Blog das vidas

ISTOÉ e cartas ao Mino, anos 70

Liliana Peixinho*

A notícia da morte do jornalista Mino Carta, nesse 02 de setembro de 2025, me fez voltar ao final dos anos 70, nos meus 18 anos, com muitos sonhos.

Ainda ontem, por puro acaso, sem nem saber notícias de Mino Carta, há muitos anos, numa rara mensagem ao colega jornalista Fernando Vita, perguntava a ele sobre lembranças da época que trabalhamos na Telebahia do Cabula e lhe contava sobre como a minha admiração por Mino Carta, surgida com a Revista IstoÉ, fizera eu escrever cartas, via Correios (naquela época, a Comunicação comum era via cartas de papel, escritas à mão, envelopadas e postadas via agências dos Correios) para o Mino, com relatos sobre a importância da Revista IstoÉ, como leitora.

A ISTOÉ me apareceu, no final dos anos 70, como uma alternativa potente de informação, num mercado onde a Revista VEJA era dominante nos contratos de assinatura para o leitor receber em casa, no trabalho.

Mudança de vida

Estava eu, lá no final dos anos 1970, sentada em minha mesa de trabalho, na Telebahia do Cabula, departamento SRV, concentrada na atividade que era responsável na auditagem de contratos para a Lista Telefônica, quando chega um representante da Revista IstoÉ, chamado Kalinin, me oferecendo uma proposta de assinatura da Revista IstoÉ. Não pensei duas vezes e falei ao representante
“Moço, olha eu gosto tanto, tanto dessa revista, que gostaria de saber como eu faço, para trabalhar nela”?

A Telebahia foi meu segundo emprego, em Salvador, depois da Braslabor, no edifício Cidade de Ilhéus, no Comércio e depois no edifício Casa Nova, na rua Carlos Gomes. Assim como o Banco do Brasil e a Petrobras, a Telebahia era emprego de sonhos. Deixei tudo e tomei a decisão de ir viajar pelo Brasil, através da IstoÉ, revista que amava ler, por causa “do Mino Carta. Admiração gigante que me inspirou, depois ao Jornalismo de campo e seus desafios investigativos.

Estabilidade por desafios de vida

Nessa época, 1978/79, eu cursava Matemática, na Universidade Católica de Salvador, à noite, Campus da Federação. Em paralelo, como filha que teve o incentivo dos pais, para estudar e trilhar caminhos de sonhos, a agenda com a Telebahia era potente. Chegava na empresa antes das 7, para pegar o café manhã, e ali almoçava, e antes de ir pra faculdade, tomava a sopa, às 17; 30h, no bandejão maravilhoso do restaurante dos funcionários. Na Telebahia aprendi a jogar tênis e tive a oportunidade de dar continuidade a uma paixão da infância: cantar em coral. E o Coral da Telebahia, regido pelos maestros Hamilton e também Keiller Rego, era de repertório potente, com clássicos e populares em arranjos culturais diversos. Viajamos para encontros de corais, como um inesquecível, em Olinda- Pernambuco, onde ficamos hospedados num Convento maravilhoso, lá no alto da Colina de Olinda, com vista para toda a região.

Mino Carta como inspiração

Uma lembrança puxa outra e Mino Carta alimentou em mim, ainda adolescente, o desejo de viajar para ver o Brasil profundo, de perto, In loco, de forma imersiva. Depois de alguns semestres, deixei o curso de Matemática, na Ucsal, para viajar sem tempo determinado Brasil afora. A Revista IstoÉ foi instrumento de trabalho para ver de perto histórias, fatos, cotidianos complexos, com geografias humanas que fortaleceram meus sonhos para um jornalismo potente, como o de Mino Carta.

Brasil afora

Nesse sonho, viajei por anos. Entre um tempo e outro pude concretizar o desejo de conhecer comunidades indígenas, como o povo Maxacalis, Pedra Azul, no Vale do Jequitinhonha; cidades históricas como Ouro Preto, Tiradentes, Mariana, em Minas Gerais. Colônias de Pescadores em Vila Velha, Espírito Santo. Conheci o Nordeste todo, capitais e interiores. Eu era bem jovem, 18/19 anos, e só em 1984, com 24 anos, fui fazer Vestibular para Comunicação- Jornalismo,na UFBA.

Obrigada, Mino Carta por ser minha referência de jornalismo, lá nos anos 70, numa adolescente inquieta e cheia de sonhos em conhecer de perto para escrever.

*Liliana Peixinho – Jornalista, memorialista, ativista humanitária. Especialização em Jornalismo Científico, Cultura e Meio Ambiente.  Fundadora de mídias e grupos independentes: AMA- Amigos do Meio Ambiente, Reaja- Rede Ativista de Jornalismo e Ambiente, Cuidar do Cuidador, Catadora de Sonhos, O outro no Eu. Colaboradora  de mídias, Brasil afora, com pautas prioritárias em Desigualdade, Fome, Direitos Humanos, Crianças, Defesa do  Ambiente.  Autora da ação permanente e itinerante “imersões Jornalísticas Caatinga adentro, Sertão afora, Brasil no meio”.

Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI)
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Artigos

Prefácio de Sérgio Mattos estimula a leitura do livro de Wilson Midlej

Luis Guilherme Pontes Tavares*

O prefácio do professor doutor Sérgio Mattos para o livro A saga dos sírios e libaneses no Sudeste da Bahia (Salvador: Press Color, 2025), de autoria do jornalista e advogado Wilson Midlej, examina a obra e recomenda a leitura. Os dois integrantes da diretoria da ABI, amigos de longa data, autorizaram a publicação do texto a seguir.

“Prefácio

HISTÓRIA DAS FAMÍLIAS SÍRIO-LIBANESAS NO SUL DA BAHIA

Sérgio Mattos[1]

Corria o ano de 1880 quando foi iniciado o processo de imigração sírio-libanesa, após visita de Dom Pedro II que divulgava o Brasil, no Oriente Médio, como uma nação de terras férteis e de grandes oportunidades. Sírios e libaneses se encantaram com as perspectivas de liberdade religiosa e de novas oportunidades de trabalho e começaram a enfrentar as dificuldades de travessia de mares em busca da realização dos sonhos. É verdade que muitos imigraram para fugir da perseguição exercida pelo Império Turco-Otomano contra os cristãos, mas também por motivos de ordem econômica.

Trouxeram para o Brasil um legado histórico, cultural e uma prática de comércio itinerante que frutificaram por aqui, além de uma rica gastronomia que foi facilmente incorporada à nossa culinária. Quatro são os Estados brasileiros que mais receberam imigrantes da Síria e do Líbano: Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Bahia. Estima-se que a população de libaneses no Brasil gire em torno de 10 a 12 milhões de indivíduos, incluindo-se aqui cidadãos e descendentes.  

No ano de 2020, a Câmara de Comércio Árabe Brasileira encomendou uma pesquisa que constatou que viviam no Brasil, àquela época, 11,6 milhões de árabes e seus descendentes. Esse total é duas vezes maior do que a população do Líbano hoje. Sobre a saga de sírios e libaneses no Brasil existem alguns livros e artigos publicados abordando os imigrantes que se estabeleceram no sul do país, principalmente em São Paulo. Com relação à presença desses imigrantes na Bahia, na região cacaueira, as informações limitam-se a números estatísticos do IBGE e de algumas pesquisas. Esta lacuna de informação precisava ser preenchida e estimulou o autor deste livro, na condição de descendente, a resgatar a memória dos imigrantes sírios e libaneses na Bahia.

O jornalista, contista, romancista, historiador e empreendedor Wilson Midlej é um cidadão que não desiste de seus projetos e quando começa um novo desafio só quando termina a obra é que se dá por satisfeito. Dono de grande simpatia pessoal, com a qual soube construir um grupo de amigos diletos, além de determinação na realização de sonhos, neste livro, o quarto de sua autoria[2], ele assumiu o compromisso pessoal de resgatar a memória de algumas famílias de origem sírio-libaneses que se radicaram na Bahia, mais precisamente na região cacaueira. Dentre as escolhidas, encontra-se a família dele, daí um dos motivos de ter produzido um texto com narrativa na primeira pessoa. Destaque-se, uma narrativa atraente, que prende o leitor pela clareza, precisão e concisão com que vai apresentando seus personagens.  

Ele iniciou sua pesquisa, com levantamento de dados em fontes primárias e secundárias, no ano de 2019. O planejamento inicial envolveria todos os grupos familiares, mas as dificuldades para localizar documentação e pessoas que pudessem dar depoimentos acabou restringindo o total de famílias abordadas. E assim, Wilson assumiu a responsabilidade de escrever narrativas de vida, construindo textos baseados na análise da documentação disponível, em arquivos de jornais, no depoimento de pessoas que convivem ou conviveram com os perfilados. Ele se aprofundou na dimensão individual e coletiva dos biografados, considerando-os como seres singulares e ao mesmo tempo plurais. Ele soube, como bom jornalista, identificar e conectar os fragmentos coletados, armando o quebra-cabeça, esclarecendo erros e preenchendo lacunas.  

O resultado final caracteriza-se como uma grande contribuição ao resgate da memória da ocupação sírio-libanesa na Bahia. Este livro apresenta um esforço em historicizar os conflitos, litígios, conquistas e derrotas dessas famílias que se projetaram ocupando espaços e influenciando a comunidade. Wilson analisa as contribuições e produções de seus personagens dentro do contexto individual-familiar e na sociedade local, quando se envolveram com a cultura, a política e a economia preservando suas culturas de origem, principalmente no que se refere à gastronomia.  

Para tanto, ele usou várias formas de narrativas e de abordagens metodológicas e de técnicas para levantar os dados necessários, tais como o Método Biográfico, que possibilita um olhar além das aparências, o que lhe permitiu trabalhar a subjetividade e a sensibilidade de seus personagens. Utilizou também a metodologia da História Oral, para recolher informações através de entrevistas, valorizando a memória dos indivíduos. Para vencer obstáculos de sombras ou omissões, Wilson Midlej utilizou diferentes formas de elementos textuais para contrapor um ao outro, para construir ou desconstruir argumentos para encontrar o caminho correto para sua narrativa. Apesar de não ter se utilizado diretamente do método cartográfico, ele consultou instituições oficiais, a exemplo do IBGE, para coleta de dados econômicos, sociais e técnicos para contextualizar as diferentes épocas de sua narrativa, conectando as fases de vida das famílias ou indivíduos perfilados no tempo e no espaço. 

Um dos principais objetivos de Wilson Midlej foi recuperar o passado dos imigrantes sírio-libaneses na região cacaueira. Neste sentido, este livro que resgata a memória de famílias que se estabeleceram na região se enquadra na classificação de gênero de memória. Através da narrativa, o autor vai cruzando os dados de vida individual e ou coletiva com os contextos social, cultural e econômico da época. Para tal ele usa técnicas literárias e jornalísticas apresentando uma linguagem clara e acessível para os leitores, despertando neles o interesse pela narrativa e nuances da vida real. Não seria exagero pontuar que este trabalho de pesquisa e resgate poderia também ser classificado como livro reportagem, dentro do gênero do jornalismo literário.

Em síntese, este livro é um resgate histórico da vida de famílias sírio-libanesas no sudeste da Bahia, onde enfrentaram todos os tipos de adversidades a partir da língua que não conheciam até se estabelecerem definitivamente. O autor nos passa a ideia que esta jornada foi pautada no amor entre as famílias e parcerias entre homens e mulheres comprometidos e que cultivavam a confiança e o respeito mútuo. Apesar de Wilson Midlej ter trabalhado com fragmentos da memória do processo de imigração, com depoimentos orais, registros documentais e fotografias, ele consegue resgatar a ocupação sírio-libanesa na Bahia, na região cacaueira, contando as aventuras e desventuras de alguns grupos familiares e como eles conseguiram vencer as dificuldades. Trata-se de um livro que vale a pena ser lido, pois as histórias individuais são extremamente instigantes. Este livro complementa outros lançados e que não abordaram a Bahia. É interessante para o leitor conhecer a formação de algumas das famílias mais importantes da região cacaueira e como elas contribuíram para o crescimento do sudeste da Bahia, sem perder a informação de que o Brasil é o país que abriga a maior população libanesa do mundo, entre cidadãos e descendentes.

Nada mais me resta senão parabenizar o autor por este trabalho de folego e recomendá-lo aos leitores que, com toda certeza, vão se encantar com as histórias contadas e registrada aqui. Que tenham uma boa leitura!”


[1] Sérgio Mattos é jornalista, escritor e doutor em comunicação

[2] Wilson Midlej publicou os seguintes livros antes deste: Crônicas da Bahia sob o sol de Jequié (2014), Gatilhos de lembranças: a eternidade do tempo – contos (2015) e Anésia Cauaçu- Lendas e histórias do sertão de Jequié (2017).

Foto: Fábio Marconi

Jornalista, produtor editorial e professor universitário. É o 1º vice-presidente da ABI. [email protected]

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Notícias

CINECLUBE ALB exibe “1798 – Revolta dos Búzios”, do cineasta Antonio Olavo

A próxima edição do Cineclube ALB exibe o filme ‘1798 – Revolta dos Búzios’, de Antonio Olavo, com a presença do diretor. Será na quarta-feira, 3 de setembro, a partir das 16h.

A produção retrata um dos marcos cruciais da História do Brasil, a Revolta dos Búzios, que desenrolou-se na Bahia, em 1798. Inspirados pelos ideais iluministas da Revolução Francesa, centenas de homens negros se uniram em um movimento audacioso para derrubar o governo colonial, proclamar a independência e estabelecer uma República democrática, livre da opressão da escravidão. A Revolta dos Búzios também é designada por Revolução dos Alfaiates, Conjuração Baiana, Sedição de 1798, Movimento Democrático Baiano e Inconfidência Baiana.

Durante o evento, o pesquisador e cineasta Antônio Olavo vai falar com o público sobre o processo de produção do filme e trazer à luz esse episódio frequentemente esquecido da nossa história. A mediação do bate-papo é dos Acadêmicos Carlos Ribeiro e Décio Torres Cruz, coordenadores do Cineclube ALB.

Realizado no Goethe-Institut Salvador, a entrada é gratuita.

A ALB tem apoio financeiro do Governo da Bahia, através do Fundo de Cultura, Secretaria da Fazenda (Sefaz-BA), Secretaria de Cultura da Bahia (Secult-BA) e da Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA).

SERVIÇO
CINECLUBE ALB – ‘1798 – Revolta dos Búzios’, de Antonio Olavo
Convidado: Cineasta e pesquisador Antonio Olavo
3 de setembro, quarta-feira, 16h
Goethe-Institut Salvador – Av. Sete de Setembro, 1809, Corredor da Vitória 

Aberto e gratuito

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Notícias

Governo Federal realiza consulta pública sobre sustentabilidade do jornalismo ambiental 

A Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom/PR), por meio da Secretaria de Políticas Digitais (SPDIGI), recebe até o dia 07 de setembro respostas a uma Tomada de Subsídios sobre Sustentabilidade do Jornalismo Ambiental e da Amazônia, na plataforma Participa + Brasil. A iniciativa busca ouvir jornalistas, comunicadores, veículos, especialistas e organizações da sociedade civil para:

  • Diagnosticar os desafios da cobertura socioambiental, especialmente na Amazônia;
  • Propor ações para garantir sustentabilidade e pluralidade do jornalismo;
  • Subsidiar políticas públicas com foco em segurança, diversidade e liberdade de imprensa.

Eixos da consulta
O questionário é organizado em quatro eixos:

  1. Violências contra comunicadores ambientais e na Amazônia
  2. Proteção e segurança no exercício jornalístico
  3. Acesso à informação socioambiental
  4. Especificidades da cobertura na Amazônia

A consulta foi elaborada pela Mesa de Trabalho Conjunta, no âmbito das medidas cautelares MC-449/22 da CIDH, relacionadas aos casos de Bruno Pereira, Dom Phillips e da Univaja. O processo incluiu escutas na Amazônia, com organizações civis, comunidades indígenas e familiares.

Na visão da SPDIGI, sustentabilidade do jornalismo vai além da viabilidade econômica, envolvendo liberdade de imprensa, proteção física e mental dos comunicadores, transparência digital e fomento à diversidade e inovação na comunicação.

Como participar?

  • Acesse a plataforma Participa + Brasil, crie conta ou faça login.
  • Para enviar estudos ou documentos (até 20 MB), use o e-mail [email protected], com o assunto: Tomada de Subsídios – Jornalismo Ambiental.
  • As contribuições serão consolidadas em relatório público que subsidiará ações e normas previstas pela Secom/PR.
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