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Estudo revela como o enfraquecimento da democracia prejudica a atividade jornalística

Um estudo publicado pela revista Journalism: Theory, Critique and Practice traz uma importante análise sobre como o regime político de um país influencia nas ocorrências violentas contras profissionais da imprensa. De acordo com o artigo “Explicando o assassinato de jornalistas na era contemporânea: a importância de regimes híbridos e variações subnacionais”, com a democracia enfraquecida globalmente nos últimos 25 anos, os autoritários locais se tornaram a principal ameaça aos jornalistas.

“Devemos destacar as contribuições dos jornalistas locais para a prestação de contas em uma democracia e para a proteção de direitos, ao mesmo tempo em que pressionamos os governos nacionais a reverter essa tendência”, defende uma das autoras do estudo, a jornalista e professora Sallie Hughes, em artigo divulgado pelo Centro Knight para o Jornalismo nas Américas, da Universidade do Texas, em Austin.

“Os autoritários locais se tornaram a principal ameaça aos jornalistas.”

“Nós que trabalhamos como jornalistas ou pesquisadores especializados na América Latina conhecemos bem os perigos que os jornalistas enfrentam em muitos contextos na região”, ressalta Sallie Hughes, docente da Universidade de Miami. A professora lembra que, nos últimos 25 anos, Brasil, México, Colômbia, Guatemala e Honduras ganharam notoriedade por estarem entre os países mais letais do mundo para jornalistas, e que esses países representam tendências globais mais amplas.

Mapeando o perigo

De 1992 a 2016, 1.812 jornalistas foram mortos no trabalho em todo o mundo e a taxa média anual de assassinatos aumentou – de 48 por ano entre 1992 e 2001, para 72 entre 2002 e 2011, finalmente, para 91 entre 2012 e 2016, de acordo com o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) – uma das organizações mais ativas na sistemática documentação dos assassinatos. Hughes e sua parceira de pesquisa, Yulia Vorobyeva, analisaram os dados do CPJ, de forma independente.

“Ao analisar as 1.812 mortes de jornalistas em todo o mundo de 1992 a 2016, encontramos evidências esmagadoras de que um tipo específico de sistema político – muito familiar para latino-americanos e estudiosos da América Latina– era mais letal para jornalistas”, afirma. “Países com regimes políticos “híbridos”, que misturam elementos liberais e “iliberais” (com tendências autoritárias), criam, de longe, o contexto mais perigoso para jornalistas em todo o mundo. Ao mesmo tempo, uma configuração espacial específica da autoridade política dentro desses países, condições políticas locais descritas como autoritarismo subnacional, explicam a lógica dos assassinatos”, explica a pesquisadora.

De acordo com Hughes, os sistemas políticos híbridos territorialmente desiguais apresentam normas no nível nacional que garantem explicitamente a liberdade de imprensa e condenam práticas iliberais. Essas normas nacionais incentivariam os jornalistas, muitos dos quais formados profissionalmente durante os períodos de liberalização política, a monitorar o poder e denunciar abusos. Entretanto, ressalta ela, expor a corrupção, políticas de segurança fracassadas ou outros abusos se torna perigoso quando a prestação de contas é fraca e as autoridades locais têm incentivos para atacar os críticos e silenciá-los.

“O conluio de interesses criminais, comerciais e políticos frequentemente ocorre onde os governos locais, as forças de segurança e as organizações criminosas são pouco contidas. As fortes correlações entre a cobertura desses tópicos e o assassinato de jornalistas em regimes híbridos são uma evidência contundente do perigo que isso cria para os profissionais da imprensa”, alerta.

"(...) os resultados confirmam que democracias com maior responsabilidade eleitoral e proteção de direitos proporcionam maior segurança aos jornalistas. As vidas perdidas nessas democracias ultrapassam medidas quantitativas, assim como todas as mortes. No entanto, o mapeamento mostra que as condições para o jornalismo nas democracias e nos híbridos democráticos variam enormemente e de maneiras que afetam profundamente o desempenho profissional e o bem-estar pessoal dos jornalistas.

Ao longo do último quarto de século, a propagação de regimes políticos híbridos ligada à estagnação da liberalização – ou recuo – envolveu uma variação espacial no desempenho das instituições democráticas, incluindo aquelas que apoiam uma imprensa crítica. As conclusões deste estudo e de outros sugerem que os jornalistas às vezes resistem à violação das normas democráticas, e que a resistência traz consequências potencialmente de longo alcance para a política, a governança e os direitos humanos. Estudos em alguns dos países mais perigosos para jornalistas mostram que reportagens reveladoras podem afetar significativamente os resultados das eleições, fornecendo material para a oposição se organizar ou fortalecendo as funções judiciais ou investigativas do Congresso. Um processo de democratização local também pode ocorrer quando as investigações de jornalistas são apoiadas pela mobilização de organizações civis locais ou por partidos da oposição. Assim, salvaguardar jornalistas pode muito bem salvaguardar o liberalismo". ____ Sallie Hughes

O resultado dos estudos traz ao menos dois impactos. 1) Para os acadêmicos, elas oferecem mais suporte para abordar problemas do mundo real com teorias e técnicas multidisciplinares, nesse caso, oriundos da ciência política, da sociologia do jornalismo e da análise socioespacial na geografia. 2) Para formuladores de políticas públicas, defensores da imprensa e organizações governamentais internacionais, eles sugerem redirecionar o discurso e a ação para destacar as contribuições dos jornalistas locais para os direitos humanos e para a prestação de contas em uma democracia. “Ainda que outros jornalistas também corram perigo algumas vezes, são os jornalistas locais que pagam o preço mais alto de forma desproporcional”, conclui a jornalista.

A íntegra do artigo “Explaining the Killing of Journalists in the Contemporary Era: The Importance of Hybrid Regimes and Subnational Variations.” (Explicando o assassinato de jornalistas na era contemporânea: a importância de regimes híbridos e variações subnacionais) pode ser lido aqui: https://doi.org/10.1177/1464884919885588.

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ABI BAHIANA

No prelo! Acervo doado à ABI pela família de Walter da Silveira gera primeiro livro

Por Joseanne Guedes e Rayssa Pio

“Walter da Silveira e o cinema moderno no Brasil” é o título do primeiro produto desenvolvido a partir de acervo de Walter da Silveira em posse da Associação Bahiana de Imprensa (ABI). O livro-arquivo, em fase final de editoração, é derivado de uma pesquisa coordenada por Cyntia Nogueira, professora do curso de Cinema e Audiovisual da UFRB – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. O projeto que deu origem à obra teve início no ano do centenário de Walter da Silveira, 2015, mesmo período em que grande parte do seu acervo foi doada pela família à ABI. O material se juntou a 330 títulos da biblioteca pessoal do crítico e cineasta, comprados pela Associação em 1972, dois anos depois do seu falecimento. 

Cerimônia de doação do acervo de Walter da Silveira, em 2015 | Foto: Luiz Hermano Abbehusen

A doação, formalizada em uma cerimônia que reuniu na ABI importantes figuras da cena audiovisual – como Guido Araújo e Bertrand Duarte -, foi possível graças à cineasta Márcia Nunes. Amiga da família, ela conheceu a ABI na inauguração da Sala Roberto Pires e apresentou à instituição a filha de Walter, Kátia da Silveira.  Na época, Cyntia Nogueira estava fazendo doutorado e se mostrou entusiasmada com a possibilidade de explorar acervo inédito de um dos maiores pensadores sobre cinema no Brasil.

O objetivo da construção de um produto da pesquisa “Pensamento Crítico de Walter da Silveira”, de acordo com segundo Cyntia Nogueira, foi “apresentar e contextualizar a ação e pensamento de Walter para a emergência de um cinema independente em Salvador e na Bahia nos anos 50”. O livro é dividido em cinco partes: Artigos do autor, Correspondências, Dossiê, Documentos e Fortuna Crítica. Em ‘Correspondência’, são trazidas cartas que Walter trocou com Alex Viany, Paulo Emílio e Glauber Rocha. O ‘Dossiê’ reúne seis artigos e resenhas inéditos sobre a ação e pensamento do crítico. Em ‘Documentos’, são mostradas algumas imagens do acervo fotográfico presente no Museu de Imprensa da ABI. ‘Fortuna Crítica’ apresenta artigos sobre Walter da Silveira escritos por importantes críticos brasileiros como Paulo Emílio Sales Gomes, Alex Viany, B. J. Duarte e Octávio de Farias. 

Hoje, a ABI detém a maior parcela do acervo total original de Walter da Silveira, acondicionados no Museu de Imprensa e na Biblioteca Jorge Calmon. São cerca de 2000 livros na biblioteca e 13 caixas de documentos e fotografias no museu. 

Ernesto Marques destaca a necessidade de valorização da memória | Foto: Joseanne Guedes

Ernesto Marques, vice-presidente da ABI, destaca a importância do acervo e da contribuição da ABI na preservação desse material, e demonstra a sua preocupação com a memória da imprensa baiana. “A gente valoriza o gesto da família que doou e o trabalho – lento e caro – de restauração e conservação que tem sido feito pela ABI. Mostrar o livro que está no forno é mostrar o valor da nossa instituição, que cuida bem da memória. Não é para que [os documentos] fiquem apenas bem conservados. É para que estes estejam acessíveis, numa condição de conforto e de segurança, para quem nos procura para realizar pesquisa histórica/ documental”, ressalta. 

Além do acervo disponível na ABI, a pesquisa financiada pelo Fundo de Cultura da Bahia contou com diversos arquivos de outras bibliotecas de Salvador e do Recôncavo, da Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-RJ) e da Cinemateca Brasileira. A historiadora Manuela Muniz participou da pesquisa de acervo junto com Cyntia e o designer Gil Maciel foi responsável pelo projeto gráfico e editorial. O projeto teve parceria da Editora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), da diretora Flávia Rosa e das revisoras Mariana Rios e Sandra Batista. 

Acervo

O acervo de Walter da Silveira passou por processos de restauração e higienização quando foi recebido pela Associação, em 2015. Segundo a museóloga da ABI, Renata Ramos, cerca da metade da documentação que seria destinada ao Museu de Imprensa  estava em bom estado de conservação. Entre os arquivos, estão fotos pessoais, de filmes nacionais e internacionais, alguns cartões postais, fotogramas, fotos de atores, manuscritos, cartas, agendas, recorte de jornais, e outros. De acordo com Ramos, a documentação foi analisada, verificada e acondicionada. “A memória de Walter agora está sendo preservada através do livro e não só através da documentação original”, pontuou.

Valésia Vitória examina obras do acervo de Walter da Silveira | Foto: Joseanne Guedes

Já a documentação que foi destinada à Biblioteca Jorge Calmon, estava bastante degradada, depois de décadas guardada no escritório montado num dos cômodos do amplo apartamento da família, no bairro da Graça, em Salvador. Grande parte do material composto por livros, revistas, catálogos, periódicos e enciclopédias apresentava desgastes do tempo, acidez, rasuras, insetos e fungos.

Os documentos doados passaram inicialmente por uma quarentena, com fungicidas e inseticidas. “O processo de quarentena evita que técnicos e pesquisadores adquiriram doenças de pele e outras alergias”, explica Valésia Vitória, bibliotecária da ABI. Em seguida, o material passou por uma higienização e, por último, foi registrado, catalogado, classificado e acondicionado. “Para a preservação da documentação é muito importante o tratamento de restauro e acondicionamento adequado. É um processo diário de análise, investigação, estudo, pesquisa”, acrescenta a bibliotecária. 

Todo o material danificado foi separado e enviado para Marilene Oliveira, técnica do Laboratório de Restauro e Conservação da ABI. A higienização geral é feita a cada três meses, quando é realizada a limpeza do espaço, das estantes, dos livros, tanto no museu e quanto na biblioteca.

Sobre Walter

Walter da Silveira (1915-1970) foi um dos mais importantes críticos e historiadores do cinema brasileiro, soteropolitano fomentador da cultura audiovisual baiana. Diplomado pela Faculdade de Direito da Bahia em 1935, foi advogado das causas populares, professor, crítico, ensaísta, historiador, pesquisador, cineclubista, ativo teórico do cinema e político.  Ele fundou o Clube de Cinema da Bahia (1950), além de ter organizado festivais de cinema e um curso de cinema em parceria com a Universidade Federal da Bahia (UFBA). 

Cyntia Nogueira destaca que “ele defendeu de forma precursora um projeto de emancipação político-econômica e artística para o cinema brasileiro”. Ela acrescenta que “suas reflexões sobre o papel e a função da crítica cinematográfica foram fundamentais para estimular a articulação entre crítica, teoria e realização de filmes”, avalia a professora.

Segundo o artigo “Walter da Silveira e o Clube de Cinema da Bahia”, de Thiago Barboza de Oliveira Coelho, as críticas de Silveira tendiam a ser interpretações das obras, e não julgamentos. Walter  produziu seu primeiro artigo sobre cinema aos vinte anos de idade, no jornal da Associação Universitária da Bahia, sob o título “O Novo Sentido da Arte de Chaplin”, uma reflexão crítica a respeito do filme “Tempos Modernos”. No final de sua vida, já havia escrito para mais de 30 jornais. Seu primeiro artigo de caráter historiográfico sobre o Clube de Cinema da Bahia publicado na Revista Recôncavo, em edição única de janeiro de 1953, está entre as publicações raras restauradas pela ABI.

*Rayssa Pio é estagiária da ABI, sob a supervisão de Joseanne Guedes.

 

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Agressões a profissionais da imprensa reforçam ameaças à democracia no Brasil

A ação violenta contra profissionais da imprensa durante ato pró-Bolsonaro, em Brasília, provocou repúdio de diversas instituições, que se posicionaram por meio de notas públicas e se preparam para protocolar representação junto ao Ministério Público Federal (MPF), para cobrar medidas efetivas. Para pesquisadores e entidades ligadas ao segmento da comunicação, a violência sofrida por repórteres em pleno Dia Mundial da Liberdade de Imprensa e a crescente agressividade contra comunicadores representam um risco ao regime democrático. Desde o início da pandemia do novo coronavírus, trabalhadores de diversos veículos têm sido atacados nas ruas ou tiveram coberturas inviabilizadas por cidadãos que, assim como o presidente, são contrários às medidas de isolamento social.

Na tarde de ontem (4), o procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitou a apuração das agressões ocorridas na Praça dos Três Poderes, durante a manifestação que pedia, entre outras bandeiras, o fechamento do Congresso e do STF (Supremo Tribunal Federal), o que é inconstitucional.

Orlando Brito (70), um dos fotojornalistas brasileiros mais conhecidos e premiados no país e no exterior, com 55 anos de atividade profissional, relatou o terror que passou ao lado do colega Dida Sampaio (Estadão), derrubado da rampa do Palácio do Planalto e alvo de socos e chutes. Assim como Orlando, o repórter Fabio Pupo, da Folha de S. Paulo, também foi agredido ao tentar defender Dida. O motorista do Estadão, Marcos Pereira, tomou uma rasteira. A equipe do Estadão e o jornalista Nivaldo Carboni, do site Poder 360, deixaram o local sob a escolta da Polícia Militar.

“Fui socorrer o Dida, que estava numa situação ruim, e naquela confusão um sujeito disse ‘olha, mais um jornalista aqui’. Eu tomei um soco, meus óculos voaram longe, ele pisou nos óculos. Quebraram a câmera e eu sem saber o que fazer. Ele chegou e disse ‘seu lixo’. Pela primeira vez na minha vida alguém me chamou de lixo”, afirmou o fotógrafo cujos principais trabalhos são imagens emblemáticas do regime militar, bastidores do Palácio do Planalto e flagrantes dos presidentes em situações não protocolares. “Eu consegui escapar, foi muito desagradável. Eu não sei onde esse camarada quer levar esse barco. Ele lá de cima, rindo daquelas agressões. Estou aqui, lambendo as minhas feridas”, finaliza Brito. (Confira a cobertura de Orlando Brito, para o site Os Divergentes aqui)

Ministros do Supremo, partidos políticos, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e entidades como a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), o Sinjorba (Sindicato dos Jornalistas Profissionais da Bahia), a Associação Nacional de Jornais (ANJ), a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) rechaçaram os ataques. Em nota, a direção do jornal O Estado de S. Paulo disse que “trata-se de uma agressão covarde contra o jornal, a imprensa e a democracia”.

“As agressões aos jornalistas orquestradas pelos seguidores do presidente da República refletem a incapacidade desse segmento político de conviver com a diversidade, a diferença de opinião e a liberdade de imprensa”, constatou Moacy Neves, presidente do Sinjorba. “Ao longo das últimas três décadas o Brasil amadureceu e não aceita mais regimes de exceção. A prova maior disso é que, um dia depois de mais um ataque à democracia, a aprovação do governo despencou para apenas 27%”, disse. O sindicato tem reiterado a importância do trabalho jornalístico, principalmente no contexto da Covid-19, quando os profissionais estão sofrendo ataques nas ruas durante as coberturas. “Enquanto a maioria está em isolamento social, os jornalistas – mesmo em condições precárias de segurança – trabalham para levar informação de qualidade a todos os cidadãos”, destaca.

O presidente da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), Walter Pinheiro, repudiou as agressões aos profissionais. “Infelizmente não são as primeiras que acontecem na atual quadra da vida brasileira, deixando todos aqueles que atuam na imprensa temerosos com o futuro da nossa democracia, pelos obstáculos que se põem à prática do jornalismo e, em especial, ao exercício da liberdade de expressão do pensamento. Que as investigações cheguem até os agressores, para que sejam devidamente punidos”, destacou o dirigente ao jornal Tribuna da Bahia. Em nota, a ABI diz que “a recorrência impune de agressões físicas que, em última análise, configura censura sumária com o recurso da violência física, nivela agentes públicos e políticos aos agressores em matéria de covardia e pouco apreço pela democracia”.

INSTITUIÇÕES REPUDIAM

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF) e a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) divulgaram nota conjunta em que exigem que as forças de segurança impeçam atos de violência contra os profissionais. “Esse tipo de atitude tem um perigoso sentido político, pois ajuda a engrossar o perverso e criminoso coro contra a liberdade de imprensa”, diz o texto.  As entidades também lembraram a ironia das agressões terem ocorrido no dia em que deveria ser celebrada a liberdade de imprensa e apontam a contribuição do presidente para o crescimento do clima hostil contra os profissionais da comunicação. “Reforçamos que toda essa violência é incentivada pelo presidente Jair Bolsonaro, que, segundo levantamento publicado neste domingo pela Fenaj, é o maior violador da liberdade de imprensa, com 179 agressões registradas somente nos quatro primeiros meses de 2020”.

A Associação Brasileira de Imprensa se solidarizou com os trabalhadores agredidos e chamou a atenção da sociedade brasileira para o que chamou de “perigosa escalada de agressividade dos seguidores do presidente” não apenas em relação a profissionais da imprensa como a autoridades e opositores. “Esses atos violentos são mais graves porque não já, de parte do presidente ou de autoridades do governo, qualquer condenação a eles. Pelo contrário, o próprio presidente e seus ministros que incentivam as agressões contra a imprensa e seus profissionais”, afirmou a ABI.

Para a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), “diante do comportamento irresponsável do presidente da república, que dissimula o necessário isolamento das pessoas para conter a propagação do vírus, uma imprensa que mostre a real situação do país é ainda mais necessária”. A Associação refere-se a Jair Bolsonaro como “inimigo da imprensa” e lembra que, segundo levantamento da Fenaj, ele sozinho proferiu 179 ataques aos jornalistas nos quatro primeiros meses deste ano. “A liberdade de imprensa é necessidade vital numa democracia, que só pode existir se houver liberdade de informação e espaço para a difusão das mais variadas opiniões, agradem estas ou não aos governos de plantão”, afirma a nota da entidade em comemoração à data.

“POSSÍVEIS INFILTRADOS”

Contrariando o relato de Orlando Brito, o presidente Jair Bolsonaro afirmou em uma publicação nas redes sociais nesta segunda-feira (4) não ter visto as agressões aos profissionais da imprensa e atribuiu a autoria a “possíveis infiltrados” na manifestação. Ele disse condenar a violência. “Também condenamos a violência. Contudo, não vi tal ato, pois estava nos limites do Palácio do Planalto e apenas assisti a alegria de um povo que, espontaneamente, defendia um governo eleito, a democracia e a liberdade”, declarou.

Bolsonaro comparou a agressão aos profissionais de imprensa com a situação de pessoas que estão sendo abordadas por forças policiais por descumprirem o distanciamento social. “Até agora não vi, em dias anteriores a TV Globo sair em defesa de uma senhora e filha que foram colocadas à força dentro de um camburão por estarem nadando em Copacabana, outra ser algemada por estar numa praça em Araraquara/SP ou um trabalhador também ser algemado e conduzido brutalmente para uma DP no Piauí”, afirmou.

Durante a manifestação que pedia intervenção militar e atacava o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF), o chefe do Executivo disse aos apoiadores que não haverá interferência no governo e afirmou que “a paciência acabou”. Desde que o ministro do STF, Alexandre de Moraes, suspendeu a nomeação de Alexandre Ramagem para a direção da Polícia Federal (PF), Bolsonaro tem se queixado de supostas interferências.

Para a ministra Cármen Lúcia, “é inaceitável, é inexplicável que, no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, ainda tenhamos cidadãos que não entenderam que o papel da imprensa é que permite a nós sermos livres e que garante a liberdade de expressão, sem a qual não há dignidade”, afirmou, durante evento virtual sobre a liberdade de imprensa, organizado pelo Instituto do Direito Público. O debate homenageou os profissionais agredidos no mesmo dia. “Quem gosta de ditadura gosta de silêncio. A democracia é plural, traz os ruídos que a democracia enseja. O que vemos no Brasil é agressão a jornalistas porque eles oferecem as informações. Não estou falando de nenhuma ideologia. Quando um jornalista é agredido, é a democracia que é agredida”, defendeu Cármen Lúcia.

JORNALISMO É ESSENCIAL

Por iniciativa da Organização das Nações Unidas (ONU), este ano o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa adotou o tema “Jornalismo sem medo ou pavor”, em uma referência ao papel desempenhado pela imprensa no combate à pandemia da Covid-19. De acordo com reportagem da Agência Brasil, o secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou que o jornalismo é essencial para ajudar a neutralizar os danos causados pelo que classifica como “pandemia da desinformação”. Em um vídeo veiculado no Twitter, por ocasião do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, Guterres defendeu o segmento, destacando-o como crucial para a tomada de “decisões fundamentadas”, no âmbito do combate ao novo coronavírus.

Segundo ele a desinformação generalizada tem abrangido “desde conselhos prejudiciais à saúde até ferozes teorias de conspiração”. Ele avalia que, apesar das “notícias e análises verificadas, científicas e baseadas em fatos”, que fazem com que a imprensa desempenhe um papel imprescindível na atualidade, os jornalistas têm sofrido cerceamento no exercício de suas funções. “Desde que a pandemia começou, muitos jornalistas estão sendo submetidos a mais restrições e punições, simplesmente por fazerem seu trabalho”, pontuou.

Guterres dirigiu um chamamento às autoridades governamentais e à sociedade como um todo, fazendo um apelo para que garantam que a imprensa possa desenvolver suas atividades livremente. As medidas de isolamento social e quarentena, acrescentou, não devem ser usadas como pretexto para limitar o trabalho dos profissionais da categoria.

“Hoje, agradecemos à mídia por fornecer fatos e análises, por responsabilizar os líderes, em todos os setores, e por falar a verdade ao poder. Reconhecemos, particularmente, aqueles que estão desempenhando um papel que salva vidas ao dar relatos sobre a saúde pública. E apelamos aos governos para proteger os trabalhadores da mídia e fortalecer e manter a liberdade de imprensa, essencial para um futuro de paz, justiça e direitos humanos para todos”, finalizou Guterres.

*Com informações do Estadão e da Agência Brasil.

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Nota: ABI repudia violência contra profissionais da comunicação

A Associação Bahiana de Imprensa – ABI reitera sua posição de absoluto repúdio a toda e qualquer forma de violência contra quaisquer profissionais ou veículos de comunicação. Preocupada com a crescente onda de intolerância contra equipes de reportagem na cobertura da pandemia que ora nos infelicita, assim como em eventos políticos, a ABI traz a público a cobrança de medidas efetivas, por parte das autoridades policiais e do Ministério Público, no sentido de identificar, através de investigação regular, indiciar e oferecer denúncias à Justiça. É o esperado, antes que se consume ato irreparável contra a vida de profissionais a serviço da informação essencial ao enfrentamento à pandemia e à busca constante de respostas para os grandes problemas nacionais. Respostas que não se pode encontrar em ambiente que não esteja plenamente arejado pelas liberdades democráticas.

Os atos violentos praticados por manifestantes na Praça dos Três Poderes, na capital federal, envergonham o Brasil internacionalmente em pleno Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Sobre eles, não cabe qualquer relativização. Já são suficientemente gravosos, os ataques e ameaças pela internet e tentativas de linchamentos virtuais – até aqui tolerados no limite da desídia pelas autoridades em todos os níveis. A recorrência impune de agressões físicas que, em última análise, configura censura sumária com o recurso da violência física, nivela agentes públicos e políticos aos agressores em matéria de covardia e pouco apreço pela democracia.

 

Walter Pinheiro – Presidente da ABI

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