O jornalista Carlos Augusto, editor e diretor do Jornal Grande Bahia (JGB), da cidade de Feira de Santana, enfrenta um processo judicial desde que publicou, em setembro de 2021, a reportagem “‘Tentativa de pautar mudança no regimento interno do TJBA, em tese, objetiva colocar na Mesa Diretiva grupo que crie óbice às investigações do CNJ nos Casos Faroeste e Ilha do Urubu, diz fonte’”. O texto revelava possíveis conexões entre os inquéritos e a alteração das normas do sistema eletivo no Regimento Interno do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA).
Além das declarações das fontes ouvidas na matéria, o conteúdo publicado pelo JGB – hoje sob censura nos termos do Processo nº 0147496-83.2021.8.05.0001 – se apoiou em documentos (confira no Processo nº 8034192-87.2022.8.05.0080). A suspeita levantada era que a modificação da regra do sistema eleitoral do tribunal estadual teria o intuito de levar à presidência algum magistrado que pudesse criar obstáculos à investigação federal do Caso Faroeste (Entenda aqui), cujas decisões emitidas pelo ministro da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Og Fernandes, foram responsáveis por afastar oito desembargadores do TJBA.
Na última quinta-feira, 13 de julho, Carlos Augusto publicou uma reportagem denunciando o assédio judicial sofrido a partir de ações movidas pelo servidor público Julio Cezar Lemos Travessa, desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) e presidente da Associação dos Magistrados da Bahia (AMAB).
O texto aponta irregularidades na tramitação do processo judicial de nº 8034192-87.2022.8.05.0080, classificado pelo jornalista como “uma verdadeira caçada judicial”. Segundo ele, houve violação à liberdade de expressão e de imprensa na audiência de instrução e julgamento (ver vídeo da audiência ocorrida em 4 de maio de 2022). “A promotora chegou a pedir que eu revelasse a fonte da matéria jornalística. É um processo que já nasce morto. Eu escrevi com rigor técnico e científico, embasado por toda a documentação anexada ao texto e primando pelo bom jornalismo”, garante.
Carlos Augusto contratou os advogados Murillo Santana e Paulo de Tarso. Os profissionais enfatizam que a criminalização de expressões verbais relacionadas ao jornalismo é uma contínua violação da liberdade de imprensa no Brasil.
“É um caso de perseguição. Não há crime, há intimidação. Esse processo afronta a Constituição em, pelo menos, 25 dispositivos. Além da perseguição, a Constituição está sendo aviltada para atender aos interesses de um funcionário público que deveria velar, dentro do seu ofício, pelo fiel cumprimento das normas”, avalia Murillo Santana.
Já na esfera cível, o desembargador Júlio Travessa moveu um processo para que a reportagem tivesse a sua veiculação suspensa, sob pena de multa diária de R$100. “A matéria faz distinção entre o servidor Júlio Travessa e o delator Júlio Cavalcanti, advogado envolvido na Operação Faroeste. O nome do desembargador foi suprimido e ainda assim foi aplicada a multa”, observa Paulo de Tarso.
“Computou 150 dias de descumprimento. Entramos agora com pedido para o juiz retirar a multa, que foi aplicada sem o comprovante de que a matéria ainda estava no ar, como se o site não tivesse retirado o conteúdo”, destaca o advogado. Para ele, o processo “é uma demonstração da escalada de abusos e da censura explícita ao Jornal Grande Bahia”, afirma.
Violência contra a imprensa
Nos últimos meses, as entidades da comunicação baiana têm denunciado e enfrentado os casos de violência física contra profissionais de imprensa. Mas, segundo o presidente da Associação Bahiana de Imprensa, Ernesto Marques, há outro tipo de agressão, não menos violenta e não menos ameaçadora contra a democracia, contra a liberdade de imprensa e contra o direito do cidadão de ser bem informado, que é o assédio judicial.
“O assédio judicial é uma prática que consiste em bombardear jornalistas e veículos noticiosos com ações judiciais que pedem indenizações milionárias e impagáveis, supressão de conteúdos já publicados ou a simples proibição de tratar de determinados assuntos”, explica o dirigente.
Em vídeo publicado no Instagram da entidade nesta quarta (19), Marques expressou a irrestrita solidariedade da ABI ao jornalista Carlos Augusto e ao seu veículo. “A ABI, com o mesmo vigor que repudia qualquer ato violento contra os profissionais, contra veículos de comunicação, condena também a prática do assédio judicial, que por nós é entendido como uma ameaça à imprensa e à democracia”, completa o presidente da Associação.