por Vitor Hugo Soares*
Navego águas intranquilas da Internet, destes dias no Brasil de olhos vidrados no terrorismo, às vésperas dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, enquanto, em Curitiba, o juiz Sérgio Moro segue inabalável expondo, à luz do sol e ao conhecimento da sociedade, o perigo maior: as contaminadas entranhas de um País moralmente doente, mas ainda em busca esperançosa de uma saída para a salvação. Desta vez, na quinta-feira, 21, quando o publicitário João Santana e sua mulher, Mônica Moura, diante do magistrado, revelaram de viva voz a disposição de colaborar com a Justiça, no crucial andamento da Operação Lava Jato.
Trafego, com atenção e cuidado, pelas paginas dos sites dos principais jornais nacionais e estrangeiros e outras mídias informativas. Ando à cata de notícias “quentes” (ou menos manjadas, digamos assim), para abastecer e atualizar o site blog que edito há anos na Bahia. De repente, o sopapo formidável de um fato inesperado para o distraído jornalista que assina este artigo, apesar da justiça cristalina do conteúdo. Confira a notícia – já transcrita em O Globo e no blog de Fernando Rodrigues (UOL-Folha –Twitter). Isso talvez ajude a entender melhor o enorme alvoroço que, em seguida, me assalta a memória e vai pousar no coração do veterano repórter, temperado há décadas para receber fortes impactos, q ue mexem fundo na emoção.
“O professor e jornalista Rosental Calmon Alves, fundador do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, foi escolhido para receber o Prêmio Maria Moors Cabot 2016, da Universidade de Columbia, em Nova York. O prêmio, que reconhece coberturas jornalísticas excepcionais nas Américas, e que tenham contribuído para o entendimento interamericano, destacou que Rosental é “um verdadeiro líder inovador em cenário de mudanças na mídia”.
Confiro o calendário do PC, depois de ler a informação original: Quarta-Feira, 20 de julho de 2016. Data destinada a representar uma marca histórica de reconhecimento internacional da inteligência, inovação e qualidade do jornalismo brasileiro. Isso, apesar do ralo destaque e parca repercussão do fato, até aqui, em nossos maiores jornais impressos, principais redes de televisão ou emissoras de rádio e outras mídias, incluindo o jornalismo que se pratica na Internet, universo de inovação tecnológica e profissional onde o vencedor do Prêmio Cabot deste ano é um notável pioneiro no Brasil.
Em Salvador, de onde escrevo estas linhas semanais de informação e opinião, a desatenção das pautas e o silêncio nas redações e nas principais entidades de representação profissional são de mexer com os nervos. Isso, apesar da estreita relação e contribuição de Rosental com o jornalismo baiano – especialmente no rádio e na web.
O que não esqueço nunca é do meu primeiro encontro com o agora vencedor do mais antigo e relevante prêmio mundial do jornalismo livre e independente, que teve, ano passado, outro ganhador brasileiro: o jornalista Lucas Mendes, âncora do programa Manhattan Connection, da Globo News. A memória me reconduz ao começo dos anos 70, quando nos vimos pela primeira vez, no Rio de Janeiro. O encontro foi em frente à porta de vidro que separava o “aquário” da Editoria Nacional, do monumental e vibrante espaço onde funcionava a Redação do Jornal do Brasil, na nova sede do então indispensável diário, na Avenida Brasil. Ch efe da Redação, da Sucursal de Salvador, acabara de desembarcar no Rio, para fazer um treinamento preparatório, para implantação da Rádio Jornal do Brasil FM- Salvador que, na época, representaria uma inovação expressiva de conteúdo e qualidade no rádio-jornalismo baiano.
Conversava com Juarez Bahia, editor Nacional, uma das legendas do jornalismo brasileiro que povoavam o grande diário. Seis prêmios Esso no currículo, autor de livros clássicos do ensino da Comunicação, mestre de Teoria e Prática, de várias gerações de acadêmicos e profissionais de imprensa, ponte competente, generosa e segura na ligação Rio-Salvador no JB. Um jovem repórter, a caminho do trabalho na redação da Rádio JB-AM, aparentemente tão tímido quanto eu, pára para cumprimentar o editor, professor e amigo comum.
Bahia, ao seu estilo tranqüilo, mas incisivo, surpreende aos dois, dirigindo-se a mim: “deixe eu lhe apresentar aqui ao Rosental. Para mim, ótimo repórter e excelente redator, além de uma das melhores jovens promessas, entre os profissionais de sua geração. Cole nele, estou certo de que lhe será muito útil neste seu atual aprendizado de rádio- jornalismo. Antevejo, ainda, uma rica e produtiva amizade cultural e profissional entre vocês dois”. Na mosca! Profético, Juarez Bahia. Foi química positiva à primeira vista. Ali nascia a amizade que atravessaria décadas, até o amargo fim do Jornal do Brasil. Lembro que um dos últimos e mais agradáveis encontros foi em seu apartamento, em Buenos Aires, quando Rosental iniciava na Argentina sua destacada atuação de corre spondente internacional.
Agora olho a foto que ilustra a notícia do Cabot 2016. O senhor de barbas, ar sempre reflexivo, fala da honra com o reconhecimento pelo seu quase meio século de carreira dedicada ao jornalismo. Vibra, ainda, com a mesma intensidade do jovem que conheci no JB. Ou o garoto que começou aos 16 anos, como estagiário nas redações do Rio.
Diz ter pensado que suas chances de ganhar o Cabot tinham terminado quando ele deixou o Jornal do Brasil, após 27 anos no jornalismo brasileiro. Mas a verdade é: ainda assim,desde que mudou da redação carioca para a sala de aula em Austin, no Texas, seguiu fazendo tudo para contribuir e poder melhorar o jornalismo no Hemisfério Ocidental. Um exemplo, de verdade.
Valeu, Rosental! O jornalismo brasileiro lhe agradece. E o Prêmio Maria Moors Cabot 2016 lhe cai como luva. Abraço da Bahia para você. O saudoso “Bahia”, estou certo, vibra também com a sua conquista, onde ele estiver agora. Minhas palmas e meu melhor e mais forte abraço.
*Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta. E-mail: [email protected]