Uma imprensa livre e aberta é parte integrante da base da democracia e do desenvolvimento. No entanto, nos últimos dez anos, mais de 700 jornalistas foram mortos simplesmente por fazer o seu trabalho. E o pior: a cada dez casos de violência contra os profissionais de mídia, nove permanecem impunes. Para aumentar a conscientização sobre o desafio da impunidade e mobilizar ações contra ela, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou 2 de novembro como o Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas e criaram um plano de ação, que já está sendo discutido e implementado em diversos países – incluindo no Brasil, ocupante do 10º lugar na lista de países com elevado índice de impunidade para casos de jornalistas assassinados, de acordo com o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ).
A data proclamada na última quarta-feira (29) – e celebrada amanhã pela primeira vez -, marca o assassinato de dois jornalistas, Gislaine Dupont e Claude Verlon, da Rádio França Internacional (RFI), assassinados no norte do Mali, enquanto faziam reportagens sobre os conflitos na região, em 2 de novembro de 2013. O Governo da França espera que a morte dos franceses no Mali não entre na triste estatística constatada anualmente pelas organizações não-governamentais. O ministro francês das Relações Exteriores, Laurent Fabius, afirmou que a justiça já tem vários elementos para deter os responsáveis e que “o assassinato de Ghislaine Dupont e Claude Verlon não ficará impune”.
“Nos últimos dez anos, mais de 800 jornalistas morreram no exercício de suas funções profissionais, e em mais de 90% desses casos a impunidade reina”, lembra Lucie Morillon, diretora dos programas da RSF. A ONG lançou esta semana o site #FightImpunity, no qual dez casos emblemáticos são apresentados e onde o internauta pode enviar mensagens para os chefes de Estados dos países onde os episódios ocorreram. A responsável da ONG revela que, ao contrário do que se imagina, nem sempre os países em guerra são os únicos a registrar casos de violência contra jornalistas. “Fala-se muito da Síria ou do Paquistão, mas a impunidade não existe apenas nas nações que vivem em sistemas ditatoriais. Há muitas democracias que registraram casos de crimes visando profissionais da imprensa”, ressalta.
“Nenhum jornalista, em nenhum lugar, deve ter de arriscar a vida para divulgar informações. Juntos, defendamos os jornalistas e lutemos por justiça”, disse o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, em sua mensagem para a data. A ONU encarregou a UNESCO como agência líder para a data, trabalhando com todos os parceiros relevantes. Esse é o objetivo do Plano de Ação para a Segurança dos Jornalistas e a Questão da Impunidade, liderada pela UNESCO, reunindo agências da ONU, governos, comunidade internacional e sociedade civil, para fazer um progresso real nessa área. “Neste primeiro Dia Internacional pelo Fim da Impunidade dos Crimes contra Jornalistas, faço um apelo a todos os governos para garantir investigação rápida e completa cada vez que um jornalista é morto, e à todos os parceiros, para uma cooperação mais forte a fim de melhorar a segurança dos jornalistas”, afirma Irina Bokova, diretora-geral da UNESCO.
No Brasil, só neste ano, foram assassinados três profissionais da categoria. Ela também frisa que desde o ano 2000 “pelo menos 38 jornalistas, boa parte deles que investigavam casos sensíveis como narcotráfico, corrupção ou conflitos políticos locais, foram mortos por razões ligadas, de alguma maneira, às suas atividades profissionais”. Celso Schröder, presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), no Brasil confirma que houve um aumento preocupante do número de crimes. “Por essa razão, procuramos o governo brasileiro há dois anos para dar conta de dois tipos de violência no país: os crimes de encomenda, muito comuns na América Latina, e a violência nos movimentos sociais, com policiais e manifestantes agredindo e até assassinando jornalistas”, relata Schröder.
Três medidas foram formuladas por um grupo de trabalho, a partir desta reflexão. A primeira é a criação de um Observatório da Violência, que teria como objetivo atacar a impunidade, recebendo e acompanhando as denúncias nos níveis policial e judiciário. A segunda é a federalização das investigações de atos contra jornalistas, por meio de um protocolo nos moldes de uma lei existente no México. As duas iniciativas visam principalmente os crimes sob encomenda.
Já no caso da violência contra profissionais da imprensa durante as manifestações de movimentos sociais, como ocorreu em junho do ano passado no Brasil, a Fenaj tenta ser recebida pelo ministério brasileiro da Justiça para implementar ações de política pública que orientem os policiais para que os jornalistas sejam protegidos e poupados em caso de conflitos em manifestações. As três medidas continuam sendo discutidas.
Confira o plano de ação da ONU na íntegra, em português – neste site especial da UNESCO e do Centro de Informação das Nações Unidas para o Brasil (UNIC Rio) de sobre o tema: www.segurancadejornalistas.org *Informações da ONU, Unesco e RFI.