A sala de imprensa do Carnaval de Salvador, no Campo Grande, vai homenagear em 2024 o jornalista e escritor soteropolitano José de Jesus Barreto, o Barretinho — como é chamado pelos amigos. O espaço, que oferece apoio aos jornalistas que cobrem a folia, será inaugurado nesta quinta-feira (8), às 11h, com uma coletiva do prefeito Bruno Reis. Curiosamente, no dia seguinte, Barreto completa 76 anos.
Ele gosta de dizer que é um operário da linguagem. Também, pudera: já fez um pouco de tudo na Comunicação. Trabalhou em jornais, revistas, rádio e televisão, foi professor, atuou com assessoria de imprensa, inclusive na Prefeitura de Salvador, e em campanhas políticas. Nos últimos anos, tem dedicado-se às colunas sobre futebol no site Bahia Já e a escrever livros.
Nascido num domingo de Carnaval, Zé de Jesus Barreto sempre teve a festa no centro de sua trajetória, tanto profissional como pessoal. É considerado uma das testemunhas de tantas mudanças que a folia experimentou: como jornalista, cobriu o surgimento dos blocos Afro e da Axé Music; na Secretaria de Comunicação, ajudou a projetar o evento para o mundo.
“O Carnaval em Salvador é uma transformação contínua. É como a vida, que está sempre mudando, e isso é ótimo. Não sou saudosista do ‘antigamente’, eu gosto do ‘hojemente’. Acho que o Carnaval resume todas as diferenças, misturas, divergências e entendimentos. Enfim, tudo o que é a sociedade, de um modo geral, está tudo aí, contido no Carnaval. A festa na Bahia é diferente das demais por isso: não é só um espetáculo, é um retrato, uma espécie de recorte, de tudo o que é Salvador”, opina Barreto.
Jornalista – Formado em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), José Barreto teve como escola no jornalismo a redação da Tribuna da Bahia, no início dos anos 70. “Tive como meus editores Quintino de Carvalho, Milton Caires de Brito, Cid Teixeira, João Ubaldo Ribeiro. Com esses caras, quem não aprendeu naquela época a escrever, não aprenderia mais”, conta. Concursado, foi um dos fundadores, em 1971, do Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia (Irdeb), onde trabalhou com rádio e TV.
Foi naquela época que ocorreu, em Salvador, a revolução dos blocos Afro, capitaneada pelo Ilê Aiyê, que em 2024 completa 50 anos. E Barreto estava lá, ‘jornalistando’, como fala: “Foi uma coisa fantástica, em plenos anos 70. Foi uma reação ao racismo do Os Internacionais e de outros blocos da elite soteropolitana, que não permitia a entrada de pretos. Então eles disseram ‘ah, é? Tá bom, então aqui também não entra branco’. E foi uma mudança importantíssima para o Carnaval da Bahia”, lembra.
Nos anos 80, também foi correspondente, na Bahia, de jornais nacionais como O Globo, O Estado de São Paulo, Jornal do Brasil e da Revista Veja. Nessa época, reportou para todo o país o surgimento do Axé Music: “O Carnaval se transforma como se transforma a vida. Cada ano é diferente do outro. Você imagina o que era o trio elétrico antes, uma fobica. Depois, vieram os trios que Orlando Tapajós fazia, obras de arte. E, hoje, temos esses ‘monstros’, verdadeiras cidades, com uma imensidão de áreas e equipamentos”, comenta.
“E, quando eu não estava ‘jornalistando’, estava na rua”, conta Barreto, que foi um dos criadores, nos anos 70, do bloco Filhos da Pauta, formado apenas por jornalistas. “A gente saía com uma mortalha que era impressa em pano, bem fino, na impressora lá da Tribuna, com as manchetes de jornal. O problema do Filhos da Pauta era que não conseguia chegar nunca na Praça Castro Alves, porque a gente no meio do caminho caía na gandaia, na esculhambação, e dispersava”, lembra, aos risos.
Prefeitura – Em 1997, foi convidado pelo jornalista Tasso Franco, então secretário, para ser o seu subsecretário de Comunicação (Secom) da Prefeitura de Salvador, onde permaneceu durante toda a gestão do prefeito Antônio Imbassahy, até 2004. Ou seja, justamente num momento em que o Carnaval mudou de patamar: era o auge do Axé Music, com dezenas de artistas baianos entre os mais ouvidos do país. E, ao mesmo tempo, o jornalismo vivia uma fase de transformação, provocada pela era digital.
“Pegamos um Carnaval que ainda era coberto de maneira analógica, precária, apesar do interesse na festa. Quando saímos da Secom, a gente estava mandando imagens ao vivo para o mundo. No nosso último Carnaval, eram 43 países credenciados, representados por seus veículos. Ou seja, foi um salto muito grande. A virada do século foi um momento de transformação de tecnologia. Uma equipe inteira se mobilizou e conseguiu botar o Carnaval no mundo online. Esse foi um grande legado que deixamos”, comenta Barreto.
Escritor – Nos últimos anos, Barreto tem se dedicado à literatura. É autor dos livros da trilogia Entre Amigos, dedicada a Carybé e Pierre Verger e à relação deles com a obra de outros artistas, como Jorge Amado e Dorival Caymmi. Também publicou duas edições sobre a vida de Mestre Pastinha, criador da Capoeira de Angola, e os livros “Candomblé da Bahia – Resistência e Identidade de um Povo de Fé” e “Cacimbo – Uma experiência em Angola”.
Fonte: Secom PMS