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Relatório da Comissão da Verdade motivará novas ações na Justiça

Em cerimônia oficial no Palácio do Planalto, a Comissão Nacional da Verdade entregou nesta quarta-feira (10) seu relatório final de trabalho à Presidência da República. O documento dividido em três volumes contém um detalhado painel das violações ocorridas nestes 25 anos, apresenta os principais locais onde ocorreram torturas e mortes, e também uma lista com nomes de pessoas que, a serviço do Estado, são apontadas como responsáveis diretos e indiretos pelos crimes. Dos 377 listados, cerca de 200 ainda estão vivos e 23 já são réus em dez ações propostas de procuradores da República que ainda tramitam na Justiça. Agora, o Ministério Público Federal vai utilizar o relatório da Comissão Nacional da Verdade para analisar a abertura de novas ações contra militares e ex-agentes da repressão suspeitos de crimes na ditadura.

Membros da CNV na cerimônia de entrega do relatório - Foto: Fabrício Faria/CNV
Membros da CNV na cerimônia de entrega do relatório – Foto: Fabrício Faria/CNV

O relatório, que causou intensa repercussão na imprensa internacional, é o resultado de dois anos e sete meses de trabalho da Comissão Nacional da Verdade, criada pela lei 12528/2011 e instalada em maio de 2012 para apurar e esclarecer, as violações de direitos humanos praticadas entre 1946 e 1988 (o período entre as duas últimas constituições democráticas brasileiras). O texto afirma que as práticas foram “crimes contra a humanidade” e fizeram parte de uma política sistemática que funcionou durante a ditadura militar.

Em suas conclusões, a comissão recomenda ao Estado brasileiro que as pessoas apontadas sejam responsabilizadas juridicamente – do ponto de vista civil, criminal e administrativo. O texto afirma que elas não podem ser beneficiadas pela Lei n.º 6683, de 1979, mais conhecida como Lei da Anistia. A recomendação – a única que não teve a unanimidade dos votos dos comissionados, numa lista de 29 – não propõe diretamente a revisão da lei de 1979. Mas afirma que o Brasil deveria se sujeitar à decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que em 2010 responsabilizou o País pelo desaparecimento de participantes da Guerrilha do Araguaia, na década de 1970.

As graves violações de direitos humanos investigadas pela comissão e que não seriam passíveis de anistia, pelas convenções internacionais, envolvem prisões sem base legal, a tortura e as mortes dela decorrentes, as violências sexuais, as execuções e as ocultações de cadáveres e desaparecimentos forçados. Praticadas de forma massiva e sistemática contra a população, essas violações tornam-se crime contra a humanidade. “Na ditadura militar, a repressão e a eliminação de opositores políticos se converteram em política de Estado, concebida e implementada a partir de decisões emanadas da presidência da República e dos ministérios militares”, diz o relatório.

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Ao menos 22 pessoas podem ter sido executadas no centro clandestino de tortura conhecido como Casa da Morte, em Petrópolis – Foto: reprodução

O rol de 29 recomendações começa mirando as Forças Armadas – que estiveram à frente do golpe de 1964 e detiveram o poder nos 25 anos seguintes. A comissão recomenda o “reconhecimento, pelas Forças Armadas, de sua responsabilidade institucional, além de sugerir ao Estado brasileiro que desmilitarize as polícias estaduais e revogue da Lei de Segurança Nacional. O terceiro volume do relatório apresenta uma lista, com uma pequena biografia e o histórico das circunstâncias em que morreram, de 434 mortos entre 1946 e 1988. Dessa lista, 210 continuam desaparecidos. A comissão recomenda que seja criado um órgão de governo para dar prosseguimento às buscas de seus restos mortais.

Ainda de segundo o texto, a coincidência de ditaduras militares de orientação ideológica semelhantes na América do Sul nas décadas de 1970 e 1980 se refletiu em uma intensa cooperação regional ao combate à subversão. O documento detalha a atuação de agentes e diplomatas fora do País e a colaboração estrangeira com os militares brasileiros.

O secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, enviou aos membros da Comissão Nacional da Verdade cumprimentos ao governo e à população do Brasil por seus esforços em promover a verdade e a reconciliação nacional por meio do trabalho da CNV. “As Nações Unidas encorajam e apoiam esforços em todo o mundo para desvendar os fatos que envolvem grandes violações dos direitos humanos e da lei humanitária internacional e promovem a justiça e a reparação. Este apoio tem como base a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que celebramos neste dia todos os anos, e nos tratados internacionais de direitos humanos, incluindo a Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados”, afirmou Ki-moon na mensagem.

De quase quarenta comissões da verdade já instaladas ao redor do mundo, a brasileira é uma das poucas que, além de dar voz às vítimas e descrever detalhadamente os casos de graves violações de direitos humanos, aponta os nomes das pessoas que seriam  juridicamente responsáveis. Um exemplo semelhante ocorreu na África do Sul, na apuração dos crimes cometidos durante o regime de apartheid. Outra diferença do relatório final é a ênfase dada a questões como violência sexual, violência de gênero e violência contra crianças e adolescentes na ditadura. No conjunto, desde sua instalação, há 31 meses, a comissão ouviu 1.116 depoimentos.

Acesse o relatório final:

Volume I do relatório As atividades da CNV, as graves violações de direitos humanos, conclusões e recomendações

Volume II do relatório Textos Temáticos

Volume III do relatório Mortos e Desaparecidos Políticos

*Informações da Folha de S. Paulo, Estadão e Comissão Nacional da Verdade (CNV).

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Senado dos EUA divulga relatório sobre tortura adotada pela CIA

O Comitê de Inteligência do Senado divulgou nesta terça-feira o resumo de um relatório sobre o programa de interrogatórios da CIA, elaborado por espiões americanos de alto escalão após os ataques de 11 de setembro de 2001. De acordo com o documento, a CIA enganou os americanos sobre o que estava fazendo e, ao utilizar técnicas coercivas de interrogatório, falhou em conseguir informações que impedissem novas ameaças.

O Senado americano passou cinco anos analisando mais de seis milhões de documentos da CIA. O objetivo era investigar o programa secreto de detenção, criado durante o governo do presidente George W. Bush e encerrado em 2009 pelo presidente Barack Obama. Os suspeitos eram interrogados usando métodos como “waterboarding” (simulação de afogamento, que causava convulsões e vômitos), humilhação, esbofeteamento, exposição ao frio e privação de sono por até 180 horas.

A presidente do comitê que analisou as ações da CIA, Dianne Feinstein: "houve torturas brutais" - Foto: Reuters
A presidente do comitê que analisou as ações da CIA, Dianne Feinstein: “houve torturas brutais” – Foto: Reuters

O relatório conclui que as chamadas técnicas de interrogatório reforçado, postas em prática em prisões secretas ao redor do mundo pelo Governo Bush após os ataques terroristas do ‘11 de Setembro’, foram ineficazes ou não conseguiram obter a cooperação dos detidos. A brutalidade das técnicas chegou a ser tamanha em alguns casos que funcionários da Agência resolveram dar um fim aos procedimentos, mas altos cargos da organização de espionagem determinaram que os eles fossem mantidos. Segundo o documento, as informações que levaram à morte de Osama Bin Laden não foram obtidas sob tortura. O relatório afirma ainda que a CIA forneceu informações incompletas sobre o programa de detenção para o Congresso e Governo.

Algumas informações contidas no relatório já eram conhecidas, mas o documento revelou que as técnicas de interrogatório eram ainda mais brutais do que se imaginava: 119 detentos passaram pelas prisões secretas da CIA, 39 foram torturados. Um deles morreu de frio, acorrentado ao chão de uma cela. Outro foi forçado a ficar mais de uma semana sem dormir. “A tortura não resultou em informações vitais”, disse a senadora Dianne Feinstein, membro do Comitê de Inteligência. Ela disse que as ações da CIA são uma mancha na história americana, mas que o país “mostra que é altivo o suficiente para admitir quando está errado e confiante o suficiente para aprender com seus erros”. “Os presos pela CIA foram torturados, em qualquer definição do termo”, afirmou.

Tortura dos suspeitos foi muito além do 'waterboarding' admitido pela CIA - Foto: Reprodução
Tortura dos suspeitos foi muito além do ‘waterboarding’ admitido pela CIA, diz relatório – Foto: Reprodução

A Casa Branca emitiu apenas um comunicado, após a divulgação pública do relatório, no qual afirma que as práticas de tortura da CIA contra suspeitos de terrorismo durante a década passada não ajudaram nos “esforços contra o terrorismo” nem os interesses de segurança nacional do país. O relatório “documenta um programa preocupante” de interrogatório de suspeitos de terrorismo entre 2001 e 2009, e deve contribuir “para deixar essas práticas onde pertencem, no passado”, finaliza Obama em seu comunicado.

Também através de comunicado, a agência de inteligência insistiu que os interrogatórios ajudaram a salvar vidas. “A inteligência obtida com o programa foi muito importante para nossa compreensão da Al-Qaeda e até hoje informa os nossos esforços de contraterrorismo”, disse o atual diretor da CIA, John Brennan. No entanto, a própria CIA reconheceu que houve erros no programa, especialmente no início, quando não estava preparada para a escala da operação de detenção e interrogatório de prisioneiros.

A oposição Republicana foi contra a publicação do documento, dizendo que além do perigo de retaliações, ele prejudica a imagem dos Estados Unidos. Os Democratas, que insistiram em investigar a CIA, agiram agora por uma questão de urgência. Em duas semanas, perderão o controle do Senado. E sabem que, com os republicanos na liderança, o estudo seria engavetado. O relatório completo tem seis mil páginas e o resumo, apenas 525 páginas. Ele inclui parágrafos inteiros cobertos por tinta preta para proteger informações confidenciais. Confira aqui o texto (em inglês).

*Informações da BBC, Jornal Nacional e El País (Edição Brasil).

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Cuba credencia pela 1ª vez um jornal independente em ato oficial

Pela primeira vez, o governo cubano admitiu o credenciamento de um veículo independente em evento oficial, fato visto como uma modesta vitória da imprensa daquele país na luta pelo direito de existir onde todos os meios de comunicação pertencem ao Estado. Um dos eventos mais prestigiados da América Latina, o Festival Internacional do Novo Cinema Latino-Americano, que começou na última quinta-feira (4) em Havana, autorizou a participação do site 14ymedio.com, fundado e dirigido pela blogueira Yoani Sánchez, abrindo uma brecha no monopólio estatal da informação.

Desde que foi ao ar, 21 de maio deste ano, “14ymedio” tem sido caracterizado por postar conteúdo com forte crítica política e social do governo. Em declarações telefônicas à mídia do exílio cubano em Miami, Sánchez comemorou o acontecimento. “Não sabemos se é uma abertura ou não”, ponderou a filóloga que virou jornalista. Sánchez se tornou conhecida a partir de 2007, com seu blog Generación Y, anterior ao 14ymedio.

Em sua passagem pelo Brasil, em fevereiro de 2013, Yoani Sánchez foi centro de debates sobre o regime cubano e a liberdade de expressão. A visita da blogueira causou uma série de manifestações em Recife, Brasília, São Paulo, Salvador e Feira de Santana, onde grupos políticos simpáticos ao regime instaurado em 1959, com a Revolução Cubana, reagiram com agressividade e impediram Yoani de se pronunciar, fato rechaçado em nota pela Associação Bahiana de Imprensa (ABI).

A inusitada decisão do Festival acontece poucos dias depois de uma tentativa frustrada do redator-chefe do 14ymedio e marido de Yoani Sánchez, Reinaldo Escobar, de conseguir se cadastrar para cobrir a visita à ilha do ministro de Relações Exteriores espanhol, José Manuel García-Margallo, no final de novembro. A mudança de atitude das autoridades poderia estar relacionada com a urgência do Governo cubano — devido à previsão de redução iminente da ajuda econômica da Venezuela— de chegar a um acordo de cooperação com a União Europeia e conseguir uma flexibilização do embargo comercial dos Estados Unidos.

“O colaborador de temas culturais foi ao escritório onde são feitas as credenciais e fez”, disse à DPA Reinaldo Escobar, jornalista que foi expulso do jornal oficial “Juventud Rebelde” no final dos anos 80 por criticar o regime de Fidel Castro. Ele não se atreve a valorizar o que aconteceu como um gesto de abertura da informação. “Eu não posso dizer que esta tem sido uma negligência de quem fez o credenciamento, nem posso dizer que foi uma coisa que foi autorizada a partir de cima. Vamos agir como o que somos, um meio digital que tem todo o direito de ser creditado em qualquer que seja o evento”, afirmou o jornalista dissidente.

A presença muito comentada nos últimos dias em Havana de Ernesto Londoño, jornalista colombiano do conselho editorial do The New York Times, que se reuniu com Sánchez e sua equipe, além de visitar as redações da imprensa oficial, também teria contribuído para a abertura repentina, segundo vários analistas.

O nome de um jornal

“Não queríamos nos apropriar do nome de Cuba para usá-lo como nossa marca e, no seu lugar, escolhemos o mais universal dos códigos: os números.” Yoani Sánchez cumpriu a promessa que anunciou em sua visita ao Brasil e lançou o jornal eletrônico 14ymedio. O nome inspira-se em referências temporais (2014) e espaciais (o andar do apartamento de Yoani, onde funciona a Redação), bem como na ideia de comunicação (“medio”: veículo), e inclui um atestado de origem: o Y, referência a seu blog, “Generación Y”. Num gesto de respeito à diversidade política, “Cuba” ficou de fora: 14ymedio está dizendo que Cuba é a pátria de todos os cubanos, não uma propriedade ideológica.

A pequena redação do veículo, instalada no 14o andar de um edifício de Havana, funciona ilegalmente e vários de seus colaboradores foram intimidados pela Segurança do Estado. Além do contexto político, que não permite o exercício independente do jornalismo, o 14ymedio enfrenta o desafio técnico de chegar aos leitores cubanos em um dos países com menor acesso à Internet de todo o planeta. Os servidores cubanos controlados pelo Estado bloqueiam o acesso ao 14ymedio desde o dia de seu lançamento. Apesar disso, o jornal digital chega à ilha por meio do Facebook, que não é censurado, e de uma versão em PDF que pode ser impressa e que circula facilmente pelos dispositivos USB.

*Informações do El País, El Comercio via Agência DPA e Folha de S. Paulo.

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