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As mães do Cabula, na Bahia: à procura de resposta por seus mortos

DEU NO EL País – Salvador estava menos abafada do que de costume naquela tarde no fim de abril. Com períodos intercalados de sol, havia chovido desde o meio-dia, o que para Marina de Oliveira era mais preocupação que alívio. “Deixa eu ver se entrou água dentro da casa”, disse ela, que cumprimentou rapidamente os presentes e sumiu no meio das casas na Vila Moisés, na zona do Cabula, na capital baiana. Quando voltou, a costureira de 57 anos explicou que a chuva não fizera estragos e que os netos, de 10 e 13 anos, estavam bem. A segurança de Nailson e Naiara é uma obsessão desde que outro neto, Natanael, foi morto, aos 17 anos, em uma controversa ação da Polícia Militar baiana, que deixou 12 mortos e cinco feridos em fevereiro. Todos com idade entre 16 e 26 anos, por tiros da polícia.

“Que polícia é essa que quebra o braço a ponto de estufar o osso para fora?”, conta ela, de cabelos presos num coque simples e óculos de grau. Agita-se, se põe de pé. Só desacelera o ritmo das palavras quando soluça, no meio do choro. Marina conta que, na noite de 5 de fevereiro, o neto saiu de casa dizendo que ia comprar uma pizza e encontrar Simone, a namorada. Nunca mais voltou. Quando viu de novo o menino, que criou desde os 13 dias de vida, foi numa foto do Instituto Médico Legal, no celular de uma conhecida. “Ele estava com uma bermuda azul, que foi até eu que fiz. Foi por causa disso que reconheci ele, por causa da etiqueta da Mido que eu coloquei”, diz ela, que viu Natanael “jogado como um cachorro”, com um osso do braço exposto, cercado de corpos no centro forense. “Aí eu não vi mais nada. Endoidei, comecei a gritar…”.

Inquérito da PM fala em “confronto”

Nesta quarta-feira se completam três meses da morte de Natanael e outros 11 no Cabula. O saldo de corpos, às vésperas do Carnaval, as diversas marcas de tiros e lesões, o protesto imediato dos parentes, que contestaram a versão da polícia – que falou em “confronto” com supostos criminosos que planejavam um assalto a banco, num primeiro momento – e as desastrosas declarações feitas pelo governador baiano, Rui Costa (PT), trouxeram holofotes para o caso. Horas depois das mortes, Costa comparou os policiais a “artilheiros” que, em “frente a um gol”, têm poucos segundos para decidir como agir. A metáfora futebolística chocou ativistas e parentes das vítimas num Estado onde a violência policial ganha manchetes frequentes. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 11.197 pessoas foram mortas pela polícia brasileira, nos últimos cinco anos. A PM da Bahia ocupa o terceiro lugar neste ranking (com ao menos 234 mortes causadas em “confronto” em 2013, segundo o Anuário, embora a Secretaria de Segurança fale em apenas 13). Chama a atenção os episódios envolvendo a Rondesp, as rondas especiais que se inspiram na Rota, a unidade especial da Polícia de São Paulo famosa pela violência.

A Anistia Internacional lançou nota, citando “indícios de execução”, com base em depoimentos que colheu. O movimento Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta, que defende direitos dos negros, também protestou contra o governador. Pediu proteção às testemunhas do crime e ajudou a articular manifestações pelos 12 do Cabula, que julgam terem sido mortos numa chacina. “Foi a banalidade do mal. A vida que não tem o menor valor de pessoas pretas que podem ser mortas porque ninguém reclama”, diz Hamilton Borges, do Reaja.

Uma semana após os assassinatos, houve uma marcha na Vila Moisés, que foi acompanhada por um integrante da Anistia Internacional. “A manifestação foi escoltada pela polícia militar que, durante vários momentos, intimidou participantes, inclusive o nosso representante”, diz Renata Neder, da Anistia. “Segundo informações recebidas, desde aquele dia têm sido frequentes no local operações policiais de caráter intimidador, fazendo com que os moradores se sintam ameaçados”, segue ela. Causa especial angústia nos parentes das vítimas o fato de os policiais acusados seguirem trabalhando normalmente, inclusive na zona. “Todos estão tendo acompanhamento psicológico, mas continuam trabalhando, até porque as investigações continuam e nada foi provado contra eles”, respondeu, ao EL PAÍS, a Secretaria de Segurança da Bahia.

O maior problema do quadro, também relatado por Hamilton Borges, é que, na avaliação da Anistia, ele contamina as investigações. Desde as mortes do Cabula, três diferentes procedimentos investigativos foram instalados. Um Inquérito Policial Militar, no âmbito da corregedoria da PM, uma investigação na Polícia Civil, e um Procedimento Investigativo Criminal, posto em marcha a pedido do Ministério Público do Estado da Bahia.

Conforme este jornal apurou, o inquérito da PM encaminhado à Promotoria Militar vai sustentar que houve, sim, confronto entre os policiais e os os mortos em Cabula. A polícia e a Secretaria de Segurança já haviam citado, antes, a apreensão de armas e de emulsão para explosivos para corroborar a hipótese de que o grupo, estimado em 30 pelos policiais, resistiu armado quando viu seu plano de assaltar um banco ser desbaratado. Contra a versão, os parentes dos mortos e ativistas dizem que o saldo macabro da ação – 12 mortos e cinco feridos contra apenas um policial foi atingido por uma bala, de raspão – é um dado eloquente, ao lado de laudos de autópsia publicados pelo jornal Correio de Bahia. Segundo o jornal, a maioria das vítimas foi atingida por mais de cinco tiros, alguns deles de cima para baixo, o que configuraria execução.

Além disso, alguns mortos estariam com perfurações nas palmas da mãos, braços e antebraços, sendo que apenas quatro baleados tinham vestígios de pólvora nas mãos. Os laudos também apontam que a maioria apresentava pelo menos cinco marcas de tiros — alguns deles disparados a curta distância, de menos de 1,5 m. Uma fonte ligada à investigação do caso afirmou ao Correio que disparos desse tipo indicam que as vítimas foram mortas em posição de defesa e indica que há “sinais evidentes de execução”. “Sustentarão a tese do confronto como, de resto, todas (as polícias) sustentam em episódios semelhantes, embora laudos, as testemunhas e as biografias das vítimas digam o contrário”, protesta o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que diz que é preciso discutir para as mortes de Cabula para “descentralizar a atenção” das violações de direitos humanos do eixo Rio-São Paulo.

A esperança dos parentes das vítimas e ativistas, agora, é que o Ministério Público contrarie a PM e indicie os policiais envolvidos. “Pode ter certeza que a sociedade vai ter uma resposta”, diz o promotor Davi Gallo, coordenado do grupo designado pela Promotoria estadual para investigar o caso. As conclusões do grupo, um tomo de mais de 200 páginas, foi entregue nesta semana ao procurador-geral de Justiça, Márcio Fahel, que solicitou a investigação. “A última palavra é do Ministério Público e a sociedade pode ter certeza de que terá uma resposta adequada”, afirma Gallo. “Supõe-se que a maioria deles estavam ali fazendo tráfico de entorpecentes”, segue o promotor, em aparente choque com a versão primeira da polícia, sobre preparação para assalto a banco. Gallo diz ter “implorado”, sem sucesso, para ter depoimentos de testemunhas e atribui o fato, também, a uma pressão dos narcotraficantes na zona. “O crime, com farda ou sem farda, toma conta da sociedade”, conclui.

Morto duas vezes

“Se a polícia disser que meu filho era traficante, eu vou xingar de Dilma ao vereador. Eu vou exigir provas”, revolta-se Marina, a mãe-avó de Natanael. “Nem que eu tome um tiro. Mesmo que eles estivessem fazendo coisa errada, eles não tinham direito de fazer o que fizeram”, rebate. Ao contrário de Marina, Adelaide, uma aposentada de 54 anos, tem um fio de voz e se move pouco. Chora baixo enquanto fala do filho de 26 anos morto na ação policial do Cabula. Prefere nome fictício e teme pelo filho mais velho. “Passei o dia com dor de cabeça só de pensar que mudaram os lugares que os ônibus param”, se angustia. Mas, como Marina, não está disposta a ver a versão da polícia prevalecer. “A forma que eles colocaram, dizer que eram assaltante de banco…”, comenta, sobre as acusações da polícia. “Achei que eles tiraram a vida do meu filho duas vezes. Fica difamado.”

Para Adelaide, viver naquela zona do Cabula é esperar batida da polícia. “Chegam chamando de tudo quanto é nome, atirando. Um dia meu cunhado estava na varanda enquanto minha irmã costurava umas bolsas de uma encomenda. Teve que deitar no chão para sair dos tiros.” Ela não consegue esquecer como ficou o corpo do filho, que havia saído, há pouco, de um emprego em uma empresa transportadora.

Marina diz que só esquece de Natanael quando está concentrada para fazer os moldes da costura: “É a crueldade que mais me dói. Minhas noites são perdidas de sono. Durante o dia, eu não estou lembrando dele porque eu não tenho espaço. Eu faço mostruário. Eu faço a primeira peça para ir por corte, então não tenho tempo de lembrar de nada. Nem da casa eu lembro. Então, quando dá meio dia, eu lembro do que ele comia… É tanto que não estou nem fazendo nada que ele comia para a gente comer. Nada. Faço tudo ao contrário, para não lembrar. Aí eu penso nele: será que ele já comeu?”

*Texto de FLÁVIA MARREIRO, originalmente publicado pelo jornal El País em 7 de maio de 2015.

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Manifestação de professores em Curitiba tem confronto com a PM, bombas e agressão

Deu em O Globo – Em pouco mais de uma hora de confronto, 213 pessoas, segundo a prefeitura de Curitiba, ficaram feridas num protesto de professores em greve que terminou em confronto com a polícia, em frente à Assembleia Legislativa do Paraná (Alep). Segundo o serviço médico municipal, oito manifestantes — três com traumatismo craniano — foram levados a hospitais em estado grave. O governo paranaense, porém, fez à noite outro balanço: 40 manifestantes e 22 policiais feridos. A PM informou que sete manifestantes foram presos.

A confusão começou no início da tarde desta quarta-feira, após um grupo de professores tentar invadir a Alep, no momento em que começaria a votação de uma lei que muda as regras da previdência social do funcionalismo público. A greve dos professores começou em fevereiro e durou até o fim de março. No sábado, a categoria retomou a paralisação. Assim que derrubaram as grades, os manifestantes foram contidos com tiros de bala de borracha e jatos d´água. Cerca de 20 mil pessoas participavam do ato, segundo os organizadores. A polícia não contabilizou. Nos arredores do Centro Cívico, onde aconteceu o confronto, uma creche foi fechada, e as crianças, dispensadas.

Em meio ao avanço da polícia, os manifestantes reagiam jogando pedras e pedaços de pau. Equipados com capacetes, cassetetes e escudos, os soldados também avançaram sobre os jornalistas. Um cachorro pitbull da Polícia Militar mordeu um repórter cinematográfico da TV Bandeirantes. Ele foi levado em estado grave para uma ambulância do Samu e passaria ainda ontem por uma cirurgia. Uma equipe de TV foi afastada da área do conflito com jatos de água. Os profissionais foram derrubados no chão com o impacto. Um jornalista da CATVE foi ferido por uma bala de borracha no rosto, segundo testemunhas. Imagens gravadas no local mostram policiais chutando manifestantes que já estavam rendidos, sentados no chão.

A tentativa dos professores de impedir a votação da lei foi inócua. O projeto foi aprovado no início da noite, em segundo turno, com 30 votos favoráveis e 21 contrários. Os parlamentares chegaram a fechar a sessão por causa da confusão, mas abriram uma extraordinária e aprovaram as mudanças da regra previdenciária. O projeto vai para a sanção do governador Beto Richa (PSDB). Em meio a uma crise financeira, o governador enviou à Alep proposta que muda as regras de pagamentos do fundo de previdências estadual, a Paraná Previdência. O projeto propõe que 33 mil beneficiários com 73 anos ou mais sejam transferidos do Fundo Financeiro, mantido pelo Tesouro estadual, para o Fundo Previdenciário, bancado por contribuições dos servidores e do poder público. Assim, o governo deixa de pagar sozinho essas aposentadorias e divide a conta com os servidores.

Os servidores são contra a medida. Alegam que a mudança comprometeria a saúde financeira da Paraná Previdência. O governo nega e argumenta que o estado continuará arcando, mensalmente, com R$ 380 milhões para os benefícios de servidores civis e militares. Em razão da proposta, os professores, uma das categorias atingidas pela mudança, iniciaram nova greve. A Justiça determinou o retorno às atividades, mas os profissionais alegam que não foram notificados. Assim que a presidência da Alep anunciou que votaria a proposta esta semana, os servidores convocaram manifestação. O prédio da Assembleia estava cercado desde sábado por 2 mil policiais. Antes mesmo do protesto pela mudança na previdência, os professores já reivindicavam um aumento de 13,01%, conforme o piso nacional.

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ABI BAHIANA Notícias

ABI se solidariza com diretor da instituição agredido por PMs em Cachoeira

Mais um caso de violência policial reforça o grave cenário de abusos e violações aos direitos humanos na Bahia e reacende o debate sobre os limites para o uso da força militar nas abordagens. Durante a reunião da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), realizada na manhã desta quarta-feira (11), um dos diretores da entidade, o jornalista e advogado Romário Costa Gomes, relatou ter sido brutalmente agredido por policiais militares, no último dia 16 de fevereiro, na cidade de Cachoeira, no Recôncavo Baiano. Com a presença dos diretores, o presidente da ABI-Bahia, Walter Pinheiro, prestou solidariedade ao colega. Uma representação preparada por três advogados será protocolada na Corregedoria da Polícia Militar, na Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia e na Secretaria de Comunicação Social do Estado da Bahia. O documento será encaminhado à ABI-Bahia, à Ordem dos Advogados do Brasil Seção Bahia (OAB-BA) e ao Sindicato dos Jornalistas do Estado da Bahia (Sinjorba), para que estas instituições dirijam-se diretamente ao Governo do Estado, para cobrar responsabilização e punição dos agressores.

Segundo a ‘Guia para Exame Médico-Legal’, requerido pela Delegacia Territorial de Cachoeira, o advogado alega que foi agredido fisicamente pelo 1º Sgt. Elinaldo de Souza Bonfim e pelo soldado Jackson dos Santos Souza, quando abordado no centro da cidade, acusado de estar obstruindo o trânsito. Romário Gomes, que alegou não usar drogas e não estar sob efeito de substância entorpecente, foi acusado de desacatar os policiais envolvidos na operação, da qual participou também o soldado Edson dos Santos Leal. O relatório assinado pelo médico clínico da Santa Casa de São Félix, Zacarias dos Apóstolos, atesta que Romário Gomes apresentava escoriações e hematomas no antebraço e punho, nas mãos e cotovelos.

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“Eu trafegava numa ladeira, em Cachoeira, que dá acesso uma avenida à beira rio. Reduzi a velocidade para cumprimentar duas pessoas e deixá-las atravessar a rua, quando surgiu uma viatura ao meu lado, impedindo o acesso de quem estava do sentido contrário. O sargento chamou a minha atenção ‘para que não obstruísse a via’. Eu respondi que estava em movimento lento, mas quem estava obstruindo a passagem era a viatura policial, por estar na contramão. Mas eles são ousados e prepotentes, não admitem que apontemos seus erros. O sargento, transtornado, com olhos esbugalhados e avermelhados, passou a desferir palavras de baixo calão e determinou que eu parasse o veículo e abandonasse a direção: ‘Pare essa p**** desse carro ali na frente!’. Como me recusei e segui, fui perseguido pela viatura. Parei 50m depois, ao perceber que eles faziam zig-zag na pista para eu bater o carro. Fui obrigado a deixar o carro, já que abordado pelos soldados, que empunhavam três metralhadoras. Ordenaram que eu levantasse as mãos e as pusesse em cima do carro, abrisse as pernas e braços. Eu não entendi e não atendi. Fui chutado violentamente nas duas pernas pelo policial Santos Souza, mesmo já tendo me identificado como advogado e jornalista”, relata Gomes.

Humilhação

De acordo com o jornalista, durante a abordagem, populares protestavam contra os policiais, afirmando se tratar de um cidadão considerado e prestigiado por toda a cidade, mas não adiantou e o sargento ainda apontou a metralhadora para os cidadãos. “Dei a carteira da OAB e da ABI, alertei que ele estava falando com um advogado e jornalista. Ele desdenhou afirmando que ‘aquilo não valia nada’. Após a abordagem, fui algemado com as mãos para trás e jogado de forma brusca no camburão da viatura, onde permaneci por cerca de uma hora, em frente à Delegacia de Cachoeira até ser conduzido para a Delegacia de Maragogipe.

Ao sair da Delegacia de Cachoeira, o sargento retirou as algemas da vítima, afirmando se tratar de um ‘favor’. “Quando aleguei ser uma pessoa idosa, ele respondeu com mais violência e desrespeito: ‘Idoso tem que se f****!’. Então, repeti que ele estava falando com um jornalista e advogado. Ele respondeu que ‘jornalista, advogado, juiz, promotor, para ele, não valiam nada”. Até hoje tenho dificuldades em fazer alguns movimentos com as mãos, além de escoriações nas pernas, causadas pelos coturnos dos policiais. Foram muitos os prejuízos”. Durante o trajeto, o veículo da vítima ainda permaneceu na mão do sargento Elinaldo, que não teria pedido permissão para dirigi-lo e vistoriá-lo sem a presença de seu proprietário.

“Quando o delegado solicitou ao soldado Santos Souza que trouxesse a documentação do carro, fiquei surpreso ao perceber a rapidez com que achou, dando a entender que já havia revirado o interior do veículo. Um fato que chama atenção no Auto de Entrega emitido pela Delegacia Territorial de Maragogipe é a discrepância entre a quantia em espécie entregue à unidade pelos policiais e o valor alegado pela vítima. Segundo Romário, entre seus pertences no carro apreendido, havia novecentos reais (em nove cédulas de R$100) que desapareceram, além de moedas de R$1 e cédulas de R$2 que totalizavam R$ 152, único valor devolvido pela polícia.

No dia seguinte à agressão, Romário Gomes procurou o Departamento de Polícia Técnica de Santo Amaro, que estava fechado, uma vez que os profissionais estavam à disposição do Carnaval de Salvador. No dia 18 de fevereiro, o jornalista conseguiu realizar o exame de corpo de delito em Santo Amaro, depois de três tentativas.

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Debate racial tenso marca audiência da OAB-BA sobre ação da PM no Cabula

O clima era de tensão e intolerância às divergências discursivas durante a audiência pública realizada ontem (26) pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Bahia (OAB-BA), com o objetivo de discutir a ação das Rondas Especiais (Rondesp) no Cabula, no último dia 6 de fevereiro, e os limites para o uso da força militar. Com ânimos exaltados e discussões acaloradas, policiais defenderam seus colegas, enquanto integrantes de movimentos sociais rebatiam e denunciavam estar sofrendo ameaças por e-mail, que seriam motivadas pelos protestos exigindo celeridade nas investigações. “Isso não pode continuar assim. A vida da gente tem que ter valor. Não pode apenas a palavra do policial que foi para o confronto afirmar que eram bandidos e constar como comprovado. Tem que apurar. O Governo acha que nossa vida está em jogo. Rui (Costa) trata sua policia genocida como artilheiro num jogo de futebol. Tirar nossas vidas não é um gol de placa, como ele classificou”, afirmou Hamilton Borges, membro da campanha “Reaja ou Será Morto – Reaja ou Será Morta”.

Protestos_Reprodução rede bahia“Povo negro unido, povo negro forte, que não teme a luta, que não teme a morte”. Esse foi o grito entoado pela multidão que lotou o auditório da Ordem baiana. A sessão marcada por intenso debate racial estava prevista para começar às 9h, mas teve início com cerca de uma hora de atraso por causa da falta de espaço e dos confrontos entre integrantes de movimentos sociais e policiais, estes acusados de estarem armados no local. Embora o tema fosse a ação que deixou 12 mortos e três feridos no Cabula (incluindo um policial), a principal discussão foi a necessidade de políticas públicas voltadas para a reparação e garantia dos direitos dos afrodescendentes.

Apesar dos protestos e pedidos de adiamento, o presidente da OAB-BA, Luiz Viana Queiroz, manteve a sessão e se comprometeu a realizar uma segunda audiência sobre o tema, em um espaço que comporte as centenas de pessoas que se espremiam no auditório com capacidade apenas para 150. O dirigente anunciou que a entidade vai acompanhar as investigações das 12 mortes da Estrada das Barreiras, por meio de uma comissão. Disse, ainda, lamentar a ausência do secretário de Segurança Pública do Estado da Bahia, Maurício Barbosa e do comandante-geral da PM, Ancelmo Brandão, ambos convidados pela Ordem baiana à audiência solicitada pelo movimento Reaja ou Será Morto – Reaja ou Será Morta.

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“A OAB está ao lado de todos os que defendem os direitos humanos. Nós não estamos acusando ninguém, apenas exigimos que o governo apure o que aconteceu para que não pairem dúvidas. Temos um saldo muito positivo. Uma audiência extensa e profunda, com posições divergentes e, em alguns momentos, conflituosas, o que demonstra que há um anseio pela discussão, seja sobre o caso do Cabula, seja sobre a política de segurança pública para a Bahia. Eu saio daqui convencido de que temos ainda um caminho longo, que vai se desdobrar em outras audiências públicas, em reunião com o governador e a indicação de uma comissão para acompanhar as investigações”, disse Luiz Viana.

Público-Reprodução rede bahia
A sessão foi interrompida diversas vezes por conflitos entre policiais e integrantes de movimentos sociais – Foto: Reprodução/Rede Bahia

O presidente da Associação de Praças da PM, Sgt. Roque Santos, afirmou que os policiais estão sendo injustiçados e classificou a audiência como “positiva” pela oportunidade de expor o lado da polícia. “Só podemos ter um posicionamento sobre a ação do Cabula depois das investigações. A sociedade não pode condenar todos os policiais militares por causa desse episódio. Somos negros, pobres, da periferia e estamos do lado do movimento negro, mas também vimos aqui para mostrar que é o policial quem está no combate, é quem recebe os tiros. Nós não somos executores, somos protetores da vida”.

Entre as principais propostas apresentadas pelo público estão a reestruturação da Segurança Pública, a aprovação da PEC que extingue os altos de resistência e a federalização de crimes cometidos pela polícia. Após intensos debates, Luiz Viana assegurou a realização de duas audiências públicas: uma para discutir a morte e segurança de policiais militares e outra para discutir os limites do poder de Polícia Militar. O gestor da OAB-BA também pediu para que a população enviasse sugestões objetivas ao e-mail da Comissão de Direitos Humanos da Ordem ([email protected]). Luiz Viana afirmou que levará todas as solicitações dos movimentos sociais para o governador, como dar maior transparência às investigações e garantir que todo processo respeite os princípios da legalidade.

O secretário da Justiça e Direitos Humanos, Geraldo Reis, afirmou que já está agendada uma reunião com o governador Rui Costa para tratar das investigações das mortes durante a operação. Entretanto, ainda não há datas fixadas. Participaram do debate movimentos sociais, representantes de associações de policiais, o diretor da Associação Bahiana de Imprensa (ABI) Romário Gomes, além de vereadores, do ex- deputado Capitão Tadeu e secretário de Promoção da Igualdade. Estiveram presentes também o vice-presidente da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), Ernesto Marques, e o diretor Luis Guilherme Pontes Tavares.

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