ABI BAHIANA

NOTA SOBRE OS ACONTECIMENTOS DE ÁGUAS CLARAS

A crescente ostentação da violência resultante das disputas entre organizações criminosas alvejou a imprensa, enquanto instituição fundante da sociedade civilizada com a qual estamos eticamente comprometidos. Os profissionais das tvs Bandeirantes e Aratu agredidos e ameaçados por marginais no bairro de Águas Claras, em Salvador, representam toda a imprensa baiana e a estes colegas e suas emissoras, prestamos a mais irrestrita solidariedade.

Somente quem não aceita as leis e regras de convivência numa sociedade civilizada e democrática, recusa e agride jornalismo. A resposta a qualquer agressão ao livre exercício da nossa atividade profissional não pode ser outra, senão, mais jornalismo.

Mantido o bom senso dos colegas das equipes de reportagem, a melhor resposta é a mais ampla e qualificada cobertura dos fatos violentos que hoje alvejaram a imprensa, mas diariamente ameaçam a todos, jornalistas ou não, dentro e fora da segurança do lar.

O imprescindível distanciamento crítico em relação à atuação de órgãos públicos responsáveis pelas políticas de segurança pública não dá margem a qualquer dúvida. O olhar da imprensa pode e deve estar atento ao cumprimento das leis pelos agentes da lei, sem que isso se confunda com qualquer antagonismo: estamos todos do mesmo lado, e do outro lado estão os que escolhem viver à margem das leis e das regras de convivência civilizada.

A ABI estará sempre ao lado de quem defende a vida.

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Notícias

Mulheres jornalistas sofreram 6 ataques por mês em 2021

Um monitoramento realizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) revelou um dado alarmante sobre a violência de gênero contra jornalistas. De janeiro a 22 de dezembro de 2021, mulheres jornalistas foram agredidas, ofendidas, intimidadas e ameaçadas no exercício da profissão em 78 episódios diferentes, o que resultou em mais de ataques por mês. Foram 62 vítimas ao todo e 34,6% dos ataques usaram o gênero, a sexualidade ou a orientação sexual como ferramenta de agressão. Do total de agressões contra comunicadoras em 2021, 62,8% ocorreram enquanto as profissionais cobriam questões políticas.

Em 71,8% dos casos identificados pela Abraji, mulheres jornalistas foram alvos dos chamados discursos estigmatizantes, agressões verbais com o intuito de hostilizar e descredibilizar as vítimas. Nesse contexto, termos como “militante”, “jornazista”, “lixo” e “comunista” foram empregados para desacreditá-las como profissionais. Expressões misóginas também fizeram parte da dinâmica de agressões e estiveram presentes em 41% dos discursos voltados a jornalistas e comunicadoras, representando 29,5% do total de ataques. Elas foram chamadas de “vagabundas”, “putas”, “biscates”, “feias”, “velhas”, “burras” e “loucas”, entre outras palavras sexistas que instrumentalizam aparência e sexualidade na tentativa de calar suas vozes.

Daniela Lima, apresentadora na CNN Brasil, é uma vítima recorrente desses ataques. Ela foi alvo de sete casos de agressão entre janeiro e novembro de 2021, todos envolvendo discursos estigmatizantes originados ou com repercussão nas redes sociais. Em quatro episódios, seus agressores foram atores estatais como o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ); os deputados federais Carlos Jordy (PSL-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PSL-SP); o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo; o assessor especial de Jair Bolsonaro (PL-RJ), Tercio Arnaud Tomaz, e o próprio presidente que, em 1.jun.2021, chamou Lima de “quadrúpede”, durante entrevista dada em frente ao Palácio do Planalto. A jornalista também foi chamada de “vaca”, “louca” e “desprezível”.

No dia 8 de novembro, a jornalista foi mais uma vez agredida ao cobrir temas políticos quando noticiou a soltura do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), preso por apologia ao AI-5 e por atacar em redes sociais ministros do Supremo Tribunal Federal. Bolsonaristas tomaram o Twitter com mensagens que tachavam Lima de “lixo”, “louca” e “militante”.

Na Bahia

De acordo com a Abraji, casos como o de Daniela escancaram a violência que as jornalistas sofrem no atual cenário político brasileiro, mas muitos outros episódios permanecem nas sombras. Em novembro de 2021, a Abraji noticiou o caso da jornalista Alana Rocha, que atua em Riachão do Jacuípe (BA), a cerca de 200 km de Salvador. O caso de Rocha envolveu  perseguições de funcionários da prefeitura da cidade e a violência transbordou o ambiente on-line, chegando a ameaças e ofensas diretas. Por ser uma mulher trans, os ataques foram acompanhados de xingamentos transfóbicos.

O estigma que acompanha as agressões ligadas ao gênero leva à subnotificação desses episódios. Por isso, a Abraji lançou um canal para denúncias de ataques de gênero a profissionais de imprensa. Por meio dele, é possível registrar situações vividas ou presenciadas ao longo de 2021.

As agressões foram registradas no âmbito do projeto Violência de gênero contra jornalistas, iniciativa da Abraji realizada com financiamento da UNESCO e parceria de Mulheres JornalistasInstituto Patrícia GalvãoFenajGênero e NúmeroCPJ e Repórteres sem Fronteiras. Em 1.dez.2021, foi lançada a plataforma do projeto para reunir informações sobre os ataques com viés de gênero que vitimaram comunicadoras e comunicadores no país, além dos ataques contra mulheres jornalistas aqui apresentados. O monitoramento é a extensão de um trabalho focado em violações da liberdade de imprensa, realizado pela Abraji em parceria com a rede Voces del Sur desde 2019.

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Notícias

Programas de proteção oferecem de suporte jurídico à defesa da vida de jornalistas

Ocupando a posição 111 do Ranking Mundial de Liberdade de Imprensa, elaborado pela Repórteres Sem Fronteiras (RSF), o Brasil não apresenta um cenário animador para os profissionais de imprensa. Entre ataques, físicos e virtuais, agressões verbais, descredibilização e assédio, jornalistas e comunicadores sentem o cerceamento da liberdade de expressão. Quando um país passa a se tornar palco de ataques reiterados à imprensa, cresce a importância dos programas de defesa a essa classe. 

“A simples necessidade ou cogitação de um programa específico é um sintoma suficientemente grave de que a sociedade brasileira está seriamente doente”, considera o jornalista e radialista Ernesto Marques, presidente da ABI. Assim como outras entidades, a ABI atua através da publicização de casos de violação dos direitos humanos e da liberdade de imprensa e do suporte jurídico. A Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ) possui o próprio programa de proteção em casos de ameaça à vida, que disponibiliza recursos para o deslocamento de profissionais sob ameaça. 

Mas, para Ernesto Marques, ainda é necessário defender o jornalismo como atividade essencial para a democracia. “Não há o que relativizar: exatamente numa crise da democracia como a conhecemos nos dias de hoje, o livre exercício do jornalismo é condição essencial para superar qualquer crise. A informação é tão essencial quanto o ar que respiramos”, completa.

Outra entidade que passou a oferecer assistência, no âmbito jurídico, para jornalistas foi a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). Atenta ao crescimento do uso dos processos judiciais contra jornalistas e veículos como forma de silenciamento da imprensa, a Abraji fundou, em abril, o Programa de Proteção Legal para Jornalistas. O programa conta com a parceria do Instituto Tornavoz e com financiamento da organização internacional Media Defence. O jornalista que estiver sendo alvo de processos como forma de silenciamento ou que esteja sendo perseguido e queira denunciar pode entrar em contato com a Associação para ver se o seu caso se encaixa nos critérios do programa. 

O primeiro caso atendido pelo programa foi o do jornalista Alexandre Aprá, anunciado em julho. Segundo o jornalista, ele sofreu mais de vinte processos partindo de pessoas do grupo político do governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (DEM). O caso financiado pela Abraji é referente ao processo movido pelo secretário da Casa Civil, Mauro Carvalho Júnior, que pede uma indenização de 14 salários mínimos alegando ter sofrido ofensa à honra por conta de uma série de reportagens publicada no blog de Aprá, o ”Isso É Notícia”. As reportagens publicizaram a compra de jatos de luxo feita pelo governo estadual. 

“Infelizmente aqui o judiciário é muito atrelado ao governo, o Ministério Público é omisso em relação ao governo do estado, o judiciário é leniente em relação ao governo do estado e você [acaba] enfrentando o governo do estado e por consequência o Ministério Público e Justiça. Então você sofre um pouco os efeitos dessa briga que às vezes acaba te desgastando”, narra Alexandre Aprá. Entre os efeitos dessa disputa jurídica, também estão os que afetaram as finanças do profissional. De acordo com o jornalista, o blog perdeu anunciantes por conta da pressão do governo, o que levou a um enxugamento da equipe por trás do blog. 

Até o momento, o caso de Alexandre Aprá e o da jornalista Tania Pacheco, do blog Combate Racismo Ambiental, foram os primeiros a serem atendidos pela Abraji, e outros três receberam aconselhamento. Através do programa, os jornalistas tiveram o acesso facilitado a advogados, seja por indicação ou um de sua própria preferência. Há também o acompanhamento das peças de defesa dos profissionais. 

Segundo Cristina Zahar, secretária executiva da Abraji, esses processos possuem um certo modus operandi em comum. “Dos casos que já atendemos vemos que os processos, para além de tentarem censurar algum conteúdo publicado, tem o intuito de silenciar o jornalista ou comunicador e obstruir a realização de seu trabalho, distorcendo a narrativa dos fatos e invertendo as posições, se colocando como vítima e os comunicadores como supostos agressores”.

Além dos processos indenizatórios, há ainda os pedidos de retirada de conteúdo do ar mapeados pela Abraji através do projeto Crtl-x. É nesse contexto que surge o programa, mas, como destaca Zahar, o assédio judicial a jornalistas não está restrito ao Brasil. Ela recorda o termo SLAPPs, que é a sigla em inglês para ação judicial estratégica contra a participação pública, usada principalmente em contextos autoritários. “Vemos diversos agressores se mobilizarem de forma organizada a moverem ações judiciais contra a imprensa como forma de intimidação, a provisão judicial, ou seja, a concessão do seu pedido não é o objetivo principal, mas constranger e intimidar o trabalho da imprensa”, afirma. 

Políticas públicas de proteção

Na esfera governamental, os programas de proteção atuam em casos mais extremos. São três: o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), o Programa de Proteção a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas (Provita) e o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM). “No primeiro, a gente expõe a luta das pessoas e dá visibilidade a elas; nos dois outros, escondemos as pessoas”, recorda o superintendente da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SJDHDS), Jones Carvalho.

Em 2018 jornalistas e comunicadores foram incluídos no Programa de Proteção a Defensores dos Direitos Humanos, Comunicadores Sociais e Ambientalistas (PPDDH), do  Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. A inclusão foi feita após a demanda de várias organizações e entidades, como a Fenaj. Segundo o Ministério, uma das motivações que levaram à inclusão da categoria foi a baixa demanda mesmo diante da quantidade de casos de ameaças noticiados. 

De fato, segundo dados do Ministério, em todo o país há cerca de 650 pessoas no programa, e, entre esses, há apenas sete jornalistas protegidos. Em sua maior parte, as vidas sob proteção do PPDDH são os militantes pelo direito à terra e território. “Muitos (jornalistas) são ameaçados, uns acham que é normal, que faz parte, vão para o enfrentamento e não procuram retaguarda”, afirma Jones Carvalho.

Para o coordenador-geral de Proteção à Testemunha e aos Defensores de Direitos Humanos, Douglas Sampaio, pode haver também uma certa desconfiança dos comunicadores em relação ao anonimato dos dados das pessoas defendidas. No caso dos programas de proteção a testemunha e direitos humanos, Sampaio reitera que há total sigilo das informações. “O que a gente tem feito no âmbito da coordenação é juntamente com os estados que possuem o programa de proteção e com as associações da entidade civil, apresentar o programa para os comunicadores, o funcionamento, como ele é executado”, relata.  

O apoio do programa pode ser procurado pela própria secretaria, no Ministério Público, na Defensoria Pública do Estado ou nas Delegacias. Mas há alguns critérios para receber a ajuda do PPDDH. Pode buscar apoio do programa qualquer profissional que esteja sob ameaça em razão de sua atuação como um defensor dos direitos humanos e que não tenha conseguido ajuda pelos meios tradicionais do Estado. Mas o comunicador precisa representar um coletivo e ter reconhecimento de outras instituições que também atuem na defesa dos direitos humanos. É necessário também que o risco sofrido seja em razão da atuação da pessoa como um defensor dos direitos humanos.

Douglas Sampaio ressalta que o PPPDH atende defensores que atuam com qualquer área da comunicação, seja radialistas, redatores, apresentadores ou youtubers. A partir do atendimento, a equipe técnica irá se mobilizar para buscar a aproximação desse defensor com parlamentares, vereadores e membros do Ministério Público que dialoguem com a linha de defesa daquela pessoa. “Esse é um trabalho de contínuo aprimoramento que a gente tem feito de forma que nosso público alvo que esteja incluído no programa de proteção ele tenha de fato uma visibilidade articulada por meio da equipe técnica”, coloca. 

As medidas protetivas a serem ofertadas pelo PPDDH visam ainda o acompanhamento, monitoramento e acolhimento dos defensores  que se encontrem sob ameaça. Isso inclui visitas no local de atuação do defensor, ações de visibilidade para o trabalho do defensor e articulação entre os poderes estatal, municipal ou federal e entidades ou órgãos para promover ações que visem superar a ameaça aos defensores dos direitos humanos. “Os programas dão assistência psicológica e acompanhamento jurídico também. Já passei por perseguição na ditadura, 24h, é um processo de tensão que às vezes as pessoas não se dão conta”, completa o superintendente Jones Carvalho. 

O PPDDH é executado por meio de convênio na Bahia, Ceará, Pernambuco, Pará, Maranhão, Minas Gerais e Rio de Janeiro. 

*Larissa Costa, estudante de Jornalismo, estagiária da ABI.
Sob supervisão de Simone Ribeiro

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ABI BAHIANA

ABI repudia agressão às equipes das TVs Bahia e Aratu durante visita de Bolsonaro

NOTA DE PESAR E DE REPÚDIO

Diante da lastimável estatística de pelo menos uma atitude hostil a cada visita do presidente Jair Bolsonaro à Bahia e, considerando terem sido mulheres a jornalista agredida verbalmente pelo mandatário maior da República na visita anterior, e também a repórter contida por um segurança da Presidência com um “mata-leão”, a Associação Bahiana de Imprensa vem a público expressar, em primeiro, o seu profundo pesar por ser necessário dirigir uma nota de repúdio a um escolhido pelo povo brasileiro para ocupar a Presidência da República.

O constrangimento se faz necessário e inevitável diante de mais uma prova inequívoca do perigo resultante de um padrão de conduta que serve de exemplo para expressivo contingente de seguidores. Padrão de conduta que não tem amparo no decoro que se espera de qualquer pessoa que venha a ocupar a Presidência da República.

Atos e palavras francamente hostis à imprensa enquanto instituição, suas empresas e profissionais; atos e palavras explicitamente violentos e sugestivos de violência física contra jornalistas, especialmente contra mulheres jornalistas, recentes e pretéritos, não nos deixam alternativa. Um país morre junto com a sua democracia se fatos como os de Itamarajú passam a acompanhar a agenda oficial do presidente em nossa terra ou numa missão internacional, como recentemente, em Roma.

Se nem mesmo a investidura da Faixa Presidencial e o juramento de posse bastaram para impor um mínimo de decoro à conduta pessoal do Sr. Jair Messias Bolsonaro, não serão capazes de fazê-lo as mais veementes notas de repúdio. É o limite institucional de entidades como a Associação Bahiana de Imprensa. Há, contudo, nos pilares da democracia brasileira, agentes públicos com prerrogativas e poderes para agir – independente de provocação ou denúncia.

Se o “mata-leão” não gravado foi reconhecido oficialmente e objeto de protocolar pedido de desculpas, ganharam o mundo as imagens das agressões de um apoiador do presidente contra equipes de reportagem. Se não for imediatamente identificado e indiciado em inquérito policial, o guarda da esquina de Itamarajú pode animar outros.

A reiteração do discurso violento contra a imprensa e/ou qualquer tentativa de justificação desse discurso precisa ser contida enérgica e efetivamente desde já. Os números de estudos confiáveis já publicados sugerem uma crescente que, não sendo revertida, tem potencial para produzir tragédias. A inércia de hoje será a cumplicidade pelo que vier a ocorrer amanhã.

A Associação Bahiana de Imprensa repudia toda e qualquer expressão de violência, especialmente se o objetivo for intimidar a atividade jornalística. A ABI se solidariza com os quatro colegas agredidos em Itamarajú, bem como com seus colegas de redação e respectivas emissoras e conclama profissionais e empresas jornalísticas a refletirem sobre medidas práticas para proteção coletiva durante a cobertura do momento eleitoral e posse dos eleitos.

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