O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC, na sigla em inglês) divulgou neste domingo (2) em Copenhague, na Dinamarca, o mais recente relatório sobre mudança climática e alertou que os danos causados por estas mudanças poderão ser irreversíveis, mas que ainda há formas de evitá-los. O documento funcionará como um guia para que os desenvolvedores de políticas públicas consigam chegar a um acordo que permita a redução das emissões de gases de efeito estufa, responsáveis pela elevação da temperatura do planeta. As negociações para um tratado climático global, com metas mais rigorosas para as nações, avançarão até a 21ª Conferência do Clima, em dezembro do ano que vem, em Paris.
O relatório foi publicado depois de uma semana de debates intensos entre cientistas e autoridades de governos de todo o mundo. “A influência humana no sistema climático é clara, quanto mais perturbamos nosso clima, mais riscos temos de impactos graves, amplos e irreversíveis”, disse o diretor do IPCC, Rajendra Pachauri. E, de acordo com Pachauri, o mundo todo será afetado por estes danos. “Quero destacar o fato de que a mudança climática não deixará nenhuma parte do mundo intocada pelos impactos que estamos vendo diante de nossos olhos e que, obviamente, terão uma relevância crescente no futuro.”
O diretor do IPCC afirmou que “agora a comunidade científica se pronunciou” e está “passando o bastão para os políticos, para a comunidade que toma as decisões”. No entanto, Pachauri afirmou que ainda há esperança, pois “felizmente nós temos os meios para limitar a mudança climática e construir um futuro mais próspero e sustentável”.
Segundo o documento, o uso sem restrições de combustíveis fósseis (carvão, petróleo, gás), deve ser suspenso até o ano de 2100 se o mundo quiser evitar uma mudança climática perigosa. O relatório também sugere que o uso dos combustíveis renováveis deverá subir da atual fatia de 30% para 80% do setor de energia até 2050.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, comentou os pontos principais do relatório e fez um apelo para que o setor produtivo reduza os investimentos em carvão e combustíveis fósseis e adotem fontes renováveis de energia. “O relatório mostra que o mundo está muito mal preparado para os riscos das mudanças no clima, especialmente os pobres e mais vulneráveis, que contribuíram menos para este problema. Precisamos migrar para os recursos renováveis. Há um mito de que a ação para o clima custa muito, mas a falta de ação vai custar muito mais”. Ele destacou, ainda, que todos tem responsabilidade pela construção de um mundo mais sustentável. “Cada indivíduo pode participar desse esforço. Um único pingo de água precisa ser usado de uma maneira mais sustentável”.
Novo modelo
Rajendra Pachauri afirmou que este último relatório é a mais forte e detalhada declaração a respeito da escala do problema da mudança climática e das soluções para isto. “Este relatório realmente estabelece um novo modelo em avaliação científica. Por um lado, o relatório traz todos os elementos do quebra-cabeça que constitui os vários aspectos da mudança climática, desde a base científica subjacente dos impactos, adaptação e vulnerabilidade e os tipos de opções de abrandamento que temos disponíveis”.
A elaboração do quinto relatório do IPCC teve a participação de 830 cientistas de 80 países, divididos em três grupos de trabalho, e milhares de outros revisores que analisaram cerca de 30 mil publicações para a elaboração do documento. Os resultados de cada grupo foram divulgados em três documentos, ao longo dos últimos 13 meses.
“Não podemos queimar todos os combustíveis fósseis que temos sem lidar com o resíduo resultante, que é o CO2, e sem despejar isto na atmosfera. Se não conseguirmos desenvolver (um sistema de) captura de carbono, teremos que parar de usar combustíveis fósseis se quisermos parar a perigosa mudança climática”, disse Myles Allen, professor da Universidade de Oxford, na Grã-Bretanha, e um dos membros do IPCC que participou da elaboração do documento.
Para David Shukman, editor de ciência da BBC, este relatório mostra as opções de uma forma mais direta do que nunca. “O IPCC tentou tornar (o relatório) mais aceitável afirmando que os combustíveis fósseis podem continuar sendo usados se as emissões de carbono forem capturadas e guardadas. Mas, até agora o mundo apenas tem uma usina operante comercialmente deste tipo, no Canadá, e o progresso no desenvolvimento da tecnologia é muito mais lento do que muitos esperavam”, disse. Shukman afirma que a conclusão do relatório, de que não podemos continuar queimando estes combustíveis como sempre fizemos e que a queima destes combustíveis deve ser suspensa até o fim do século, apresenta aos governos do mundo uma escolha difícil.
O secretário de Estado americano, John Kerry, descreveu o documento do IPCC como “mais um canário na mina de carvão”. “Aqueles que escolhem ignorar ou questionar o que a ciência mostrou tão claramente neste relatório, o fazem colocando em grande risco todos nós, nossos filhos e netos”, afirmou Kerry em uma declaração.
Ativistas aprovaram a linguagem clara do documento. “O que eles disseram é que temos que chegar à emissão zero e isto é novo”, disse Samantha Smith, do organização World Wildlife Fund. “A segunda coisa (destacada pelo relatório) é que (a solução) é acessível, não vai incapacitar as economias”, acrescentou.
*Informações da BBC Brasil e da Agência Brasil.