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Defesa da democracia marca abertura do Simpósio Baiano de Jornalismo e Literatura

Uma noite memorável em defesa da democracia foi proporcionada neste 7 de abril, Dia do Jornalista, pela Associação Bahiana de Imprensa (ABI) e pela Academia de Letras da Bahia, com a abertura do I Simpósio Baiano de Jornalismo e Literatura. O evento online, transmitido pelo canal do YouTube da ALB, reuniu jornalistas, escritores, acadêmicos e intelectuais de diversas áreas do conhecimento, para discutir os “Limites da liberdade de expressão e direitos hoje, no Brasil”. O público teve a oportunidade de assistir ao vivo parte importante da bibliografia estudada nos principais cursos de comunicação do País, através da célebre mesa composta pelo jornalista, escritor, e ex-professor da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia (Facom/UFBA), Emiliano José, pelo professor-titular de jornalismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Muniz Sodré, e pelo professor-titular de teoria da comunicação da Facom/UFBA, Wilson Gomes. 

O professor Ordep Serra, presidente da ALB, abriu a noite cumprimentando os jornalistas pelo seu dia e denunciando as formas de violência enfrentadas por esses profissionais. “Para nós da Academia, é um dia importantíssimo. Muitos dos nossos acadêmicos começaram sua carreira na imprensa, como jornalistas. É impossível fazer uma história da literatura baiana e brasileira sem considerar a imprensa”, observou. “Quero homenagear àquelas que estão sofrendo censura direta ou velada, restrições à sua liberdade de expressão. Precisamos começar por aí, pela afirmação da liberdade de expressão, da liberdade de pensamento, pela valorização da imprensa livre, pela resistência ao obscurantismo”, defendeu. Segundo o acadêmico, o Simpósio é o começo de uma grande aliança entre as instituições. “Estaremos juntos na luta pela cultura, pelos valores da civilização”, garantiu. 

Ernesto Marques, presidente da ABI, saudou os colegas de profissão e justificou o “7 de abril”. Ele explicou que a data é um tributo à memória de Líbero Badaró, pelo que o médico e jornalista representou em sua época como defensor das liberdades e do direito à informação. Marques aproveitou o momento para homenagear o membro da Assembleia Geral da ABI, Eliezer Varjão, falecido na véspera do evento. “Para nós da ABI, este 7 de abril chega com a dor da perda de um dos nossos, muito querido. Ontem partiu Eliezer Varjão, aos 80 anos, depois de uma longa e corajosa luta pela vida”, afirmou o dirigente.

O jornalista resgatou os inúmeros desafios enfrentados pelos profissionais da imprensa no contexto da pandemia, em sua difícil missão de levar informação à sociedade. “O desafio da nossa já bastante conhecida realidade descomunal, a nossa criatividade, nunca foi tão visceralmente provocador como agora. Provocação que grita do choro de centenas de famílias, da coragem altruísta profissionais de saúde da chamada linha de frente, das forças de segurança, agora empenhadas no combate a um inimigo tão letal e microscópico, ou na coragem indômitas das equipes de reportagem, sempre indo além do que recomendam os policiais e os médicos, na hora de colher os fatos a serem transformados em notícias”, ressaltou. “Neste 7 de abril, Dia do Jornalista de 2021, quando o número de mortes causado pela pandemia nos assombra, escrever é mais do que imprescindível. Eu diria que é obrigatório. Que os debates dessa mesa nos inspirem a escrever sobre essa realidade descomunal, que nos assusta, nos apavora e, sobretudo, nos desafia”, concluiu.

Imprensa e democracia

Em uma mediação bastante elogiada pelo público do evento, a jornalista Jussara Maia, professora de Jornalismo do Centro de Artes, Humanidades e Letras (CAHL), da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), afirmou sua admiração pelos conferencistas, de quem se disse leitora. “Situamos essa mesa no espaço reflexivo que entende jornalismo e literatura com suas especificidades, mas também os reconhece como campos que têm tido historicamente proximidade, aliança e muitos diálogos em defesa da democracia. Seja por meio da partilha da experiência comum em redações de jornais, com o uso de técnicas de pesquisa e checagem de dados, o estilo de uma escrita rica em estratégias envolventes, com apreensões criativas na construção de relatos sobre o real, entre outros aspectos”, destacou a pesquisadora. 

Maia enfatizou a importância do jornalismo para o funcionamento da democracia e expôs contradições que ameaçam o próprio sistema político brasileiro. “Implica pensar os limites à liberdade de expressão e aos direitos em uma república que tem a democracia representativa como seu sistema de governo, mas lida com o fortalecimento nacional e mundial de correntes políticas de extrema-direita, que têm usado organizações jornalísticas, plataformas digitais e algoritmos para manter bolhas e fomentar a incomunicabilidade”, afirmou.

Para Emiliano José, ocupante da cadeira de número 1 da ALB, é histórico o encontro entre a ABI e a Academia. Emiliano começou sua carreira no jornalismo em 1974, no jornal Tribuna da Bahia, tendo passado por muitas redações até chegar à marca de 16 livros publicados. “O jornalismo é parte do meu cotidiano, esteja eu numa redação, como estive durante tantos anos, esteja eu fora, mas sempre escrevendo. Escrever virou uma espécie de alimento da existência para mim, a partir do meu mergulho no jornalismo”, disse. De acordo com ele, são os jornalistas os verdadeiros defensores da liberdade de expressão e da garantia de direitos. 

“Eu considero que defender a liberdade de expressão e a garantia de direitos é algo mais ou menos óbvio, absolutamente necessário, fundamental, da pauta de quem quer que defenda a democracia”, destacou o professor. Segundo ele, os limites à liberdade de expressão e a garantia de direitos estão dados no Brasil por uma estrutura política autoritária, onde a democracia tem sido uma exceção. “A defesa da liberdade de expressão deveria ser uma luta da mídia, mas não é. A defesa está nas mãos dos jornalistas. A grande mídia nunca defendeu liberdade de expressão salvo para os seus interesses de classe”, pontuou.

O professor Muniz Sodré traçou um paralelo entre a narrativa do conto infanto-juvenil sobre o boneco Pinóquio, do autor italiano Carlo Collodi, o problema da mentira na rede e suas correlações com jornalismo e literatura. Ele resgatou o chamado “paradoxo da mentira”, citando a sentença do filósofo Epimênides, na cidade de Creta, na Grécia: “Todos em Creta são sempre mentirosos”, para criticar a sociedade atual, cujas movimentações na internet aumentaram a tendência de todos para “aumentar um ponto” nos próprios contos. “Vamos aplicar o princípio de que todo mundo mente, todo mundo é igual a Pinóquio. O princípio de Pinóquio, ou princípio da mentira sistemática, é o que vem caracterizando a sociedade das redes eletrônicas. A mentira é um risco enorme para o diálogo democrático”, sentenciou. E para Sodré, diálogo não é a simples troca de palavras. “Diálogo é a abertura do laço coesivo, para fortalecer o vínculo humano. É uma atividade de travessia apoiada na linguagem, para chegar a uma verdade consensual, ética. O princípio de Pinóquio é uma ameaça séria ao diálogo social”, afirmou.

Mas, o professor enxerga na rede soluções para a própria transformação do jornalismo. “Eu sinto já na rede, com toda mentira dela, os prenúncios de uma reinvenção do jornalismo, com recursos de aportes comunitários. O jornalismo se revela essencial para restaurar a potência da palavra, diante do risco concreto que a palavra enfrenta nesse universo de mentiras. A palavra ainda detém a centralidade simbólica na formação da consciência cívica que é indispensável ao funcionamento da democracia. Eu tenho a sensação de que Pinóquio está assumindo a língua. E a cura para isso é o bom jornalismo”, opinou Muniz Sodré.

Fé no jornalismo

Em uma intervenção emotiva, o filósofo e pesquisador Wilson Gomes, refletiu sobre os mortos da pandemia e o trabalho dos jornalistas em fazer as informações chegarem às casas dos brasileiros. “O Brasil me dói literalmente todo dia, às 18h30. Eu queria marcar isso aqui. Eu apelidei essa hora de “a hora de José”. Gomes fez referência ao poema de Drummond para lançar questionamentos e refletir sobre um momento do dia que tem sido, segundo ele, de desespero. 

Diferentemente das pessoas que compuseram a primeira mesa do Simpósio, Wilson Gomes não é jornalista, mas, talvez nenhum jornalista tenha feito mais esforços do que ele para que a profissão recupere prestígio e importância para a sociedade. “Não sou jornalista, só sou professor de Jornalismo há mais de 30 anos. Curiosamente, eu descobri uma coisa nesses 30 anos: Não há gente que fale pior do jornalismo do que jornalista. Mesmo não sendo jornalista, assumi uma função que tenho tentando cumprir nos últimos anos, não por amor ao jornalismo simplesmente, mas por amor à democracia. Eu vivo de tentar restaurar a fé no jornalismo”, ressaltou. 

Para Wilson, “não há saída para o abismo em que nos encontramos sem o jornalismo”. O professor afirmou que tem se impressionado por ter que trabalhar para restaurar a fé de jornalistas na esfera pública, “essa esfera pública feroz, polarizada, que tem se dedicado muito a humilhar, envergonhar, constranger e perseguir jornalistas nesse momento no Brasil, seja de esquerda ou de direita”, apontou. “Alguma coisa mudou em 2020. Por virtude do próprio jornalismo, também porque Bolsonaro deixou o jornalismo sem saída. Ele não escolheu um lado, ou um jornalismo. Ele fez um discurso genérico sobre o jornalismo, colocou todos no paredão, e ‘é o jornalismo o inimigo mortal’”. 

A razão para isso, segundo Wilson Gomes, é que o jornalismo é o inimigo mortal da extrema direita. “O jornalismo é parte da democracia. É uma instituição criada pela mesma sociedade que criou a democracia liberal. E criou ao mesmo tempo. Portanto, o jornalismo é solidário à democracia, é o gêmeo da democracia liberal. Tem dois pontos de vista que me tornam utópico neste momento. A primeira coisa é que não quero desistir da reafirmação da dignidade da política. E a segunda coisa é que é preciso um jornalismo independente, um jornalismo de qualidade. Precisamos de um jornalismo para pessoas que hesitam. Precisamos de um jornalismo que trate o complexo com complexidade”. O pesquisador ressalta que o complexo não é o confuso. “Eu queria um jornalismo que me tratasse como um adulto. Talvez, o jornalismo seja a única instituição capaz de produzir o que hoje corresponderia à nova definição de informação de qualidade, e o que hoje poderia contribuir para uma sociedade em que mais informação leve necessariamente a mais democracia e a melhores democracias”, concluiu o mestre.

Hoje, 8 de abril, a programação do I Simpósio Baiano de Jornalismo e Literatura continua com a segunda mesa, sob o tema “O espaço e conteúdos de cultura nos jornais, televisão, rádio e plataformas digitais” (assista aqui), com as presenças do jornalista e vice-presidente da Assembleia Geral da ABI, Sérgio Mattos, da jornalista e professora da Faculdade de Comunicação da UFBA, Malu Fontes, e da escritora Kátia Borges. A mediação é da diretora do Departamento de Divulgação da ABI, a jornalista Simone Ribeiro.

A mesa III, programada para o dia 9 de abril, “Jornalismo e Literatura: interfaces”, terá as participações do escritor Antônio Torres, escritor, jornalista, membro da ALB e da Academia Brasileira de Letras (ABL), da jornalista e escritora Aline D´Eça e do doutor em ciências da comunicação Edvaldo Pereira Lima. A jornalista e escritora Suzana Varjão assumirá a mediação.

  • Perdeu a abertura do evento? Assista abaixo:

https://www.youtube.com/watch?v=hOZbAwdZKNE

Serviço:

I Simpósio Baiano de Jornalismo e Literatura

Quando: 7, 8 e 9 de abril de 2021 das 18 às 20h 

Onde: Online, via YouTube da Academia de Letras da Bahia (ALB)

>> Confira abaixo a programação completa:

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Site Walter da Silveira traz acervo raro e remonta formação do cinema moderno brasileiro

Walter da Silveira em sua tela pessoal, a qualquer dia e horário. Esta nova realidade estará acessível gratuitamente a partir de abril, com o lançamento do website walterdasilveira.com.br, o qual reunirá e disponibilizará uma parte consistente do acervo do militante político, professor, historiador, cineclubista, ensaísta, advogado e um dos mais importantes críticos de cinema brasileiro, o baiano Walter da Silveira. 

O lançamento oficial da plataforma acontece no próximo dia 10 de abril, às 19h, e contará com uma mesa solene, transmitida ao vivo pelo canal do YouTube da Associação Bahiana de Imprensa (ABI) – ( https://bit.ly/2QrXfLK ), entidade que possui a salvaguarda do acervo físico de Silveira. 

Para ser lançado ao público, a equipe fez um mergulho prévio no acervo se Silveira e catalogou, restaurou e digitalizou 355 imagens, entre fotos de filmes e do arquivo pessoal, além de 98 correspondências.  Os tipos documentais destacados têm forte significado para a história do cinema brasileiro, com destaque para as correspondências com Glauber Rocha, Alex Viany e Paulo Emílio Sales Gomes, trocadas entre 1950 e 1966, e que permitem acompanhar a formação do cinema moderno no Brasil.

O projeto é idealizado pela doutora em Artes e professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Cyntia Nogueira, autora do livro Walter da Silveira e o Cinema Brasileiro. A coordenação é da museóloga Renata Ramos, que atua na área de conservação e restauração documental e é responsável pelo Museu de Imprensa da ABI. Integra também o projeto o historiador e doutor em Cinema, Adilson Mendes, atuando como pesquisador responsável pelo projeto. 

Para Renata Ramos, além da possibilidade de trabalhar a documentação que estava parada há algum tempo, o maior ganho que o projeto dá conta é a divulgação da própria história e importância de Walter da Silveira. 

“As peças são muito importantes para a história da Bahia e para o cinema baiano e brasileiro. E foi isso o que nos motivou trabalhar esse material. Poucas pessoas na Bahia conhecem Walter da Silveira como um dos especialistas do cinema brasileiro e, principalmente, do cinema baiano. Nosso ganho é a divulgação dessa documentação, que é muito importante para a sociedade como um todo. Walter é conhecido internacionalmente, mas nem todos os jovens pesquisadores do cinema tem essa referência dele como um dos principais críticos”, pontua Renata. 

Adilson Mendes, na função de pesquisador responsável da proposta se dedicou ao processo de levantamento, seleção dos conteúdos mais relevantes, elaboração de metodologia de classificação, organização de peças fundamentais e outras etapas do processo que culminam com o lançamento do site. Ele classifica Walter da Silveira como “um articulador fundamental para o cinema moderno”. 

Do minucioso trabalho empreendido, Mendes destaca as fotografias, as quais, segundo ele, mostram como Walter ocupava um lugar central para o cinema brasileiro. 

“Ele articulava, participava como líder em festivais, publicava na imprensa. Então, quando as pessoas lançavam seus filmes ou estavam produzindo, mandavam para ele fotos, imagens, quase que para pedir uma anuência da parte dele ou mesmo para pedir favores, para ele ajudar nas filmagens na Bahia”, diz Mendes.  

A criação do site com materiais minuciosamente selecionados também objetiva fazer do local uma fonte de referência para iniciantes e iniciados na cultura audiovisual.  Ao mesmo tempo que difunde a vida e a obra de Walter da Silveira, o projeto estimula a pesquisa especializada ao favorecer a compreensão sistêmica da rede do cinema moderno, que permitiu, no caso baiano, a formação de um dos baianos mais ilustres no universo cinematográfico. 

A plataforma também reunirá depoimentos de importantes personalidades do cinema brasileiro, os quais destacam a importância de Walter da Silveira, dentre eles, Antonio Pitanga, Orlando Senna e Roque Araujo. 

O projeto tem apoio financeiro do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura e da Fundação Cultural do Estado da Bahia (FUNCEB), por meio do Programa Aldir Blanc Bahia, via Lei Aldir Blanc, direcionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo Federal.

O ACERVO DE WALTER DA SILVEIRA

Desde 2015, quando assinou o termo que oficializou a doação do acervo de Walter da Silveira, feita pela família do crítico de cinema, a Associação Baiana de Imprensa detém a salvaguarda de milhares de itens, agregando as funções de preservação e de disponibilização de acesso ao acervo. As peças físicas estão disponíveis no Museu da Imprensa, criado pela ABI há 43 anos e reinaugurado em agosto de 2020, como parte da celebração de 90 anos da Associação.

A doação feita à ABI recompôs quase totalmente a biblioteca pessoal de Silveira, somando-se à parte do acervo adquirida em 1972 pela instituição, composto por obras antes disponíveis na Biblioteca Jorge Calmon. 

Serviço
O que: Lançamento website walterdasilveria.com.br
Quando: 10 de abril, a partir das 19h
Onde: Canal da Associação Bahiana de Imprensa (ABI) no Youtube: https://bit.ly/2QrXfLK

Mari Leal
Assessoria de Imprensa
(71) 99277-5034

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ABI e UniRuy avançam nas negociações para restaurar acervo do Museu Casa de Ruy Barbosa

Em visita técnica realizada ao Museu Casa de Ruy Barbosa, na manhã desta quarta-feira (10), o professor José Dirson Argolo, restaurador de obras de arte e especialista em preservação de monumentos e bens históricos, avaliou o estado do acervo do equipamento cultural. A iniciativa faz parte dos esforços da Associação Bahiana de Imprensa (ABI) e do Centro Universitário UniRuy para dimensionar os custos de um projeto de restauro das obras e da Casa. O vice-presidente da instituição, Luís Guilherme Pontes Tavares, e a museóloga Renata Ramos, responsável pelo Museu de Imprensa da ABI, receberam o docente no local.

O Museu Casa de Ruy Barbosa foi erguido sobre a casa onde, em 1849, nasceu Ruy Barbosa, na Rua dos Capitães (atual Rua Ruy Barbosa), Centro Histórico de Salvador. O imóvel original encontrava-se em ruínas quando foi adquirido pela ABI, através de uma campanha de subscrição popular liderada pelo jornalista Simões Filho (1886-1957). O Museu é administrado desde 1998 por meio de um convênio firmado com a Faculdade Ruy Barbosa, instituição pertencente à outra empresa, que posteriormente recebeu o status de centro universitário. Em 2021, o UniRuy e a ABI retomaram as negociações que viabilizarão um acordo para a restauração do Museu e seu acervo.

O acervo é constituído por peças em metal, louça, tecido e gesso, além de estatuetas, telas, mobiliário, livros e documentos diversos que se referem à vida, obra e trajetória de Ruy Barbosa (1849-1923). O “Águia de Haia”, como ficou conhecido, teve uma atuação marcante em mais de cinco décadas da história do Brasil, como jurista, diplomata, jornalista, escritor e político. Alguns desses itens foram subtraídos do imóvel durante o furto ocorrido em setembro de 2018.

O UniRuy se propôs a custear os reparos no imóvel, começando pelo telhado e o inventário, bem como remoção do acervo para um local escolhido pela ABI. Por indicação da ABI, foram contratadas as bibliotecárias Ana Lúcia Albano e Graça Catolino, que coordenarão a equipe técnica responsável pelo inventário. O trabalho começa na próxima segunda-feira, dia 15, e deverá se estender por mais trinta dias, liberando o imóvel para intervenções na estrutura física.

O UniRuy avalia ainda a possibilidade de assumir os custos da restauração das obras de arte e demais itens do acervo museológico. Os entendimentos avançam em reuniões semanais. O objetivo é que o espaço logo esteja em condições de ser reaberto ao público e passe a exercer a sua finalidade, de receber visitantes e principalmente ser um centro de atividades, estudos, pesquisas e divulgação sobre Ruy Barbosa e sua obra.

“Estamos empenhando nossos esforços, juntamente com a ABI, para promover as condições favoráveis à reabertura do Museu, bem como assegurar sua longevidade”, enfatiza Rodrigo Vecchi, Reitor do UniRuy.

Acervo danificado

De acordo com José Dirson Argolo, o tempo fechado e sem manutenção expôs o acervo e o imóvel. Ele comparou as obras com fotos feitas há dois anos, quando realizou levantamento e apresentou orçamento para a restauração e conservação do material. “Encontrei a Casa em condição complicada. Quando fiz a primeira avaliação, as peças estavam em um estado que ainda possibilitava um bom restauro”, lamentou. Uma das obras mais danificadas, segundo ele, é um retrato da esposa de Ruy Barbosa, Maria Augusta Viana Bandeira. “A gente pode limpar, mas a camada de carvão que era o desenho do artista está borrada, porque alguém fez uma limpeza de forma indevida, provavelmente utilizando flanela e álcool. Podemos fixar o que salvou dele, mas não voltará ao que era”, analisou.

“O acervo precisa ser deslocado daqui. E que se providencie a sua restauração, para que possamos conservar para a posteridade esse acervo tão importante sobre Ruy”, alertou. Com os dados coletados hoje, o restaurador vai atualizar e concluir o projeto, revisando os orçamentos que serão encaminhados ao UniRuy.

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Artigos Imprensa e História

Ruy Barbosa despedaçado

Das imagens que fiz durante a breve visita, na tarde de 20 janeiro de 2021, ao sobrado em que nasceu o jornalista, advogado e político Ruy Barbosa (1849-1923), é esta que ilustra o texto, a que mais me comoveu. A figura do ilustre baiano mercando exemplares de jornal com outra, no formato de boneco mamulengo, prostrada e despedaçada. Tomei-as como síntese da visita que não pudéramos fazer antes devido a inconsistente querela entre a ABI (Associação Bahiana de Imprensa) e o Yduqs, grupo educacional, de capital aberto, de que faz parte a UniRuy, outrora parceira que assumira a responsabilidade de manter o museu de portas abertas.

É provável que quem nos ler agora tenha conhecimento de que a ABI, que é proprietária do Museu Casa de Ruy Barbosa (MCRB), penou nos últimos meses para ter acesso ao sobrado do Centro Antigo (rua Ruy Barbosa, 12) por causa da intransigência dos substitutos da Faculdade Ruy Barbosa, nossa parceira desde o final da década de 1990, instituição criada pelo professor Antonio de Pádua Carneiro e sócios e vendida por eles a investidores estrangeiros.

Depois dessa operação financeira, os problemas materiais e relacionais se multiplicaram e o sobrado perdeu o viço que tinha quando a ABI o entregou à faculdade baiana. O diálogo empobreceu, sobretudo depois que a casa foi assaltada no final de 2018. A UniRuy fora vítima porque não zelara com o devido rigor o patrimônio que estava sob os cuidados dela. No meio do ano seguinte, a parceria se esgarçou de modo grave com a pretensão de devolver o imóvel lesado e em estado aquém daquele que a ABI dera acesso e que nos permitiria adjetivá-lo como se brinco fosse.

Tomemos os três parágrafos anteriores como preâmbulo e alcancemos o que importa e que possa explicar o título deste artigo. E o que importa é Ruy Barbosa, baiano extraordinário, de quem ouço elogios desde a infância e a quem conheci melhor quando auxiliei numa nova edição da biografia do jurista escrita pelo político baiano, mas nascido na França, Luiz Viana Filho (1908-1990), patrocinada pela Assembleia Legislativa do Estado da Bahia como parte das festividades do centenário desse autor, comemorado em 2008.

Ruy Barbosa recebeu da Bahia extraordinárias homenagens, sobretudo no seu centenário de nascimento, em 05 de novembro de 1949. Seus restos mortais foram transladados do Rio de Janeiro, onde permanecera desde o sepultamento em 01 de março de 1923, para a cripta no novo fórum baiano, que ostenta o seu nome, no Campo da Pólvora. Foi também em 1949 que a ABI inaugurou o Museu Casa de Ruy Barbosa, na antiga Rua dos Capitães, que adotou o nome do jurista quando quando Ruy era ministro das Finanças do Governo Rodrigues Alves, em 1903. Se o fórum foi levantado com os recursos públicos, o museu e o seu acervo são obra de doações identificadas, o que o torna mais do patrimônio da Bahia do que da ABI.

E é em nome dos baianos que erguemos nossa indignação com o que está ocorrendo. Dou-lhes, pois, conta de que o imóvel requer obras diversas para restabelecer, sobretudo, a segurança que ostentava desde o telhado, passando pelo primeiro piso e o térreo rente à rua (em Portugal, se diria ao rés do chão). Mas a preocupação maior é com os bens móveis – documentos, livros, telas, objetos e móveis – afins com Ruy Barbosa. Tudo doado pela sociedade – personalidades e instituições – da Bahia e do Brasil. Exigimos a imediata transferência para o prédio da ABI (Edifício Ranulpho Oliveira, na esquina da Praça da Sé) face ao perigo que é a permanência num imóvel avariado.

Desconheço quem teria doado as duas figuras que estão na foto, mas o mamulengo exige imediata restauração e que essa coincida com a solução da querela entre a ABI e a Yduqs, de modo que relações maduras e construtivas permitam que o museu volte a funcionar e que o boneco que representa Ruy volte a se erguer e passe a representar não mais o personagem prostrado de despedaçado, mas aquele que admiramos, respeitamos e que é modelo de brasileiro para a nossa e as gerações deste e dos próximos séculos.

A Bahia não pode abandonar seu filho exemplar.

Viva, pois, Ruy Barbosa!

*Jornalista, produtor editorial e professor universitário. É 1º vice-presidente da ABI. [email protected]

Nossas colunas contam com diferentes autores e colaboradores. As opiniões expostas nos textos não necessariamente refletem o posicionamento da Associação Bahiana de Imprensa (ABI).

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