A Associação Bahiana de Imprensa (ABI-Bahia) se reuniu, na manhã de ontem (10), com a presença de expressivo número de diretores, para analisar o posicionamento da entidade frente ao golpe de 1964. Depois de debater intensamente questões relacionadas ao contexto histórico e à conjuntura política do país, a diretoria da ABI-Bahia decidiu lançar uma nota pública em que se pronuncia sobre seu comportamento e omissões no golpe e durante a ditadura. Para tanto, foi constituída uma comissão de quatro membros, encarregada de elaborar um documento da instituição à sociedade, que será divulgado depois de ser apreciado em Reunião Extraordinária marcada para o próximo dia 23 (quarta-feira).
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Em mais de 80 anos de história, a Associação Bahiana de Imprensa (ABI-Bahia) luta pela liberdade de expressão e acompanha as transformações sociais, políticas e econômicas da Bahia e do país. No dia 31 de março, o Brasil ‘descomemorou’ um triste episódio da sua história: os 50 anos do golpe civil-militar. Para não deixar cair no esquecimento os crimes cometidos pela ditadura, a Associação reuniu, na manhã de ontem (3), jornalistas em um debate sobre imprensa e censura. O evento realizado na sede da entidade recebeu depoimentos dos jornalistas Valter Lessa, Nelson Cerqueira, Emiliano José e Samuel Celestino, que narraram suas experiências ao longo dos 21 anos em que o país esteve sob o comando de generais.
No Auditório Samuel Celestino, o presidente da ABI-Bahia, Antonio Walter Pinheiro, agradeceu a presença de todos e conduziu o debate organizado pelo jornalista Luis Guilherme Pontes Tavares, diretor de Cultura da instituição. Walter Pinheiro, que também é presidente do jornal Tribuna da Bahia, lembrou as dificuldades do diário na época dos “anos de chumbo” do regime militar iniciado em março de 1964 e extinto em 1985, período em que jornalistas foram perseguidos, assassinados ou desapareceram, e os jornais foram ocupados por censores oficiais, escrevendo uma das mais tristes páginas da História do Brasil.
Walter Pinheiro ressaltou que esse não foi o único período em que houve severas restrições à ordem pública e às liberdades individuais. Já no ano de seu nascimento, a ABI enfrentaria um fato político que perturbava o país. Era a chamada “Revolução de 30”, que trazia a decretação do estado de sítio, seguida da ditadura de Getúlio Vargas, de 1937 a 1945. A ABI surge para defender a liberdade de expressão.
Para ele, o jornalista sofre com a autocensura, entre outras pressões. “A censura não se extingue com o restabelecimento da democracia. Ela muda de forma e a ABI está sempre atenta a identificar os momentos em que ela se manifesta. Que esse evento possa fortalecer nossas convicções sobre os processos democráticos, porque sem imprensa não há democracia. Sem imprensa não há justiça. O que se deseja é uma imprensa livre, responsável e que priorize o interesse público”, defendeu o dirigente.
O jornalista Valter Lessa, experimentado fotojornalista brasileiro, iniciou a mesa questionando os motivos que impediram a derrubada do então governador da Bahia, Lomanto Júnior, que foi “convidado”, após o golpe, a adequar-se ao novo regime. Na ocasião, o ex-chefe da Casa Civil do Governo Lomanto Júnior, o administrador e professor João Eurico Matta, adicionou informações ao relato de Lessa, revelando que o então governador estava informado sobre o golpe. Lessa narrou os episódios que ocorreram no Palácio da Aclamação entre março e abril de 1964, quando o prédio foi cercado, e destacou a importância do telefone como meio de comunicação que contribuiu para o curso dos acontecimentos.
Emocionado, Nélson Cerqueira, presidente da Faculdade Zacarias de Góes, lembrou-se da noite de 31 de março de 1964. Ele era diagramador do Jornal da Bahia e um dos poucos que restavam na redação quando houve a invasão do jornal pelos militares. “O jornal se preparava para rodar quando o Exército chegou. O comandante pediu para ver a edição cuja manchete era ‘Rebelião contra o governo’ e disse: ‘Tá errado. Vamos trocar agora!’. E mudou para: ‘A nação que se salvou a si mesmo do julgo comunista’. [Risos] Eu respondi que não havia espaço”. No outro dia, o jornal circulou com a manchete em branco. “Esse episódio simplório foi o primeiro registro formal de censura explícita e declarada em 1964. Depois disso, apareceu a figura do censor físico, que ia às redações com um carimbo para aprovar ou não as matérias”. De acordo com Cerqueira, os redatores recebiam uma lista de coisas que não podiam ser publicadas, que, se seguida à risca, não existiria jornal.
Um dos autores fundamentais da historiografia sobre a ditadura, o jornalista Emiliano José depôs a respeito das torturas e perseguições sofridas nos anos 70, quando esteve preso por quatro anos, e refletiu sobre a participação da imprensa brasileira no golpe. “Acho extremamente rico que a ABI proponha esse debate corajoso, porque é muito difícil as instituições dizerem ‘eu errei’. Na minha condição de sobrevivente, falo em nome dos mortos e desaparecidos que foram vítimas dessa noite de terror e sombras que foi a ditadura. Havia uma determinação do Estado para torturar, conseguir informações e matar, como confirmam os arquivos a que teve acesso o jornalista Elio Gaspari. Mas a mídia brasileira foi golpista e parte do golpe. Cúmplice do regime ‘terror e sangue’”.
Cronista político de A Tarde, além de editor do site Bahia Notícias, o jornalista Samuel Celestino também enfrentou dificuldades com os órgãos de repressão e viveu no exterior durante um período da ditadura militar. Ele relatou o cerco da Faculdade Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA), no dia 1º de abril. Para o ex-presidente da ABI e atual presidente da Assembleia Geral da instituição, “é importante deixar claro que a ditadura não deixou o poder, mas foi derrotada pelas manifestações da sociedade civil brasileira”.
Após os depoimentos da mesa, os diretores da ABI, Ernesto Marques e Agostinho Muniz, propuseram que a entidade avalie seu comportamento durante o regime militar e, se constatadas as omissões, faça uma retratação pública. “Precisamos corrigir esse erro histórico, porque a ABI de 64 não é a de hoje”, afirmou Agostinho Muniz.
Para Ernesto Marques, “passado não é o que passou, mas o que ficou do que passou. É muito importante que a nova geração de jornalistas tenha orgulho da ABI e entenda que aqui é sua casa. Nós erramos sim e devemos desculpas à sociedade”. A sugestão de avaliação da proposta foi acolhida como ponto de pauta da reunião da diretoria, que será realizada na próxima quinta-feira (10).
A Assembleia Legislativa da Bahia aprovou por unanimidade projeto de resolução que concede a Comenda Dois de Julho ao diretor-presidente da Tribuna da Bahia e presidente da Associação Bahiana de imprensa (ABI), Antonio Walter Pinheiro, “não só pelos seus serviços às comunidades menos favorecidas como integrante de várias instituições filantrópicas e de beneficência, mas, sobretudo, como uma maneira de o Poder Legislativo homenagear toda a imprensa baiana na passagem do Dia do Jornalista”.
Assinado pelo deputado Euclides Fernandes, o projeto tem a seguinte justificativa: “Em 1931, a Associação Brasileira de Imprensa decidiu que o dia Sete de Abril será considerado como o Dia do Jornalista, como uma forma de homenagear o jornalista e médico Libero Badaró, assassinado no dia 22 de novembro de 1830, em São Paulo, por alguns dos seus inimigos políticos.
O movimento popular que se gerou por causa do seu assassinato levou a que D. Pedro I abdicasse em 1831, no dia 7 de abril. Este Projeto de Resolução além de homenagear o presidente da ABI, jornalista Walter Pinheiro, em reconhecimento ao seu intenso e incansável trabalho como integrante de entidades filantrópicas e beneficentes e o lídimo representante da classe jornalistica, o que pretendemos, também, é que o Poder Legislativo homenagei todos os integrantes da categoria profissional também denominada de Quarto Poder.
Para isso, precisamos do apoio e participação de todos os meus pares para que esta proposição esteja aprovada a tempo de ter sua solenidade de entrega marcada para o dia Sete de Abril, Dia do Jornalista. Além de presidente da Tribuna da Bahia, Walter Pinheiro já integrou a diretoria da Santa Casa da Misericórdia, o Conselho Definidor da Casa Pia e colégio de Órfãos de São Joaquim, é membro do Instituto Movimenta Salvador e dos conselhos da Associação Brasil-Portugal, da FIEB e do conselho de Desenvolvimento Econômico e social do Estado da Bahia.
Em reconhecimento às suas atividades já foi agraciado com a Ordem do Mérito rio Branco; Medalha Tomé de Souza; além de agraciado pelas três Forças Armadas e mais a Polícia Militar da Bahia”.
FONTE: Tribuna da Bahia
Por Luis Guilherme Pontes Tavares*
“Imprensa e censura” é o tema da mesa redonda que a Associação Bahiana de Imprensa (ABI) realizará na manhã da próxima quinta-feira (03.04) no Auditório Samuel Celestino (8º andar da sede da instituição, na rua Guedes de Brito, 01, esquina da Praça da Sé, telefone 3322 6903). O evento, aberto ao público, será iniciado às 9h. O tema será tratado pelos jornalistas Valter Lessa, Nelson Cerqueira, Emiliano José, Samuel Celestino e Sérgio Mattos (mediador). A mesa redonda inaugura as reflexões da ABI, neste ano, a respeito dos 50 anos do golpe de 1964.
A princípio, conforme aprovação, no final de 2013, de proposta encaminhada à diretoria da ABI, o evento “Meio século após o último golpe cívico-militar no Brasil” seria desdobrado em duas mesas redondas. Questões diversas impediram a realização desse projeto num sequência de dias, de modo que o tema poderá ser novamente tratado durante este ano. Está prevista, por exemplo, para o segundo semestre, a palestra do jornalista João Carlos Teixeira Gomes sobre os embates do Jornal da Bahia com o arbítrio que agredia a liberdade de imprensa.
OS PARTICIPANTES
O jornalista Valter Lessa, um dos decanos do fotojornalismo brasileiro, participará da mesa redonda “Imprensa e censura” com depoimento sobre os episódios que ocorreram no Palácio da Aclamação entre março e abril de 1964. O então governador Lomanto Júnior foi instado, após o golpe, a adequar-se ao novo regime. Esse processo, conforme o depoimento de Valter Lessa, teve dificuldades. O governador concluiu o mandato e foi sucedido pelo governador Luiz Viana Filho.
O jornalista Nélson Cerqueira, presidente da Faculdade Zacarias de Góes, era, em 1964, diagramador do Jornal da Bahia e, na noite de 31 de março de 1964, foi um dos poucos que restou na redação esvaziada devido a eminência da invasão do jornal pelos militares. E isso aconteceu e é sobre isso que o jornalista falará na mesa redonda de 03 de abril na ABI. Ele, após o golpe, viveu vários anos no exterior e construiu uma bagagem de conhecimento que o tornou poliglota e o credenciou para integrar o corpo de professores da pós-graduação da Faculdade de Direito da UFBA.
O jornalista Emiliano José é um dos autores fundamentais da historiografia sobre a ditadura 1964-1985. Neste instante prepara a versão revista e ampliada da biografia de Carlos Lamarca. Professor da Facom/UFBA e ex-vereador, deputado estadual e deputado federal, Emiliano José colabora com regularidade na imprensa local e nacional e tem posição firmada sobre a imprensa e a censura no Brasil. O depoimento dele enriquecerá a mesa redonda “Imprensa e censura”.
COMENTÁRIO E MEDIAÇÃO
Cronista político de A Tarde e da TudoFM, além de editor do site Bahia Notícias, o jornalista Samuel Celestino fará os comentários sobre os três depoimentos que antecederão a sua fala. Ex-presidente da ABI e atual presidente da Assembleia Geral da instituição, Celestino também enfrentou dificuldades com os órgãos de repressão e viveu no exterior durante um período da ditadura militar. Seus comentários, certamente, abrilhantarão o evento.
O jornalista Sérgio Mattos, professor do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), é autor, dentre outros, do livro Mídia controlada: a história da censura no Brasil e no mundo (São Paulo: Paulus, 2005). Ele funcionará no evento de 03 de abril como o mediador da mesa redonda. Assim como os demais depoentes, Sérgio Mattos também tem episódios de enfrentamento do regime de exceção implantado em 1964.
O presidente da ABI, jornalista Walter Pinheiro, que dirige a Tribuna da Bahia, tem demonstrado seu entusiasmo com o evento e, no dia 03, fará a saudação aos participantes da mesa e ao público. O tema “Imprensa e censura” é permanecente nas reuniões da ABI. É do dia a dia da instituição, pois é missão dela lutar em favor da manutenção da liberdade de imprensa e na defesa da sobrevivência e expansão da indústria comunicacional da Bahia.
*Luis Gulherme Pontes Tavares é Diretor de Cultura da Associação Bahaina de Imprensa (ABI)