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Venezuela proíbe 22 diretores de sites e jornais de saírem do país

Que o governo de Nicolás Maduro vive em pé de guerra com a imprensa não chega a ser novidade, mas a crise foi intensificada depois de a Justiça venezuelana proibir 22 executivos de sites e jornais críticos do governo de saírem do país. A medida foi motivada pela acusação de difamação agravada feita pelo presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, que alega que jornais como o El Nacional, o Tal Cual e o La Patilla insinuaram vínculo dele com o narcotráfico. O chefe do Legislativo reagiu duramente às denúncias e exigiu abertamente que os diretores fossem impedidos de deixar a Venezuela. Ele alegou que acusações não tinham fundamento e que processaria os responsáveis. A partir da decisão de uma juíza de Caracas, na última terça-feira (12/5), os acusados deverão se apresentar toda semana a um tribunal para assegurar o cumprimento dos termos antes de um julgamento.

O novo cerco à imprensa teve início em 25 de janeiro, quando os executivos repercutiram em suas publicações uma reportagem do jornal espanhol ABCque envolvia o governo venezuelano. A fonte era o militar Leamsy Salazar, ex-chefe de segurança de Cabello e homem de confiança do então presidente Hugo Chávez. De acordo com Salazar, Cabello lidera o cartel conhecido como “Los Soles”, que pratica suas atividades a partir das Forças Armadas venezuelanas. Analistas questionam a existência de um cartel, mas destacam que o país não poderia ter se tornado uma plataforma de narcotráfico sem envolvimento de autoridades. A acusação contra os diretores foi aceita, embora uma decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre um caso semelhante com o jornalista costarriquenho Mauricio Herrera Ulloa, em 2004, afirme que o ato de reproduzir conteúdo de reportagens terceiras não constitui um delito.

Miguel Otero-El Nacional_Foto-Ricardo Maldonado-EFE
Um dos atingidos pela decisão foi Miguel Henrique Otero, diretor do El Nacional – Foto: Ricardo Maldonado/EFE

Segundo o El Nacional, a acusação foi feita formalmente em 28 de abril, e aceita uma semana depois. No entanto, os acusados não foram diretamente informados — souberam primeiro da medida de forma extrajudicial. “Aceitar uma decisão desta e não emitir a citação aos acusado é algo completamente irregular. É assim que as coisas funcionam na Venezuela, onde os juízes dependem do Executivo, recebem ordens diretas do governo. A Justiça venezuelana não existe, é um instrumento para criminalizar a dissidência”, acusou o diretor do El Nacional, Miguel Henrique Otero, à rede NTN24.

Uma fonte do Tal Cual não identificada disse que um dos diretores, Manuel Puyana, foi formalmente notificado da proibição. Outro diretor da publicação está nos Estados Unidos e, por conta de decisão, não retornará ao país. “Eles [membros do governo] estão tão sem vergonha que já tinham a proibição de sair do país pronta antes mesmo de começar o julgamento”, disse o vice-presidente editorial do El Nacional, Argenis Martinez. Ele ainda não recebeu a notificação.

Os 22 proibidos de sair da Venezuela – Miguel Henrique Otero, Mariana Otero, Argenis Rafael Martínez Mota (“El Nacional”), José Simón Elarba Haddad, Oswaldo Karam Macía, Luis Carlos Serra Carmona, Juan Andrés Wallis Brandt, Omar José Delgado Lugo, Jorge Papatzikos Gianopulos, Vivianne de Lourdes Font Fernández, Ramón José Medina Simancas, Beatriz Cecilia De Majo de Algisi, Carmen Elena Macía Fortique, Leopoldo Eduardo López Mendoza, Teodoro Petkoff Malec, Juan Antonio Rafael Golia Amodio, Francisco Layrisse, Manuel Antonio Puyana Santander, Alberto Federico Ravell Arreaza, Isabel Cristina Ravell Nolck e David Alberto Morán Bohórquez.

 *Informações do jornal O Globo, Folha de S. Paulo e Portal IMPRENSA.

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TalCual de Caracas denuncia perseguição ao jornal e pede investigação

O diretor do diário TalCual de Caracas, Teodoro Petkoff, foi nesta segunda-feira (17) à sede da Procuradoria-Geral da República para solicitar a abertura de um inquérito contra Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional da Venezuela e número dois do chavismo dirigente, por uma suposta perseguição à sua pessoa e a seu meio de informação. Na última terça-feira, este site publicou uma matéria em que se destaca o uso de dispositivos legais para silenciar os meios de comunicação privados e independentes que são desconfortáveis para o governo venezuelano.

Em um relatório apresentado ante o ministério público, Petkoff e seus representantes legais presumem que Cabello – também ex-vice-presidente da República e várias vezes ministro de Hugo Chávez – poderia ter incorrido nos delitos de falsificação de documentos públicos, prevaricação e peculato. Certamente é pouco provável que a promotoria, liderada por Luisa Ortega Díaz – uma renomada simpatizante do chavismo – chegue sequer a atender ao pedido de que se investigue um dos integrantes da dupla que, junto com Nicolás Maduro, lidera a revolução bolivariana depois da morte do comandante Chávez.

Um tribunal de Caracas aceitou há quase duas semanas um processo no qual Cabello acusa o diário de ter cometido “difamação agravada” contra sua pessoa. Além de compensações pecuniárias, o dirigente oficialista pede penas de prisão para Petkoff, os integrantes do conselho do diário, e para o autor da nota na qual supostamente Cabello teria sido exposto ao descrédito, Carlos Genatios, um ex-ministro de Chávez e agora dissidente do bolivarianismo. O juiz do caso também emitiu medidas cautelares contra os acusados, que incluem a proibição de que saiam do país e uma ordem para que se apresentem semanalmente ante o tribunal, independentemente das diligências próprias do processo.

Longe de recuar, Petkoff – ex-ministro e editor, líder guerrilheiro há meio século, precursor na Venezuela do chamado eurocomunismo no início dos anos 70 – contra-atacou. No processo apresentado ante a promotoria, o veterano homem público faz notar que Diosdado Cabello outorgou poderes a seu representante legal, a advogada Ítala Hernández Torres, 23 dias antes que o jornal publicasse o artigo que afetaria a reputação do presidente do Parlamento.

A irregularidade parece respaldar a suspeita difundida nesses dias noTalCual, no sentido de que a demanda seria parte de uma emboscada preparada de antemão pelo governo, que aproveitaria qualquer desculpa para isso, por menor que fosse. Além disso, um dos poderes outorgados à advogada teria sido solicitado por Cabello não como pessoa física, senão com o nome do Departamento Executivo da Legislatura, o que daria a entender que a ação legal não era empreendida por um indivíduo senão por um poder do Estado, e justamente o que Cabello controla com mão de ferro.

“Este processo é uma coisa sem pé nem cabeça”, assegura Petkoff em uma declaração gravada em vídeo que foi distribuída a diversos meios de comunicação. “Corresponde ao contexto geral de abuso de poder que enfrentamos há 15 anos na Venezuela. O regime manipula a Justiça, a coloca a seu serviço e a tem justamente assim para conseguir os objetivos de interesse particular de alguns de seus servidores públicos”.

Essa investida chega em um momento especialmente frio na já longa confrontação entre a revolução venezuelana e a imprensa independente. De acordo dados do Sindicato Nacional da Imprensa (SNTP), até a sexta-feira passada 107 jornalistas haviam sido agredidos ou detidos durante a abrangência dos protestos de rua que abalam a Venezuela desde 12 de fevereiro.

Consultada sobre o caso do TalCual, a Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA), a colombiana Catalina Botero, destacou em Washington o pedido irregular de pena de prisão para os diretores e o colaborador do diário. “Resulta em uma violação do direito internacional o uso do direito penal para encarcerar uma pessoa por ter feito declarações sobre altas autoridades públicas”, diz a especialista ao responder a um questionário que este jornal enviou por e-mail. “A criminalização da dissidência é uma conduta incompatível com uma sociedade democrática”.

Segundo Botero, em instâncias internacionais se observa com atenção as circunstâncias na Venezuela do exercício do jornalismo. “A Relatoria Especial pronunciou-se com a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, manifestando sua profunda preocupação pela situação na Venezuela. Recebemos informação sobre ataques e agressões físicas aos jornalistas, práticas sistemáticas de furto e destruição do material jornalístico, ameaças e intimidações aos meios de comunicação nacionais e estrangeiros, fechamento de canais de televisão como o NTN 24, dificuldades para se ter acesso ao papel, enfim, uma situação extremamente preocupante”.

“A isso se somam”, continua a relatora da OEA, “as denúncias penais e as restrições a jornalistas destacados, como Teodoro Petkoff, para sair do país. Neste sentido, fizemos um chamado às autoridades venezuelanas, pois em uma sociedade democrática é indispensável que os jornalistas possam informar com liberdade e que a população tenha acesso a uma informação plural, especialmente em relação a temas de interesse público”.

As informações são de Carla Jiménez para o El País (Edição Brasil)

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