ABI BAHIANA

ABI retoma posse do Museu Casa de Ruy Barbosa após disputa judicial

O Museu Casa de Ruy Barbosa foi devolvido à Associação Bahiana de Imprensa (ABI), pouco mais de sete meses após a entidade ingressar com uma ação contra a holding de educação Yduqs, responsável pela antiga Faculdade Ruy Barbosa – atual Centro Universitário UniRuy. A reintegração de posse atende a uma liminar proferida pela Justiça baiana no dia 13 de janeiro, que garantiu a importante vitória para a Associação (Acesse a decisão neste link). Na manhã de hoje (04/02), membros da diretoria da ABI compareceram ao imóvel histórico onde nasceu o jurista baiano, para o ato de reintegração. Depois da visita para registro das condições do equipamento cultural e entrega da chave, foi realizada uma reunião de negociação na sede no Edifício Ranulfo Oliveira, sede da ABI.

O Museu pertencente à ABI foi cedido para a Faculdade Ruy Barbosa, através de convênio firmado em 10 de setembro de 1998, para a realização de atividades acadêmicas e culturais. Em 24 de maio de 2019, contudo, a ABI recebeu uma notificação extrajudicial comunicando o desinteresse pela Casa de Ruy Barbosa e pela continuidade do convênio. Em seguida, a ABI foi surpreendida pela aquisição do grupo estadunidense Adtalem Global Education – conhecido anterioremente como DeVry – pelo Yduqs. Ao longo de 2021, a ABI tentou diálogo com grupo responsável pela instituição de ensino, sem sucesso.

Cada episódio do que parecia ser uma série televisiva trazia uma reviravolta, deixando mais distantes os sonhos da ABI de ver o museu de portas abertas, como organismo vivo que deveria ser. Foram perícias impedidas e adiadas, reuniões com promessas que não avançavam, e tentativas da ABI para entrar no equipamento cultural e salvaguardar seu rico acervo. Enquanto isso, o imóvel estampava em sua estrutura as marcas do abandono e do descaso – intensificado após o furto ocorrido em setembro de 2018. As paredes brancas se vestiram com um amarelo descascado, o tom verde das portas e janelas escancara a falta de limpeza, pragas deterioravam o acervo bibliográfico e mobiliário.

“O cenário é grave, mas só uma perícia poderá dimensionar os danos efetivos”, pondera o jornalista Ernesto Marques, presidente da ABI. Depois de mais de um ano sem entrar no imóvel, ele lamentou a situação encontrada esta manhã. Marques e o vice-presidente da ABI, Luís Guilherme Pontes Tavares, foram recebidos por três representantes do Grupo Yduqs. Foi feita uma visita às instalações do Museu e depois a ABI recebeu a chave do imóvel. 

>> Confira o vídeo da visita aqui.

Já na sede da ABI, na Praça da Sé, as instituições assinaram o Termo de Entrega de Chave e Posse. Os móveis da residência de verão de Ruy Barbosa ainda estão em poder do UniRuy, armazenados no galpão de uma transportadora. Livros, documentos, objetos pessoais e obras de arte compõem a parte do acervo transferido para a sede da ABI e vão demandar muito tempo e recursos para o trabalho de higienização e restauro. 

A ABI recebeu um laudo de inspeção técnica contratada pela holding, “visando a constatação das condições da edificação” e do armazém onde está parte do acervo e móveis do Museu. Na segunda-feira (7), haverá um novo contato, a fim de estabelecer prazos para a realocação do acervo. 

Justiça

Até a decisão do último dia 13, os únicos êxitos da Associação tinham sido a catalogação e o traslado do acervo para o seu edifício-sede, na Praça da Sé, visto que até a restauração do telhado da Casa foi feita à revelia, bem como outras intervenções que a ABI não autorizou, por causa da recusa ao pedido de apresentação dos projetos técnicos.

“A ABI tentou, até o limite, oferecer ao grupo a oportunidade de transformar o problema em projeto cultural, aproveitando leis de incentivo, como o Viva Cultura da Prefeitura. O Yduqs não considerou a proposta e a liminar veio antes”, observa Ernesto Marques.

A liminar considerou caracterizado o esbulho (apropriação indevida) a partir do momento em que a instituição de ensino se negou a restituir a posse do imóvel. De acordo com o documento, uma vez rescindido o convênio mantido com a antiga Faculdade Ruy Barbosa, deixou de existir suporte jurídico que justificasse o uso por parte da holding de educação superior que assumiu o UniRuy.

No entendimento da juíza Itana Rezende, as razões invocadas pelo Grupo Yduqs para manter a sua posse “não são capazes de obstar a retomada do imóvel, pois o fato de integrar o mesmo grupo econômico da Faculdade Ruy Barbosa não lhe confere legitimidade para ocupar a posição jurídica contratual da conveniada”. Tratam-se de pessoas jurídicas autônomas, com contrato social, CNPJ e estabelecimentos distintos. 

A entidade segue com ações indenizatórias para reparar os danos causados ao imóvel e aos acervos, bem como prejuízos à imagem do Museu, por ter ficado tantos anos fechado. De acordo com a liminar, o pedido de reparação de danos materiais “tem por fundamento fático os supostos danos causados pela modificação da estrutura arquitetônica do imóvel e destruição de parte do acervo bibliotecário e mobiliário”. 

Um novo museu vem aí

Nas décadas de 1970 e 1980, o Museu manteve a série Publicações da Casa de Ruy e estabeleceu convênio com a Fundação Casa de Rui Barbosa, do Rio de Janeiro, disso resultando intercâmbio administrativo e cultural. Na década de 1990, o museu baiano foi roubado e, na ocasião, a nascente Faculdade Ruy Barbosa, iniciativa do professor Antônio de Pádua Carneiro, propôs convênio com o propósito de manter o equipamento e estimular sua visitação.

No auge de suas atividades, a Casa de Ruy Barbosa costumava receber estudantes da instituição, principalmente do curso de Direito. Se depender da ABI, a antiga residência do “Águia de Haia” não vai mais figurar no Centro Histórico como um museu de portas fechadas (confira esta reportagem de Clarissa Pacheco, para o Jornal Correio*).

“A ABI retomou a posse da Casa, que é nossa, depois de um longo processo. Tentamos até a exaustão uma saída negociada, mas a demora já estava comprometendo todos os nossos planos de reabertura do Museu, sem que a instituição dissesse o que pretendia. Por isso, entramos com a ação”, explica Ernesto Marques. 

A instituição se prepara agora para retomar os planos de reestruturação do imóvel. Uma das ações está em curso desde julho passado: a articulação do centenário de falecimento de Ruy Barbosa, que ocorrerá no dia 1° de março de 2023. A ABI convocou instituições guardiãs da memória de Ruy Barbosa para montar a programação comemorativa do evento. 

A agenda “Ruy, 100 anos depois” prevê atividades junto à sociedade baiana e a tão aguardada reabertura do Museu Casa de Ruy Barbosa. “Entre os projetos que já estavam definidos pela Comissão Organizadora do Centenário, mas que foram travados pela resistência do UniRuy, estão a revitalização da Rua Ruy Barbosa (Leia o artigo de Nelson Cadena) e a repaginada radical do Museu, cujos novos projetos museológico e expográfico têm como meta atualizar a figura de Ruy Barbosa e aproximá-lo das juventudes”, afirma Ernesto Marques.

Confira abaixo algumas fotos:

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NOTA SOBRE OS ACONTECIMENTOS DE ÁGUAS CLARAS

A crescente ostentação da violência resultante das disputas entre organizações criminosas alvejou a imprensa, enquanto instituição fundante da sociedade civilizada com a qual estamos eticamente comprometidos. Os profissionais das tvs Bandeirantes e Aratu agredidos e ameaçados por marginais no bairro de Águas Claras, em Salvador, representam toda a imprensa baiana e a estes colegas e suas emissoras, prestamos a mais irrestrita solidariedade.

Somente quem não aceita as leis e regras de convivência numa sociedade civilizada e democrática, recusa e agride jornalismo. A resposta a qualquer agressão ao livre exercício da nossa atividade profissional não pode ser outra, senão, mais jornalismo.

Mantido o bom senso dos colegas das equipes de reportagem, a melhor resposta é a mais ampla e qualificada cobertura dos fatos violentos que hoje alvejaram a imprensa, mas diariamente ameaçam a todos, jornalistas ou não, dentro e fora da segurança do lar.

O imprescindível distanciamento crítico em relação à atuação de órgãos públicos responsáveis pelas políticas de segurança pública não dá margem a qualquer dúvida. O olhar da imprensa pode e deve estar atento ao cumprimento das leis pelos agentes da lei, sem que isso se confunda com qualquer antagonismo: estamos todos do mesmo lado, e do outro lado estão os que escolhem viver à margem das leis e das regras de convivência civilizada.

A ABI estará sempre ao lado de quem defende a vida.

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