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“Eu sou Dandara Barreto, mulher, jornalista e medo não faz parte do meu ofício”

Há um ano, a jornalista feirense Dandara Barreto, 36 anos, começava a conviver com o pânico. Como boa jornalista, ela havia conferido um tom local para a cobertura dos ataques aos poderes no dia 8 de janeiro, em Brasília. Passou, então, a receber recados ameaçadores, soube que informações pessoais suas circulavam e eram conhecidas de pessoas mencionadas naquela cobertura e, o mais grave, descobriu o plano de forjar um latrocínio (roubo seguido de morte) contra ela. “Eles diziam ‘não vai dar em nada’”, lembra Dandara. 

A violência contra jornalistas que marcou a tentativa de golpe, com pelo menos 14 jornalistas agredidos por bolsonaristas durante a cobertura in loco daquele dia, alastrava-se pelo país e ganhava outras nuances. Para Dandara, chegou sob a forma de críticas a suas postagens nas redes sociais, seguidas de ameaças e intimidação com processos judiciais. 

‘Não me paralisa’
Na segunda-feira (08), ela contou publicamente pela primeira vez o que viveu no ano passado em um desabafo durante o programa que apresenta ao lado de Elsimar Pondé, na Rádio TransBrasil Feira. “Não foi uma fala planejada, meu coração batia na garganta porque é mexer em uma situação emocional que ainda mexe muito comigo. Não me assusta, não me paralisa mais, mas ainda mexe comigo. [Ao falar na rádio], eu entendi como um encerramento de um ciclo”, conta Dandara. 

Depois, ela reproduziu o vídeo da declaração na rádio em sua página no Instagram. Momentos depois, gelou novamente e arquivou a publicação com medo, mas voltou atrás e a manteve. “O pessoal do Sinjorba falou comigo me dando apoio, me encorajando a desarquivar. Não podemos baixar a cabeça, mas foi algo muito grave”, justifica. 

Antes, por recomendações da Secretaria de Segurança Pública da Bahia, que acompanhou o caso através do próprio titular da pasta, Marcelo Werner, Dandara havia feito uma postagem em que relatava superficialmente a ameaça, como forma de se proteger. “Eu, que não sou de meias palavras, me utilizarei delas (por segurança) para deixar registrado aquilo que de alguma maneira, me ameaça, ainda que de maneira velada”, escreveu a jornalista em uma publicação que mantém fixada em seu perfil. “Ouvi dizer que mexi com o nicho de pessoas erradas”. 

‘Eu pirei’
O resultado de todos os ataques foi uma crise de pânico que chegou a exigir, por recomendação médica, um período de afastamento do trabalho. Dandara havia iniciado o ano com a notícia de uma gravidez, que foi interrompida. “Coincidência ou não, semanas depois, perdi o bebê”, lembra. 

“Eu estava com os meus hormônios alterados, diante de uma situação, jamais vivida, com meu avô também no leito de morte… Então, assim, emocionalmente eu estava fragilizadíssima. E aí eu pirei, pirei.” 

Dandara buscou apoio médico e psicológico. Sentia fisicamente as ameaças.  

“Eu sentia cheiro de sangue. Eu entrava no carro e eu me deitava no banco de trás com medo que, quando eu estivesse no carro, tivesse algum atentado e meu filho estivesse comigo. Mas, graças a Deus, antes do fim do ano eu já estava bem”, lembra. 

‘Disseram: chegou a hora de lhe calar’
A cobertura e os comentários que Dandara fez nas rádios e o no perfil no Instagram, que utiliza para divulgar seu trabalho, sobre o 8 de janeiro de 2023 foram baseados em informações públicas, conteúdo das redes sociais (como a página Contragolpe Brasil) e a partir de apurações de veículos nacionais. Ela detalha que, sempre que precisou, corrigiu de modo contextualizado informações imprecisas que havia veiculado no calor da cobertura. 

“Todos os programas estão gravados, tudo o que a gente fez ou disse está aí para provar que o limite ético não foi ultrapassado”, comentou. Além da própria Dandara, a equipe se sentiu intimidada e passou a “pisar em ovos” na cobertura sobre os atos antidemocráticos. 

‘Experiências amarguinhas’
Graduada em jornalismo há 10 anos, Dandara já trabalhou na produção da TV Subaé (Rede Bahia), no Blog do Velame, na Rádio Sociedade de Feira de Santana e na atual Rádio Mix FM. Há seis anos, coordena o jornalismo do Grupo Lomes de Comunicação, que tem 14 rádios com atuação na Bahia e em Sergipe. Ancora os programas Transnotícias  (Rádio TransBrasil Feira, com Elsimar Pondé), e o Jornal da Manhã (Jovem Pan Feira de Santana, com Adilson Muritiba)  

Dandara conta que até as ameaças de morte por bolsonaristas, o machismo era a única coisa que dificultava seu trabalho.  “Eu tive algumas experiências bem amarguinhas de as pessoas não me entenderem como uma mulher jovem que chefia o jornalismo de um grupo tão grande. Ouvi insinuações de ‘teste do sofá’ por parte de colegas ao se incomodar com uma crítica minha. Já vi um vereador dedicar 30 minutos na tribuna da Câmara para falar que eu era uma mera assessora do meu colega de trabalho, que é âncora também como eu”, lembra Dandara. 

Em 2021, Dandara também foi alvo de ataques à sua reputação após uma reportagem sobre crime de pedofilia. “Mas nem de longe eu me senti ameaçada antes disso, mesmo denunciando casos de corrupção”, compara.

Rede Agostinho Muniz 
O Sinjorba informou que passou a acompanhar o caso de Dandara e que ele será incluído no Relatório da Violência da Fenaj e acompanhado pela Rede Agostinho Muniz Filho de Combate à Violência Contra a Imprensa. A rede é formada por órgãos de segurança pública, do sistema jurídico e por empresas de mídia e discute estratégias para conter a escalada de ataques que coloca o Brasil entre os países mais inseguros para o trabalho jornalístico. Além da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), estão entre os integrantes da rede o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado da Bahia (Sinjorba), a Ordem dos Advogados do Brasil Seção Bahia (OAB-BA), as polícias Civil e Militar, a Secretaria da Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP-BA) e a Guarda Civil Municipal de Salvador (GCM/SSA). Jornalistas que se sintam ameaçados podem contactar a rede através do email [email protected]

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ABI BAHIANA

Nota de Solidariedade à jornalista Cintia Kelly


A Associação Bahiana de Imprensa vem a público prestar solidariedade à jornalista Cintia Kelly, alvo de tratamento hostil por parte do governador Jerônimo Rodrigues, durante entrevista coletiva, nesta quinta-feira (21).

Fiel à defesa do jornalismo ético e responsável, a ABI lamenta que atos dessa natureza, frequentemente associados a políticos de extrema-direita, sejam reproduzidos por representantes de alas mais progressistas.

É dever do jornalista fazer perguntas, por mais incômodas que possam parecer. À fonte, cabe responder ou não, jamais hostilizar o profissional.

À colega Cintia Kelly, toda a nossa solidariedade.

Associação Bahiana de Imprensa

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Artigos

O extraordinário jornalista baiano Anatólio Valladares

Luis Guilherme Pontes Tavares*

Encontrei o jornalista baiano Anatólio Valladares (1880-1924) no discurso “A Associação Bahiana de Imprensa e o Monumento a Ruy”, proferido em 08 de novembro de 1944 pelo então presidente dessa instituição, jornalista Ranulpho Oliveira (1930-1970). Fui então procurá-lo no veículo referido por Oliveira, a revista Bahia Ilustrada, criada por Valladares em dezembro de 1917.

Por que escolhi o adjetivo extraordinário para tratar de Anatólio?

Ofereço três motivos: a Bahia Ilustrada, apesar do nome, era editada e impressa no Rio de Janeiro; Anatólio era profissional que empreendia, administrava e atuava tanto no jornalismo como na indústria gráfica e na publicidade; por fim, apesar da proximidade com a história da Imprensa da Bahia, não ouvira falar dele antes.

capa da 1ª edição da Bahia Ilustrada
Capa da 1ª edição da Bahia Ilustrada, datada de dezembro de 1917

Localizei números da Bahia Ilustrada na hemeroteca digital da Biblioteca Nacional (RJ), mas as informações a respeito dele se apresentariam em páginas do número 01 de uma nova versão, criada em novembro de 1933, da revista que ele dera à luz em dezembro de 1917. O seu perfil foi escrito pelo baiano Astério [Barbosa Gomes] de Campos (1891-?) e ocupa a página 54. Desse texto trataremos mais adiante. Adianto que Astério, nascido em Amargosa, também trabalhou na equipe de Anatólio na Bahia Ilustrada que estreou em dezembro de 1917 e ingressou no jornalismo pelas mãos de Ruy Barbosa.

Antes, porém, de escrever as linhas sobre Anatólio, com base no texto de Astério, explico que o então presidente da ABI, Ranulpho Oliveira, referiu-se a ele no discurso de 1944 para agradecer a publicação que fizera, em 1917, da fotografia da casa natal de Ruy Barbosa, imagem que seria fundamental para o artista plástico Presciliano Silva (1883-1965) elaborar o croqui do imóvel e assim oferecer o documento iconográfico para a elaboração do projeto arquitetônico que possibilitou a restauração mais fidedigna que foi possível e que obteve o elogio do então SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

Tratemos do surpreendente Anatólio Valladares.

Segundo o escritor Astério de Campos, Anatólio desempenhava sem dificuldades os papéis de proprietário, redator, diretor de arte e publicitário. Quando passou a atuar no sul do país, no Rio de Janeiro e em Santos (SP), escreveu na Gazeta da TardeCidade do RioO ImparcialO Século e compôs a equipe administrativa do também carioca Jornal do Commercio. Trabalhou em Santos como representante do Jornal do Brasil e da Revista da Semana e criou, no início do século XX, nessa cidade paulista, o periódico Santos Ilustrado.

primeira página da revista Bahia Ilustrada
Frontispício da edição número 1 da Bahia Ilustrada

Foi, no Rio, no entanto, que Anatólio fundou a Brasil Ilustrado e a Bahia Ilustrada, cuja redação – na rua 1º de Março, 12, no centro do Rio – era ponto de encontro de baianos como Ruy Barbosa. Essa revista, que tratava de fatos e personagens baianos e captava anúncios na Bahia, foi, numa etapa, dirigida por Octávio Mangabeira e reunia colaboradores como Astério de Campos, o poeta e diplomata pernambucano Olegário Marianno (1889-1958), o jornalista gaúcho Álvaro Moreyra (1888-1864), o escritor gaúcho Felippe d’Oliveira (1890-1933) e, dentre outros, o escritor gaúcho Homero Prates (1890-1957). O ilustrador baiano Cícero Valadares (?-1937), famoso pela atuação da revista infanto-juvenil Tico-Tico, colaborou nas duas versões da Bahia Ilustrada.

O jornalista Anatólio foi casado com dona Marina Pradel Valladares e, conforme o perfil assinado pelo colega e amigo Astério de Campos, ele faleceu, aos 44 anos, vitimado pelo excesso de trabalho. Doou-se sem limites ao projeto de vida… A propósito disso, o autor do perfil encerra o texto com esta reflexão:

“O sonho! A ilusão! Anatolio Thibault ou France, seu homônimo, assim sentiu. E interrogava-se a si mesmo.

– Que importa que o sonho minta, se é bello? Não é o destino dos homens o estarem mergulhados numa ilusão perpetua? Et cette illusion n’est-elle pas la condition même de la vie?(Poésie, p. 128) …

A ilusão de Anatolio Valladares foi o jornalismo… O jornalismo é como Saturno: compraz-se em devorar os próprios filhos…

Fotografia do jornalista Anatólio Valladares
Anatolio Valladares na Bahia Ilustrada, ano 1, n.1

Mas… Bendita ilusão!”

Constato, neste final, que introduzi como tema para pesquisadores da história da Imprensa três jornalistas baianos que alcançaram projeção no Rio de Janeiro e sobre os quais nada sabia respeito. O pouco que aprendi com Astério sobre Anatólio não me permitiu, por enquanto, saber se o criador da revista Bahia Ilustrada tinha parentesco com o conterrâneo Cícero Valladares.

Deixou aqui, portanto, o aperitivo e a provocação.

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*Jornalista, produtor editorial e professor universitário. É 1º vice-presidente da ABI. [email protected]

Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI).

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1823-2023: Que se organize logo a edição comemorativa do Diário Oficial do bicentenário do 2 de Julho

Luis Guilherme Pontes Tavares*

Descontado o tempo de elaboração dos textos, da edição e design da publicação, da impressão, divulgação e lançamento, suponho que seja possível que, à semelhança do que a Imprensa Oficial do Estado (IOE), então dirigida pelo jornalista e político João Pacheco de Oliveira (1880-1951), fez em 02 de Julho de 1923, a Empresa Gráfica da Bahia (EGBA) seja capaz de organizar e publicar, no 2 de Julho de 2023, edição especial do Diário Oficial comemorativa do bicentenário da Independência do Brasil na Bahia.

Em 1923, o 1º centenário da Independência foi festejado pela IOE com a publicação de edição especial com cerca de 700 páginas, enriquecida com 53 textos assinados e outros produzidos por redatores da Imprensa Oficial e de outras instituições públicas e privadas. Só para citar alguns dos autores que trataram da conjuntura e da influência que teve o primeiro século do Brasil independente escolhi oito: Francisco Marques de Góes Calmon, que seria eleito governador no ano seguinte; o professor e político José Wanderley de Araújo Pinho; Aloysio de Carvalho e Aloysio de Carvalho Filho, pai e filho, ambos jornalistas e políticos; o historiador Braz do Amaral; o poeta e médico Egas Muniz Barreto de Aragão, conhecido como Péthion de Villar; o professor Octávio Torres e o cronista e engenheiro Silio Boccanera Júnior.

Capa do CD do 2 de Julho de 1923 | reprodução

Para a edição de 02 de Julho de 2023, ouso sugerir estes poucos e fundamentais nomes para a espelharem o que fizeram os colaboradores da edição de 1923, tratando da conjuntura e da influência que recebeu do século anterior. Eis os nomes e respectivas áreas de exame: Armando Avena (Economia); Sergio Siqueira (Cultura); Eduardo Salles (Agricultura); Nivaldo Andrade (Arquitetura); Wlamyra Albuquerque (História); Luiz Freire (Artes Plásticas); Manoel Barral Netto (Medicina); Maria Teresa Navarro de Brito Mattos (Documentação & memória); e Nelson Pretto (Educação). Com esses nove nomes, abro a lista que poderia se assemelhar em número e qualidade à relação de convidados de cerca de 100 anos atrás.

Edição fac-similar de 2004 – Há 17 anos, o governador de então autorizou à Secretaria da Cultura e Turismo, através da Fundação Pedro Calmon (FPC)/ Centro de Memória e Arquivo Público, a publicar edição fac-similar (impressa e digital) do DO de 1923. Na ocasião se constatou que restavam poucos e já danificados exemplares, sob os quais se debruçavam com frequência pesquisadores nacionais e estrangeiros. A edição fac-similar tem nas páginas iniciais as apresentações assinadas pelo secretário Paulo Gaudenzi; pelo diretor da FPC, escritor Claudius Portugal; e pela diretora do Arquivo, professora Marli Geralda Teixeira. A introdução foi elaborada pelo professor Cândido da Costa e Silva, da FFCH/UFBA.

Capa da edição fac-similar (2004) | reprodução

A apresentação do secretário Paulo Gaudenzi (1945-2004) esclarece: “No intuito de conservar os exemplares restantes do histórico Diário Oficial – que se encontram ameaçados de deterioração pelo intenso manuseio –, preservar a memória histórico documental e, principalmente, facilitar o acesso a tão importante documento, é que o Governo do Estado da Bahia, por intermédio da Secretaria da Cultura e Turismo e da Fundação Pedro Calmon, traz a público esta edição”. Em sua introdução, o professor Candido Costa e Silva, como que complementando o texto do secretário, acrescenta o seguinte comentário sobre os convidados do DO do centenário: “Oitenta anos adiante, imaginava fossem mais evidentes as referências aos colaboradores. O tempo, porém, foi mais esponja do que buril”.

Aprendi a valorizar o DO comemorativo do centenário da Independência do Brasil na Bahia nas pós-graduações que cumpri desde o final da década de 1980 até o início da década 2000. Em ambas, estudei a IOE – denominada depois de Imprensa Oficial da Bahia (IOB) e EGBA. Em 2005 e 2008, quando organizei a 1ª e a 2ª edições do Apontamentos para a história da Imprensa na Bahia, tive a oportunidade de incluir dois textos originais do DO de 1923: “A Imprensa na Bahia em cem anos”, do jornalista Aloysio de Carvalho (Lulu Parola) e “Imprensa Official do Estado”, do redator Honestilio Coutinho, textos que se avizinharam no famoso DO, um iniciando na página 215 e o outro na página 219.

Valorizemos, pois, o tesouro de informações que é o DO de 1923 e tentemos, quiçá, fazer com que a edição do DO comemorativa do bicentenário venha a ser tão admirável como a anterior.

Oxalá!

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*Jornalista, produtor editorial e professor universitário. É 1º vice-presidente da
ABI. [email protected]

Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI).
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