pontos centrais da decisão trata da retirada imediata de postagens que configurem crimes graves. O descumprimento poderá gerar sanções judiciais e abrir caminho para pedidos de indenização.

A nova interpretação do STF sobre o Marco Civil da Internet reflete uma inflexão no entendimento do Judiciário sobre os limites da liberdade de expressão e o papel das plataformas na garantia dos direitos fundamentais. Para a maioria da Corte, diante do atual cenário de proliferação de discursos antidemocráticos, a autorregulação das empresas não tem sido suficiente para proteger a integridade da esfera pública. A decisão da Corte deverá cumprida pelas plataformas a partir de agora e não será aplicada em casos retroativos.

Ministros definiram um rol de postagens irregulares, que também poderão ser enquadradas no Código Penal:

  • Atos antidemocráticos;
  • Crimes de terrorismo;
  • Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou automutilação;
  • Incitação à discriminação em razão de raça, cor, etnia, religião, procedência nacional, sexualidade ou identidade de gênero (condutas homofóbicas e transfóbicas);
  • Crimes praticados contra a mulher em razão da condição do sexo feminino, inclusive conteúdos que propagam ódio ou aversão às mulheres;
  • Crimes sexuais contra pessoas vulneráveis, pornografia infantil e crimes graves contra crianças e adolescentes

Replicações – O STF também definiu que as replicações de postagens que foram declaradas ilegais pela Justiça devem ser retiradas por todos os provedores, independentemente de novas decisões.

Impulsionamento – O Supremo definiu os casos em que as redes deverão responder na Justiça independentemente de notificação. A situação vale para anúncios e impulsionamentos pagos e uso de rede artificial de distribuição (chatbot ou robôs) para a propagação das ilegalidades.

Crimes contra a honra – Nos casos envolvendo crimes de calúnia, difamação e injúria cometidos por uma pessoa contra a outra, continua valendo a necessidade de decisão judicial para retirada da postagens.

E-mail e WhatsApp – Por se tratar de mensagens privadas e do direito à inviolabilidade do sigilo das comunicações, a maioria dos ministros decidiu que os provedores de serviços de e-mail e de mensageria instantânea (WhatsApp e Telegram) não respondem diretamente por conteúdos ilegais. Nesse caso, continua valendo o Artigo 19.

Autorregulação – A decisão do STF também determina que as plataformas deverão editar regras de autorregulação para dar transparência ao processo de recebimento de notificações extrajudiciais, além de apresentarem relatórios anuais sobre o tema.

Representante no Brasil – Embora a maioria das plataformas já tenha representantes no Brasil, o STF também confirma que as plataformas devem constituir pessoa jurídica no país e atender às determinações da Justiça, fornecer informações sobre moderação de conteúdo e outras determinadas pela Justiça.

Validade – A decisão da Corte vai valer até que o Congresso elabore uma lei para tratar da responsabilização. “Enquanto não sobrevier nova legislação, o art. 19 do MCI deve ser interpretado de forma que os provedores de aplicação de internet estão sujeitos à responsabilização civil, ressalvada a aplicação das disposições específicas da legislação eleitoral e os atos normativos expedidos pelo TSE”, definiu o STF. (Com informações de André Richter para a Agência Brasil)

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Artigos

No rastro do fogo 

Por Liliana Peixinho *

Mais que registro histórico sobre cultura ancestral com fogos, o documentário “No Rastro do Fogo” é uma provocação poética e política sobre o direito de existir e persistir diante uma expressão genuinamente popular. É um filme que gera reflexões e reacende o debate sobre a preservação do patrimônio imaterial brasileiro.

Dirigido e roteirizado pelo cineasta Guto Peixinho, olhos, ouvidos e sensibilidade  humana de atenção aos rituais populares de sagração ao fogo ganham potência nas câmeras de filmagens para captar o espetáculo de movimentos  humanos entre luz e som das espadas de fogo nas ruas durante os festejos juninos. 

Com cenas reais gravadas durante o manuseio na produção de espadas de fogo em ambientes adversos, o curta-metragem abre questionamentos em direções sobre limites entre tradição e transgressão. O movimento das câmeras de filmagem detalha  bastidores do envolvimento e paixão de famílias na produção, artesanal do artefato pirotécnico.

Na China, os fogos de artifício têm uma longa história e são usados para celebrar o Ano Novo Chinês e outras ocasiões festivais. Na Europa, os fogos de artifício foram introduzidos no século XVII e se tornaram uma tradição em muitas cidades, especialmente durante as celebrações de Ano Novo e festivais.  No Japão, a arte da espada é uma parte importante da cultura samurai e é praticada ainda hoje em forma de kendo e iaido.

As tradições culturais e históricas são importantes para preservar a identidade e a memória de uma sociedade A combinação de fogos de artifício e guerra de espadas pode ser vista em algumas culturas como uma forma de celebrar a vitória, a coragem e a habilidade.

Com visão futurista, o filme foi lançado em 2016. Em 2017 foi sancionado pela prefeitura de Senhor do Bonfim, o projeto de lei que transformou a tradicional guerra de espadas em patrimônio cultural e imaterial da cidade. Nesse mesmo ano a prática da tradição esperada com alegria, ano a ano, foi proibida. 

Batalha legal 

Segundo informações da Associação Cultural dos Espadeiros de Senhor do Bonfim (ACESB), a entidade vem se consolidando como a principal responsável pela articulação técnica e institucional em defesa da legalização da Guerra de Espadas na Bahia. Criada em 2017, em meio a um cenário de forte repressão à prática dessa manifestação cultural centenária, a entidade tem protagonizado ações concretas e estratégicas para garantir a continuidade da tradição dentro da legalidade, da segurança e do respeito às normas vigentes.

Realizado de maneira independente o curta-metragem, em  25 minutos, expõe com sensibilidade e vigor visual, um olhar potente sobre a “Guerra/show de espadas” como prática centenária,  conduzindo o espectador por um território onde a cultura popular se mistura ao risco, à emoção e à luta por reconhecimento.

O filme “No Rastro do fogo” tem apoio institucional da Diretoria de Audiovisual da Fundação Cultural do Estado (FUNCEB/SecultBA). O projeto foi contemplado nos Editais da Paulo Gustavo – Bahia e tem apoio financeiro do Governo do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura via Lei Paulo Gustavo, direcionada pelo Ministério da Cultura, Governo Federal.

*Liliana Peixinho – Jornalista, memorialista, ativista humanitária. Especialização em Jornalismo Científico, Cultura e Meio Ambiente.  Fundadora de mídias e grupos independentes: AMA- Amigos do Meio Ambiente, Reaja- Rede Ativista de Jornalismo e Ambiente, Cuidar do Cuidador, Catadora de Sonhos, O outro no Eu. Colaboradora  de mídias, Brasil afora, com pautas prioritárias em Desigualdade, Fome, Direitos Humanos, Crianças, Defesa do  Ambiente.  Autora da ação permanente e itinerante “imersões Jornalísticas Caatinga adentro, Sertão afora, Brasil no meio”.

Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI)
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